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Educação emocional, sensibilização e afetividade: o impacto da inteligência emocional nos espaços escolares

RC: 150635
557
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/educacao-emocional

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

VILELLA, Ellen Jane Soares Martins [1], SILVA, Dayane Dantas da [2]

VILELLA, Ellen Jane Soares Martins. Educação emocional, sensibilização e afetividade: o impacto da inteligência emocional nos espaços escolares. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 08, Ed. 12, Vol. 02, pp. 79-93. Dezembro de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/educacao-emocional, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/educacao-emocional

RESUMO

A proposta do presente artigo é analisar a importância da inteligência emocional e da educação emocional para o desenvolvimento de um ambiente escolar mais saudável, no qual as relações de ensino e aprendizagem não ignorem a afetividade e a dimensão humana entre docentes, alunos e comunidade escolar. O artigo se fundamenta teoricamente no levantamento e análise crítica de bibliografia pertinente ao tema, debatendo as principais ideias e conceitos acerca da efetividade e das emoções na aprendizagem. Dessa forma, o artigo apresentará o conceito SEL (Social and Emotional Learning) como programa educacional aplicado em escolas ao redor do mundo, que visa promover um aprendizado significativo aos educandos, desenvolvendo-os o autocontrole e o autoconhecimento através da prática de suas atividades curriculares, contribuindo para a vida pessoal e profissional, tanto no âmbito educacional como nos espaços extraescolares.

Palavras-chave: Educação Emocional, Inteligência Emocional, Autocontrole, Autoconhecimento.

1. INTRODUÇÃO

Este artigo tem por finalidade apresentar a importância da compreensão e do domínio dos sentimentos, emoções e comportamentos, pois eles são capazes não apenas de alterar o humor do indivíduo, como também, de gerar conflitos externos. Portanto é necessário que se faça uma análise de como podemos contribuir para que o indivíduo seja capaz de administrar suas emoções e possa então ter um controle sobre seu comportamento, perante a sociedade.

Projetos educacionais como o SEL (Social and Emotional Learning) desenvolvem um aprendizado relevante que direciona e prepara o cognitivo para a aquisição de novos conhecimentos. Gerando assim, uma aprendizagem significativa, onde através da neuroplasticidade o aluno consegue imergir no meio social de forma consciente e crítica.

Dentro do desenvolvimento, este artigo mostrará o conceito de inteligência emocional e a diferença entre QI (quociente inteligente) e QE (quociente emocional). Apresentará a inteligência emocional dentro do âmbito escolar e como ela pode contribuir para formar cidadãos conscientes, críticos e capazes de gerenciar suas emoções e seus comportamentos.

O programa SEL quando incluído dentro das escolas tem um papel de suma importância, pois os alunos precisam ter um domínio, tanto do conteúdo programático quanto por suas aptidões emocionais, a fim de que possa solucionar e oferecer soluções plausíveis para todo e qualquer tipo de problema que enfrente em sua vida pessoal e profissional.

As crianças e jovens atuais, mais do que os de outrora, estimulados pela tecnologia, são capazes de realizar várias atividades ao mesmo tempo, tais como estudar, jogar games, “bater papo” nos aplicativos de mensagens, além da interação através das redes sociais. Por outro lado, tal como revelam estudos no campo da psicologia, psicanálise e neurociências, nas gerações atuais, incluindo crianças e jovens, os problemas emocionais como depressão, ansiedade, isolamento, fobia social e transtornos de humor tendem a se elevar sobremaneira, levando muitas pessoas a se aposentarem precocemente ou abandonarem seus postos de trabalho devido à incapacidade emocional e psíquica. A propósito, os professores são especialmente afetados por tais transtornos (Goleman, 2011, 2005; Rêgo e Rocha, 2009).

