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A Formação Social Brasileira e o Empreendedorismo: Análise da Época da Colonização[1]

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CONTEÚDO

DIAS, Graziany Penna [2]

DIAS, Graziany Penna. A Formação Social Brasileira e o Empreendedorismo: Análise da Época da Colonização. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 07, Vol. 05, pp. 96-106, Julho de 2018. ISSN:2448-0959

Resumo

O presente artigo teve por intenção analisar a formação social brasileira, da época da colonização e sua maior ou menor influencia para formação ou estímulo ao espírito empreendedor. A perspectiva foi analisar as inferências que a conjuntura econômica, política e educacional produziram para a formação da sociabilidade empreendedora. As análises indicam que a perspectiva de se formar um sujeito empreendedor, praticamente inexistiu como perspectiva de formação da sociabilidade para grande parte da população brasileira, considerando toda a dinâmica de dependência tanto das ordens emanadas da metrópole portuguesa, quanto das demandas internacionais.

Introdução

O presente artigo tem por intenção abordar a formação social brasileira, procurando analisar as condições para a constituição do espírito empreendedor. Nossa intenção é mostrar a especificidade do caso brasileiro, na produção dessa sociabilidade. Com este intuito, procurou-se analisar a formação social brasileira e sua com a perspectiva da sociabilidade empreendedora a partir da fase de colonização até a abertura dos portos, ao qual localizamos o que denominamos de espírito empreendedor sesmárico.

No decurso desta análise, será possível observar que na origem do Brasil, as condições políticas/econômicas/sociais/educacionais não possibilitaram um ambiente em que pudesse se desenvolver a sociabilidade empreendedora, pois o projeto de sociabilidade era outro e muito mais voltado aos desígnios da grande empresa colonial, considerando a situação de dependência, em face da metrópole portuguesa. Para a grande massa da população brasileira esta perspectiva não estava posta.

Da colonização (1500) até a abertura dos portos – o espírito empreendedor sesmárico

De acordo Caio Prado Jr. (2011), observar de forma explicativa os elementos de formação do Brasil, na época colonial, torna-se peça chave fundamental para se entender o Brasil contemporâneo. A partir da sua obra “Formação do Brasil Contemporâneo”, publicada, em 1942, o autor ressalta que a constituição na nossa nacionalidade se deu por conta do esgotamento do modelo colonial, ocorrido no século XVIII, que promoveu no século XIX, o prenúncio das mudanças que se aglutinariam na formação de uma nova mentalidade, mais urbana, ainda que pejada de elementos coloniais.

No tocante à perspectiva empreendedora, veremos que na época colonial esta praticamente inexistiu como perspectiva de formação da sociabilidade para grande parte da população brasileira, considerando toda a dinâmica econômica e política.

Para a compreensão desta afirmação será feita a análise econômica e política, a partir de referenciais históricos e sociológicos, do processo em que se deu a colonização portuguesa, com o intuito de localizar a que estamentos ou extratos sociais as referências empreendedoras se dirigiram originalmente.

Destarte, sobre a colonização a referência principal foi Portugal, que da passagem do século XIV para o século XV, tornou-se, de forma pioneira, num país marítimo conquistando terras ultramar tornando-se numa grande potência colonial. (PRADO JR., 2011). Tal processo foi seguido por outros países europeus, como a Espanha, tendo como ponto alto dos empreendimentos ultramarinos a dita descoberta da América.

No quadro geral da colonização da América pelos países europeus, a intenção inicial não era de povoar, mas de utilizar as recém-colônias americanas, para o comércio. Considerando a situação brasileira, que nos interessa diretamente, cabe sinalizarmos que Portugal, vai promover a sua exploração, com o mesmo espírito que as outras nações europeias, mas rapidamente vai pioneiramente iniciar um processo, ainda que tênue, de ocupação do território brasileiro, dados os poucos recursos humanos aqui presentes, como a população indígena que pouco tinha a oferecer.

Não obstante, mesmo com este princípio de povoamento para a coroa portuguesa o Brasil interessava exclusivamente para o comércio. Com isto a formação brasileira teve como pressuposto principal o fornecimento, e nada mais que isso, de açúcar, tabaco, entre os principais gêneros, e mais tarde ouro, diamantes, algodão, café para o mercado europeu (LEMOS, 2009; PRADO JR., 2011). De acordo com Caio Prado Jr. (2011):

É com tal objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem o interesse daquele comércio, que se organizarão a sociedade e a economia brasileiras. Tudo se disporá naquele sentido: a estrutura, bem como as atividades do país. (PRADO JR., 2011, p. 29).