É fato que, apesar de toda a evolução técnica, as relações interpessoais na modernidade carecem de humanização, de relações saudáveis entre os indivíduos, prevalecendo a superficialidade em detrimento do convívio social de qualidade (Valente e Monteiro, 2017; Santos, 2005).

Apesar dessas mudanças, quase sempre as escolas se revelam espaços tradicionais, no sentido de que encaram a educação ainda de forma tradicional: conduzem seus projetos pedagógicos através de pautas que enfatizam o ensino acadêmico, a transmissão e cumprimento dos conteúdos programáticos, sem conferir atenção efetiva às questões emocionais. Mais que isso: muitas vezes tais projetos pedagógicos são pensados e desenvolvidos sem levar em conta que o educando deveria ser a preocupação central deles; que deveriam ser, ao mesmo tempo, o ponto de partida e o de chegada. Ora, a dimensão emocional, da afetividade, é fundamental para que haja aprendizagem, pois, a aprendizagem não é um processo meramente mecânico ou técnico (Valente e Monteiro, 2017).

Enfim, as escolas estão ancoradas nas perspectivas tradicionais de ensino, que focam no conteúdo, na parte acadêmica, na preparação para o ingresso na Universidade ou no mercado de trabalho. Nas palavras de Valente e Monteiro (2017, p. 06), “o sistema educativo provoca stress em toda a comunidade educativa por se pautar na retórica da transmissão de informação, valorizando uma aprendizagem quantitativa e não qualitativa”.

Apesar da defasagem em relação à realidade, o fato é que o ambiente escolar é invadido por múltiplas questões sociais, econômicas, emocionais, familiares e estruturais que estão para além dos muros da instituição e não podem, simplesmente, serem ignoradas. Conforme destacaram Rêgo e Rocha (2009), referindo-se à realidade de professores e educandos nas escolas atuais,

Vemos professores e educandos vivendo uma fase marcada por dificuldades, incertezas, e ausências de valores humanistas. Assistimos a uma desenfreada onda de violência nas famílias, nas escolas e na sociedade. Há menos de três décadas, os problemas mais comuns nas escolas eram: falar alto na sala, xingar ou bater em colega. Nos últimos anos, passamos a conviver com o uso de drogas ilegais e até com docentes sendo agredidos fisicamente pelos estudantes. Esse contexto leva-nos a refletir sobre as emoções, especialmente as que favorecem a violência e permeiam tais situações, como, por exemplo, a raiva, a tristeza e o medo. Como possibilitar aos estudantes e aos docentes conhecerem e administrarem suas emoções e sentimentos, transformando a raiva, a ira, a tristeza e o medo em afeto, alegria e amor? (Rêgo e Rocha, 2009, p. 137).

As considerações destacadas acima salientam as “feridas” e mazelas das escolas atuais, especialmente as das escolas públicas das periferias das grandes cidades brasileiras: o reflexo da violência externa aos muros da escola, que afeta o comportamento/postura e o rendimento dos alunos; a baixa autoestima de professores e educandos; a desvalorização dos professores, que são sobrecarregados, pois precisam trabalhar em diferentes escolas e turmas para conseguirem suprir suas necessidades de sobrevivência com dignidade; a ausência de políticas públicas que ofereçam aos professores formação adequada e contínua para  que eles trabalhem suas próprias questões emocionais e se tornem mediadores  junto a seus alunos (Prado, 2021).

Tais mazelas revelam a urgente necessidade de repensar o papel da escola nas sociedades atuais e a revisão das metodologias e direcionamentos do processo de ensino e aprendizagem. Já que as políticas públicas voltadas para a formação continuada dos professores são escassas, a comunidade escolar – equipe gestora, professores, educandos, colaboradores, funcionários, famílias – deve buscar caminhos e alternativas para melhorar o ambiente social da escola, e para trabalhar as emoções de forma positiva, ressignificando as experiências sociais e de aprendizagem para todos os envolvidos. Em outras palavras, tal como sugeriu Santos (2005, p. 09) em um dos trechos destacados anteriormente, professores e comunidade escolar devem “se apropriar de um saber que lhe foi negado”. E esse saber é a inteligência emocional, que a escola moderna não pode mais ignorar (Prado, 2021).

3. O IMPACTO DA INTELIGÊNCIA EMOCIONAL NOS ESPAÇOS ESCOLARES

A inteligência emocional é um dos conceitos abordados em psicologia. Trata-se do reconhecimento e da avaliação dos seus próprios sentimentos e da forma que o ser humano é capaz de lidar com as suas emoções, assim como compreender os sentimentos e comportamentos alheios.

O QE (quociente emocional) ocorre quando acontece neuroplasticidade (capacidade que o nosso cérebro tem para se reorganizar fisicamente e funcionalmente), através de pensamentos, emoções, comportamentos, etc. Neste ponto que a inteligência emocional entra em cena, pois a sua essência consiste em conciliarmos tanto o nosso lado emocional, quanto o racional.

A inteligência emocional nada mais é que a capacidade que o ser humano tem de administrar as suas emoções e de compreender estas em outros seres com a finalidade de resolvê-las para obter benefícios e para que tenha uma relação interpessoal saudável.

As pessoas que conseguem ministrar seus sentimentos, conseguem agir, pensar e ter comportamentos conscientes, não permitindo que as emoções dominem determinadas situações. Situações estas que muitas vezes fazem com que o indivíduo aja sem pensar, o famoso “impulso”.

Para Daniel Goleman em seu livro ‘Inteligência Emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente’, o QE espalhou-se por diversos cantos do mundo, e o mais interessante sobre este conceito foi a forma como os educadores trataram tal tema, incluindo nas escolas programas que estimulavam e impulsionavam o QE dos educandos.

O QE pode ser associado a uma aprendizagem significativa, pois é um processo que objetiva a compreensão dos conceitos que são apresentados aos alunos. Para que isso ocorra, é necessário que o educador sonde seus alunos e estimule cada um deles de modo individualizado.

Uma das estratégias para que haja uma aprendizagem significativa de fato é o uso dos jogos educacionais, trabalhos e atividades que sejam realizadas em grupos, estimulando assim a sociabilidade e a criatividade dos educandos, onde os alunos recebem o conteúdo que está programado pela grade curricular de modo mais dinâmico e atrativo.

O conceito SEL (Social and Emotional Learning) foi ardentemente abraçado pelos educadores na forma de programa de “aprendizado social e emocional”. Escolas ao redor do mundo oferecem SEL às crianças.

Escolas como em Cingapura empreenderam uma iniciativa diligente no que diz respeito ao SEL, assim como algumas escolas na Malásia, Hong Kong, Japão e Coréia. Na Europa, o Reino Unido foi pioneiro. Em 2002, a UNESCO deu a partida em uma iniciativa global para promover o SEL, enviando aos Ministérios da Educação de 140 países um relatório contendo dez princípios básicos para a sua implementação (Goleman, 2005).

Os dados de uma metanálise de 668 estudos avaliativos do programa SEL (social and emotional learning) de “aprendizado social e emocional” para crianças desde a pré-escola até o ensino médio, conduzida por Ross Weissberg, que dirige a Cooperativa de Aprendizado Acadêmico, Social e Emocional na Universidade de Illinois, em Chicago (organização que encabeça o esforço de levar o SEL às escolas de todo o mundo), mostram que o programa SEL gera grande benefício no desempenho acadêmico, conforme demonstram os resultados de teste de desempenho e média de notas. No processo avaliativo, os educandos puderam expor os benefícios adquiridos com o autocontrole e o autoconhecimento. As instituições que adotaram o programa tiveram mais de 50% de alunos com progressos em suas avaliações de desempenho e mais de 38% melhoraram suas notas. A ocorrência de mau comportamento caiu em torno de 28% e as suspensões em 44%. Enquanto isso a percentagem dos alunos que demonstraram um comportamento significativamente mais positivo aumentou em 63%. O objetivo do programa SEL cumpriu com o desejável, promoveu significativas mudanças comportamentais (Goleman, 2005).