A figura mais próxima à perspectiva do empreendedor foi a do branco europeu que virá de fora, para especular, realizar seus negócios, recrutar mão de obra (seja indígena, seja de negros importados), constituindo a colônia brasileira que perduraria três séculos. (PRADO JR., 2011).

Essa colonização dos trópicos da América, como foi o caso do Brasil, trouxe um marca distintiva em relação às colonizações ocorridas em regiões temperadas, como foi o caso do Norte da América. A colonização do Brasil vai ter como expressão três características que se combinam: a grande propriedade, monocultura e o trabalho escravo. (PRADO JR., 2011).

E isso vai determinar o tipo de colono, que vem ao Brasil, para poder gerar sua empresa ultramarina e empreender seus negócios. Essa figura não é do tipo trabalhador, que veio para promover o simples povoamento e viver do próprio sustento. O indivíduo que comparece é o explorador, o empresário voltado ao grande negócio. “Vem para dirigir: e se é para o campo que se encaminha, só uma empresa de vulto, a grande exploração rural em espécie e em que figure como senhor, o pode interessar.” (PRADOR JR., 2011, p. 124).

No geral, o colono que vinha pela concessão da coroa portuguesa geralmente era alguém ligado à própria nobreza ou um fidalgo, e seu interesse era deter um grande contingente de terra para que pusesse explorar, por meio do trabalho escravo e até assalariado. A política da metrópole, portanto, era promover distribuição de grandes lotes de terras pelo sistema de sesmarias, criando as capitanias hereditárias em 1534.

Cabe chamar a atenção, portanto, que a mentalidade mais próxima da perspectiva do empreendedor, veio de Portugal, de modo que no Brasil os grandes proprietários e, por assim dizer, empreendedores eram os que vinham para constituir na colônia um regime agrário de grandes propriedades. (PRADO JR., 2011).

Isso teve um efeito de não constituir-se de forma ampla uma mentalidade empreendedora, desde aquele momento. Pois, a forma de organização da colônia brasileira, no formato de sesmarias, inviabilizou qualquer a possibilidade de criação de um grande número de empresários.

Já a forma em que se estruturou[3] a colonização da América do Norte, pelos ingleses já difundiu de forma mais acentuada o espírito empresarial e empreendedor. As colônias da América do norte foram inicialmente organizadas num total de 13 distribuídas nas regiões norte e sul (KARNAL et al., 2015). As colônias do norte apresentavam um clima mais temperado, similar ao clima da metrópole inglesa, isto atraiu um grande número de trabalhadores ingleses para o continente recém-descoberto, na busca de uma vida melhor fugindo das perseguições religiosas da época (PRADO JR., 2011; KARNAL et al., 2015). Com isso, a forma de organização se constituía na organização da pequena propriedade, ao longo de boa parte do solo norte americano. Em algumas regiões até se identificava a grande propriedade, mas esta era arrendada aos pequenos lavradores, que quando muito tinham um número reduzido de subordinados. (PRADO JR., 2011). Nessa região, surgiu um núcleo colonial voltado à policultura, já que essa área pouco ofereceu de produtos para a metrópole, considerando que condições climáticas eram as mesmas. Isto promoveu um desenvolvimento do mercado interno, não ficando restrito só aos interesses metropolitanos. (KARNAL et al., 2015). Com esta estrutura de pequenas propriedades, tinha-se um contingente enorme de pequenos empresários espalhados pela colônia, o que favoreceu, desde aquele momento, a constituição e propagação do espírito empresarial e empreendedor, resguardadas as peculiaridades da época.

Não é demais anotar que na região sul da colônia da América do norte, a forma de organização econômica se aproximou mais com a da colônia brasileira, como veremos, pautada no grande latifúndio, na desigualdade e no trabalho escravo. Sua produção era voltada ao mercado externo (tendo a produção de tabaco como destaque), à agricultura e circunscrita sobejamente às ordens da metrópole. Ao passo que as colônias do norte já vinham desenvolvendo atividades manufatureiras[4]. (KARNAL et al., 2015).

Na colônia brasileira o processo foi o inverso das colônias do norte da América como nos mostra Prado Jr. (2011):

Da economia brasileira, em suma, e é o que devemos levar daqui, o que se destaca e lhe serve de característica fundamental é: de um lado, na sua estrutura, um organismo meramente produtor, e constituído só para isto: um pequeno número de empresários e dirigentes que senhoreiam tudo, e a grande massa da população que lhe serve de mão de obra. Doutro lado, no funcionamento, um fornecedor do comércio internacional dos gêneros que este reclama e de que ela dispõe. (PRADO JR., 2011, p. 134).