Sabemos que o cotidiano exige muitas responsabilidades, como: trabalho, estudos, reuniões, boletos, relacionamentos, e a todo momento somos observados e cobrados o que acaba gerando uma constante pressão. As pessoas que não possuem um equilíbrio emocional tendem a ter o nível de estresse elevado, podendo inclusive acarretar alguns problemas de saúde, como por exemplo: raiva, medo, redução do apetite sexual, menstruação desregulada, perda de cabelo, má digestão, depressão, insônia, ganho de peso, etc. Isso ocorre porque o cérebro emocional é mais rápido que o cérebro racional. As emoções acontecem em frações de segundos, a razão é um pouco tardia, quando comparada ao QE.

Goleman (2005, 2011) explica este processo e como essas mudanças são capazes de influenciar todo o meio positivamente. É necessário que os funcionários sejam dinâmicos, flexíveis e que tenham a capacidade de superar-se e manter-se focado em seus objetivos, embora saibamos que muitas vezes o ambiente ao nosso redor não seja um cenário otimista. É importante ressaltarmos que o processo de crescimento não acontece apenas de forma individual, ele acontece na coletividade, e o profissional que consegue manter-se equilibrado emocionalmente consegue melhor adaptar-se a novas realidades existentes.

3. INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E EDUCAÇÃO EMOCIONAL

Na contramão das escolas, a neurociência tem defendido nos últimos anos que o elemento essencial na aprendizagem é a emoção, e que sem emoção não há curiosidade, não há atenção, não há aprendizagem e não há memória (Valente e Monteiro, 2017). Conforme os livros de Daniel Goleman popularizaram, a emoção está diretamente ligada ao funcionamento do cérebro. Existem áreas do cérebro humano destinadas especificamente para a atuação e controle emocional. A emoção não seria algo meramente irracional, do campo das paixões. Pelo contrário, a neurociência pode – e tem feito isso – explicar e compreender as emoções de forma fisiológica. Além disso, tal como o cérebro desenvolve a inteligência cognitiva, o mesmo pode ser feito com a inteligência emocional. A inteligência emocional pode ser aprendida e desenvolvida, embora, quase nunca, isso seja levado em conta nas escolas e, sobretudo, na formação dos professores, conforme desatacou-se no item anterior (Goleman, 2005).

Mas afinal, o que é inteligência emocional? Quais são as principais capacidades e habilidades emocionais passíveis de aprendizagem e desenvolvimento? Um breve levantamento digital dos artigos, dissertações e teses sobre o tema (na área de Educação, especificamente) nas plataformas acadêmicas, tais como SCIELO e a Plataforma da CAPES, revelam que é necessário avançar em pesquisas empíricas, que não apenas definam com clareza o que são a inteligência e a educação emocional, mas que experimentem e apliquem tais conceitos e arcabouços teóricos em situações reais de sala de aula, envolvendo docentes, educandos e comunidade escolar. Faltam, portanto, pesquisas empíricas sobre esse tema tão importante para a educação atual (Arantes et al., 2020; Valente e Monteiro, 2017).

A emoção pode ser definida como o conjunto de reações e de alterações fisiológicas que ocorrem no organismo, geralmente em situações de conflito ou em situações que fogem ao habitual, ou seja, situações inesperadas e não programadas. Em relação ao que se denomina como sentimento, consiste na interpretação e na tomada de consciência dessas mesmas alterações. Já a inteligência emocional diz respeito ao manejo positivo dessas alterações. Em outras palavras, a inteligência emocional é o conjunto de capacidades que permite aos indivíduos identificarem e equilibrarem as próprias emoções, mantendo o autocontrole e, ao mesmo tempo, buscando compreender as emoções e as reações dos outros, conseguindo, assim, a estabilidade em situações de alteração, além de desenvolverem relações interpessoais mais positivas, afetivas e produtivas (Arantes et al., 2020; Valente e Monteiro, 2017; Goleman, 2005, 2011).

O conceito de inteligência emocional foi desenvolvido ao longo da segunda metade do século XX, tendo sido sistematizado nos anos de 1990 graças aos trabalhos dos psicólogos Peter Salovey e John D. Mayer. Salovey e Mayer, a partir do aprimoramento das ideias de H. Gardner sobre as “Inteligências Múltiplas”, que destacaram a inteligência emocional como um tipo específico de inteligência, tão fundamental ao desenvolvimento humano quanto as inteligências cognitivas associadas ao raciocínio lógico-matemático e às habilidades de leitura e escrita. Segundo esses autores, a inteligência emocional é o conjunto de quatro capacidades distintas que interagem entre si:  (1) a percepção emocional (identificar as emoções – as suas, primeiramente, e, depois, a dos outros; identificar os momentos em que elas afloram na forma de sentimentos); (2) a facilitação emocional do pensamento (saber identificar a natureza das emoções; ou seja, o porquê de determinada emoção, tal como a raiva e o medo, por exemplo); (3) a compreensão emocional (saber entender, avaliar as emoções, suas e a dos demais), (4) e a gestão emocional (manter as emoções sobre equilíbrio e desenvolver relações interpessoais mais saudáveis). Desenvolver essas capacidades é fundamental para o desenvolvimento social, humano e cognitivo dos indivíduos (Valente e Monteiro, 2017; Goleman, 2005).

A inteligência emocional, como um elemento desenvolvido e articulado pelo cérebro humano, pode ser ensinada, aprendida e desenvolvida.  Para além do conhecimento tradicional, ou seja, do domínio da linguagem verbal e escrita, e do raciocínio lógico-matemático, existe uma gama variada de outros talentos, aptidões e habilidades que são tão ou mais fundamentais que o próprio QI para o desenvolvimento pleno das pessoas. Nesse sentido, apoiado em H. Gardner, Goleman (2005, 2011) igualmente rejeita a ideia, durante muito tempo recorrente, inclusive na área de educação, de que as experiências e a aprendizagem não modificam o QI. Ou seja, se uma pessoa é inteligente, será sempre inteligente e naturalmente bem-sucedida. Ponto final. Mas se uma pessoa tem muitas dificuldades de aprendizagem, tenderá a mantê-las, e, provavelmente, terá uma vida medíocre, sem nenhum tipo de progresso. Conforme enfatiza Goleman (2005), esse raciocínio é falso, o que é comprovado por inúmeras pesquisas conduzidas por grandes universidades no mundo todo e renomados neurocientistas.

O autor defende ainda a ideia de que no cérebro humano, assim como existem áreas responsáveis pelo QI, existem outras regiões ligadas à inteligência emocional, ou seja, à administração das emoções, dos impulsos, da empatia. As emoções e o manejo delas são elementos que fazem parte do DNA humano, da própria evolução humana como espécie biológica. Dessa forma, assim como existem as habilidades cognitivas, existem as habilidades emocionais e sociais, embora, quase nunca, essas sejam trabalhadas satisfatoriamente pela maioria das escolas. Mas essas habilidades podem ser aprendidas desde a tenra idade, e podem ter impactos muito positivos não apenas no processo de ensino e aprendizagem, mas, também, na própria trajetória humana e pessoal do indivíduo.