Nesse processo, inscreve-se também a função do Brasil colonial como mero produtor para as demandas externas do capitalismo comercial que se erigia naquele momento.  Cabe recordar, por exemplo, que no Reinado de D. Maria I (1734-1816), foi promulgado o alvará de 05 de janeiro de 1785, sob o argumento de que a constituição de fábricas e manufaturas em solo na colônia brasileira implicaria na redução da oferta de mão de obra para atividades de extração de minérios e agricultura. A partir este alvará foi feita a apreensão de 13 teares no Rio de Janeiro, que produziam panos de algodão. (KONDER, 2003).

É nesse ínterim pode-se localizar formação social brasileira, numa clara perspectiva de dependência tanto das ordens emanadas da metrópole portuguesa, quanto das demandas internacionais, que acabaram, inclusive se sobrepondo, mais tarde com os ditames de Portugal. Tanto foi isso que a Independência como será destacada não implicou no rompimento com a estrutura econômica que o Brasil foi inserido no sistema colonial. (PRADO JR., 2011).

Cabe ressaltarmos que do ponto de vista da sociabilidade empreendedora, pouco se desenvolveu neste período, pois as perspectivas sociais, políticas e econômicas que atravessaram o período colonial, mais promoveram uma perspectiva de homem, sobretudo, voltado à dependência e subserviência da metrópole. Nessa linha foi produzida para a grande parcela da sociedade civil não elitista, um tipo de postura pouco condizente com a do empreendedor. Por conta do mandonismo, do patrimonialismo e da dependência da coroa portuguesa, a maior parte da sociedade brasileira comportou-se mais como expectadora, o que conduziu a um comportamento de pouca iniciativa e assunção de responsabilidade. (FONTES FILHO, 2003).

No tocante aos esforços educacionais da época também não se produziram no Brasil nada relacionado à formação empreendedora, diferentemente do que foi feito em Portugal no mesmo período. Em relação à colônia da coroa portuguesa teve de intervir em muito na vida social brasileira, pois as condições que as populações nativas ser organizavam eram semelhantes ao comunismo primitivo. (SAVIANI, 2013). Neste sentido, as ordens religiosas jesuíticas tiveram papel destacado na educação colonial, inserindo o Brasil no mundo ocidental. (SAVIANI, 2013). Com relação aos períodos aludidos por Saviani (ibid.), praticamente teremos o Primeiro período (que vai vigorar ao longo de toda era colonial) e o começo (1759-1808) do Segundo período, que mais precisamente “corresponde à fase pombalina, que inaugura o segundo período da história das ideias pedagógicas no Brasil.” (SAVIANI, 2013, p. 31).

O primeiro período (com suas subdivisões em etapa heroica/pedagogia brasílica e pedagogia via Ratio Studiorium) vão basicamente corresponder ao processo “de aculturação, já que as tradições e os costumes que se busca inculcar decorrem de um dinamismo externo, isto é, que vai do meio cultural do colonizador para a situação de objeto de colonização.” (SAVIANI, 2013, p. 27).

Na primeira etapa[5], a educação jesuítica para o público indígena pautava-se numa formação humana em geral e específica; voltada as necessidades produtivas. Assim, tinha-se de um lado o ensino voltado à aprendizagem do português (língua do colonizador), da doutrinação religiosa cristã, além da leitura e da escrita, e, opcionalmente o canto orfeônico e música instrumental. De outro lado, tinha-se uma formação agrícola e profissional[6]. Para os filhos dos estratos mais abastados, como parte dos colonos, tinha-se uma formação em gramática latina, para quem fosse realizar estudos superiores, na Europa, em especial, na Universidade de Coimbra. (SAVIANI, 2013). Nesta primeira etapa, como forma de ganhar a confiança e adesão da população indígena, foram utilizadas diversas estratégias que configuraram a chamada pedagogia brasílica[7] que era uma forma de ensino feito sob medida, considerando as condições adversas encontradas pelos jesuítas no início da colonização.

A segunda etapa inicia-se com a morte do padre Anchieta e a instituição do Ratio Studiorium, em 1599 , um plano geral de estudos que fazia uma articulação mais sólida e sistematizada do ensino abandonando a pedagogia brasílica. Pode se dizer que o Ratio, foi o primeiro modelo de educação tradicional instaurado no país. Isto foi possibilitado porque também esta fase da educação jesuítica passou a contar com muito mais recursos que a etapa anterior.