Há muito tempo se fala nessas habilidades: autocontrole; capacidade de relacionamento, capacidade de tomada de decisões, empatia, saber liderar, saber tratar o outro, compreendendo os seus posicionamentos. Essas habilidades podem ser aprendidas e desenvolvidas ao longo da vida. Evidentemente nem sempre um indivíduo terá todas as habilidades emocionais, mas é sempre possível desenvolvê-las e melhorá-las. Segundo Goleman (2005, 2011), tais habilidades, mais do que o conhecimento tradicional, são significativas, juntamente com os aspectos socioeconômicos, para influenciar as trajetórias de vida das pessoas (Stocco, 1999; Goleman, 2005, 2011).

Em síntese, Goleman (2005, 2011) resume as habilidades emocionais, que devem ser o alvo da educação emocional, em quatro capacidades fundamentais: (1) a autoconsciência, entendida como a capacidade de compreender as próprias emoções e suas origens; (2) autogestão, compreendida como o manejo positivo das emoções, ou seja, a capacidade de conter os impulsos, trabalhar e conter a raiva por exemplo; (3) capacidade de sentir empatia, que seria o esforço de compreender as emoções do outro e as razões que o levam a desenvolver determinadas posturas tidas por “problemáticas”; (4) gerenciamento das relações, que se refere às relações interpessoais, envolvendo a empatia, a afetividade, a socialização, entre outros elementos necessários a um ambiente emocionalmente saudável.

O estudo de Arantes et al. (2020), revelou-se instigante, à medida que sua proposta era apresentar os resultados empíricos de pesquisa envolvendo educação emocional numa escola secundária de Pernambuco. Mas também aqui o debate ficou mais no terreno técnico e na descrição de formulários de pesquisa, do que nas experiências concretas vividas por professores e alunos participantes. Será que, na verdade, de maneira geral, ainda se sabe muito pouco, na prática, sobre o que é a inteligência emocional e seus mecanismos de desenvolvimento e aprendizagem?

Mesmo com limitações, o estudo mencionado oferece pistas de possíveis caminhos a serem adotados no ambiente escolar e na sala de aula para a promoção da educação emocional: rodas de conversa, primeiro com os professores, depois com os alunos. Apresentação aos professores de temáticas importantes sobre as emoções, o reconhecimento delas, a busca pelo equilíbrio das emoções; os professores falaram de suas próprias discordâncias internas e conflitos. Em relação aos alunos, houve convites e oportunidades para que eles falassem sobre as suas próprias emoções através de músicas e dinâmicas de grupo. Mesmo que os conceitos e teorias não tenham sido aprofundados com os membros da comunidade escolar – e esse não era o objetivo da pesquisa –, as ações que concederam espaços de fala e expressão aos sujeitos envolvidos permitiram que existisse maior empatia entre eles, maior autoconhecimento e conhecimento dos dilemas dos demais. Tais elementos, conforme conclusão do estudo (Arantes et al., 2020), geraram maior respeito no ambiente escolar e entre seus membros; maior integração, além de terem contribuído para o desenvolvimento da afetividade entre as pessoas do grupo.

Portanto, a chave para o desenvolvimento das habilidades emocionais está no diálogo, em saber se colocar no lugar do outro, seja ele aluno ou professor. Está em perceber a educação como uma experiência humana, de trocas humanas, e não como um processo meramente técnico e quantitativo, visando um futuro brilhante e uma carreira de sucesso. Isso não significa prescindir do conhecimento acadêmico e do rigor pedagógico. Todos esses elementos estão aglutinados, e devem ser perpassados pela sensibilização e pela humanidade. Afinal, Paulo Freire já ensinara que

Se o meu compromisso é realmente com o homem concreto [ou seja, o aluno como ser humano], com a causa da sua humanização, de sua libertação, não posso por isso mesmo prescindir da Ciência, nem da tecnologia, com as quais vou me instrumentando para melhor lutar por essa causa (Freire, 2007, p. 7).

E esse aspecto da afetividade, da humanização, nos processos de aprendizagem, do qual fala Freire (2007), é ainda mais fundamental em se tratando da educação pública no Rio de Janeiro, com destaque para as áreas vulneráveis social e emocionalmente: as comunidades e favelas cariocas.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo, conforme apresentado na introdução, podemos perceber, que através do programa SEL (Social and Emotional Learning), realizado em escolas ao redor do mundo, as crianças desde a pré-escola até o ensino médio apresentaram mudanças significativas dentro do quadro escolar, através da inteligência emocional e a relação entre suas habilidades (autoconsciência, automotivação, autocontrole, empatia e sociabilidade).

O cérebro aprende e modifica-se de diversas maneiras, uma delas é através da neuroplasticidade, onde ocorre a mudança de comportamento, após ser recebido novos comandos, através dos neurotransmissores.

Nesse ponto, podemos dizer que é de suma importância que adotemos projetos que promovam e despertem o QE nos alunos, para que tenhamos uma geração futura consciente e equilibrada, promovendo assim, habilidades da inteligência emocional, que gere satisfação pessoal e profissional.

Este estudo tem importância não só para a área de educação, mas sim, para todas as profissões. Uma vez que as profissões lidam com diferentes culturas, etnias, em ambientes carregados de ansiedades e muitas vezes de tristeza, servindo assim como um alerta para o bom andamento psicossocial do ser humano que há por trás desse profissional.

Portanto, devido às mudanças e transformações tecnológicas, sociais, econômicas e comportamentais das últimas décadas, as escolas não podem continuar a pensar seus projetos de ensino-aprendizagem pautados na noção de conhecimento puramente acadêmico, e que deve preparar o aluno para o ingresso na universidade ou para o mercado de trabalho. A inteligência acadêmica não é a única necessária ao desenvolvimento humano. Para além do QI existem um conjunto de habilidades e capacidades emocionais, controladas e geridas por mecanismos cerebrais, que podem e devem ser ensinadas e aprendidas, inclusive nas escolas. A esse conjunto de habilidades emocionais Goleman (2005) nomeia Inteligência Emocional.

REFERÊNCIAS

ARANTES, Mariana M., FERREIRA, Aurino L., CORDEIRO, Eugênia P., CAMPOS, Carla de P. Educação Emocional: intervenção em uma escola de Ensino Médio em Pernambuco. Revista Educar Mais. vol.4, no. 3, 2020, p. 685-702.

FREIRE, Paulo. Educação e Mudança (30ª ed.). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.

GOLEMAN, Daniel. A Inteligência Emocional: A teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.

GOLEMAN, Daniel. Trabalhando com a Inteligência Emocional. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011 [Recurso Digital].

PRADO, Jefferson Antonio do. Educação Emocional nas escolas: uma aliada balizadora no processo de ensino-aprendizagem. Brazilian Journal of Development, 2021.

RÊGO, Claudia C. A. B., ROCHA, Nívea F. Avaliando a educação emocional: subsídios para um repensar da sala de aula. Ensaio: aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 17, n. 62, 2009, p. 135-152.

SANTOS, Maria J. E. Ludicidade. Educação emocional na escola: limites e possibilidades, 2005.

STOCCO, Kátia C.  A Teoria de Gardner. Cadernos da TV Escola: múltiplas inteligências na prática escolar. Secretaria de Educação à Distância/MEC, 1999, p. 10-20.

VALENTE, Maria N., MONTEIRO, Ana P. Inteligência Emocional em Contexto Escolar. Revista Eletrônica de Educação e Psicologia. Eduspi. vol.7, 2016-2017, p. 1-11.

[1] Pós-Graduação (Lato Sensu) – Faculdade Cidade Verde (FVC) e Graduação – Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam). ORCID: 0000-0003-1500-2722.

[2] Pós-Graduação – Faculdade Unibf (Lato Sensu) e Graduação – Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam). ORCID: 0000-0003-3788-2783.

Enviado: 11 de agosto de 2023.

Aprovado: 06 de outubro de 2023.

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Ellen Jane Soares Martins Vilella

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