Ademais ponto de inflexão nesta proposta é que se passou a utilizar o modus parisienses em substituição ao modus italicus, utilizado até então. Em contraposição ao modus italicus, que era estruturalmente mais aberto, o modus parisienses estabelecia os estudantes distribuídos em classes separadas por nível de instrução e idade, realização de exercícios repetitivos, um professor à frente da turma etc.

O Ratio trazia consigo uma normatização e controle do trabalho pedagógico do professor e da aprendizagem do estudante e forma muito incisiva. O plano posto do Ratio, detinha um caráter universalista e elitista. (SAVIANI, 2013, p. 56). Era universalista, pois se impunha a todos as escolas jesuíticas, indistintamente. Mas era elitista, porque acabou se destinando apenas aos filhos dos colonos, deixando de fora o público indígena. O nível de exigência era muito maior que o da pedagogia brasílica. Praticamente a primeira fase do Ratio, correspondia, em termos de nível de conhecimento, ao ensino médio de hoje, ou seja, muito complexo para que a população indígena pudesse acompanhar, ficando restrita só a formação para o trabalho profissional e agrícola.

Durante dois séculos este modelo de ensino vigorou no Brasil, sendo suprimido em 1759, quando se deu a expulsão dos jesuítas de todas as colônias portuguesas pelo ato do Marques de Pombal, na época, primeiro-ministro do rei Dom José I. Da perspectiva de alguma proposta de formação empreendedora, essa não existiu nas escolas jesuíticas da época, já que sua proposta era garantir o processo de colonização por meio da aculturação de processos de formação voltados ao ambiente do trabalho agrícola e artesanal da época.

Como foi visto qualquer estudo mais avançado (ensino superior) ou diferente do oferecido na educação colonial brasileira, só era possível se o estudante tivesse condições, sobretudo materiais, de poder ir para a Europa, o que por certo só era possível às famílias mais abastadas ou ligadas à nobreza.

E mesmo em meio às reformas pombalinas, nenhuma proposta educacional próxima do viés empreendedor de constituiu no Brasil. As propostas de Pombal procuraram incorporar o ideário iluminista, pautando-se em autores estrangeiros como os portugueses Luiz Antonio Verney (crítico ferrenho da educação do método utilizado pelos jesuítas) e Antonio Nunes Ribeiro Sanches. Com relação a Sanches, suas formulações advogavam por uma linha da economia política do escritor Bernard Mandeville (1670-1783), que em sua polêmica obra “A Fábula das Abelhas”, proclamava que a educação para os pobres deveria ser negada para que o sujeito pobre pudesse suportar o trabalho diário com satisfação. Nessa linha, Sanches formulava: “nenhum reino necessita de maior rigor na supressão total do ensino de ler e escrever do que o reino português” (Apud. SAVIANI, 2013, p. 102).

Embora a reforma pombalina não tenha suprimido o ensino para os pobres a eles limitou bastante o acesso ao conhecimento. Com a criação das aulas régias (administradas exclusivamente pelo Estado e não mais pela igreja, quando da época dos jesuítas), sua preocupação era atender os fins do Estado português. A criação das aulas régias constituiu-se num marco do surgimento do ensino público oficial e laico. Não obstante, esta nova estrutura funcionava de forma muito precária, que iam desde atrasos dos salários de professores, até mesmo a estrutura física, em que muitas escolas funcionavam na casa do próprio docente. Os conhecimentos eram particularizados em disciplinas específicas em cada escola. Na realidade as aulas régias significaram muito mais a tentativa de desmantelar o ensino jesuítico por meio do Alvará Régio de 28 de junho de 1759 (PILETTI; PILETTI, 2014). O ensino desarticulado e fragmentado só permitia que grande parte da população tivesse o acesso precário limitando-se ao saber ler, escrever e contar. (SECO; AMARAL, 2017).

A preocupação de Pombal não era com a colônia brasileira, mas a metrópole portuguesa em termos da sua passagem do capitalismo mercantil para o industrial, inscrevendo Portugal nos umbrais modernidade juntamente com os outros países europeus.

Nessa linha, sua reforma em Portugal sinalizou amplas mudanças na educação. Em especial chamamos a atenção sobre duas propostas que se entendem como sendo próximas da perspectiva empreendedora. São elas: a Aula do Comércio e o Colégio dos Nobres. (SAVIANI, 2013).

A “Aula do Comércio” foi criada em 1759, em Portugal, com o objetivo de formar o perfeito negociante, na medida em se havia identificado essa falta de habilidade por parte das práticas comerciais lusitanas que ainda eram muito precárias. Com esta escola, ensinavam-se os comerciantes o método contabilista italiano, referência utilizada em toda a Europa. A escola tinha uma duração de três anos com a seguinte estrutura:

1º ano: aritmética, álgebra, regra conjunta;

2º ano: geometria, geografia, comércio (que compreende agricultura, mineração, artes mecânicas, fontes, artes liberais, pesca e caça, colônias, navegação, moedas, câmbios, seguros, leis gerais, usos, máximas, meios);

3º ano: escrituração, economia política. (CABRAL, 2011, s/p).

Já o Colégio dos Nobres, foi criado em 1761, e tinha como pretensão o aburguesamento da nobreza retirando-a do ócio e imprimindo-lhe um caráter produtivo para nação. Para tal, a formação ia desde a formação humanística até a formação científica moderna (matemática, astronomia, física, álgebra etc.). Na verdade esta escola era um complemento da Aula do Comércio. A perspectiva era forma indivíduos atentos aos negócios, conforme a nova sociedade de base mercantilista que estava se constituindo na Europa.

A criação dessas duas escolas, que em última instância, representam o que havia de mais próximo à formação da sociabilidade empreendedora em Portugal, reforça a perspectiva de que na colônia brasileira tal sociabilidade ainda não era requerida pela metrópole portuguesa. Nesse sentido, uma formação escolar de tipo empreendedora ainda não se verificava no Brasil.

Conclusão

A partir da exposição feita concluímos que nossas análises indicam que a perspectiva de se formar um sujeito empreendedor, praticamente inexistiu como perspectiva de formação da sociabilidade para grande parte da população brasileira, considerando toda a dinâmica de dependência tanto das ordens emanadas da metrópole portuguesa, quanto das demandas internacionais.

Não que esta formação era desimportante, à época. Não obstante, o projeto de sociabilidade era outro e muito mais voltado aos desígnios da grande empresa colonial, promovendo, neste sentido um modelo de sociabilidade, voltada mais à subserviência e ao mandonismo português.

Referências

CABRAL, Dilma. Aula de Comércio da Corte (1808-1821). In: Memória da Administração Pública Brasileira – Coordenação-Geral de Gestão de documentos (COGED). Disponível em: http://linux.an.gov.br/mapa/?p=362. Acessado dia 03/05/2017.

CORDÃO, Francisco Aparecido. A Educação Profissional no Brasil. In: PARDAL, Luís; VENTURA, Alexandre & DIAS, Carlos (orgs.). Ensino Médio e Ensino Técnico no Brasil e em Portugal: raízes históricas e panorama atual. Campinas, SP: Autores Associados (Coleção educação contemporânea), 2005.

FONTES FILHO, J. B. O empreendedorismo no sistema cultural brasileiro: a história do Barão de  Mauá. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPAD, 27., 2003, Atibaia. Anais… Atibaia: Anpad, 2003.

KARNAL, Leandro; PURDY, Sean; FERNANDES, Luiz Estevam & MORAIS, Marcus Vinícius de. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. – 3ª ed. e 3ª reimp. – São Paulo: Contexto, 2015.

KONDER, Leandro. História das Ideias Socialistas no Brasil. São Paulo: Expressão Popular, 2003b.

LEMOS, Alexandre Piana. A Formação História Brasileira: perspectivas marxistas. Revista AEDOS da UFRGS – Rio Grande do Sul. v. 2, n. 3, 2009. Disponível em: http://seer.ufrgs.br/aedos/article/view/10583/6222. Acessado dia 25/03/2017.

PILETTI, Claudino & PILETTI, Nelson. História da Educação: de Confúcio a Paulo Freire.  – 1ª ed., 2ª reimpressão – São Paulo: Contexto, 2014.

PRADO JR. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia. – 1ª ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

SAVIANI, Dermeval. História das Ideias Pedagógicas no Brasil – 4ª ed. – Campinas, SP: Autores Associados, 2013.

SECO, Ana Paula & AMARAL, Tania Conceição Iglesias do. Marquês de Pombal e a Reforma Educacional Brasileira. Disponível em: http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/periodo_pombalino_intro.html. Acessado dia 03/05/2017.

[1] O presente trabalho é parte integrante da pesquisa de doutoramento, em andamento (desde 2015), intitulada “Empreendedorismo e Educação: a formação do novo modelo de sociabilidade do capital”, desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFJF, sob orientação do prof. Dr. Rubens Luiz Rodrigues.

[2] Doutorando em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista pela Capes. Membro do Grupo de Estudos Trabalho, Educação Física e Materialismo Histórico (GETEMHI). Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas/Câmpus Juiz de Fora.

[3] Faz-se importante indicar que a forma de estruturação com a qual a colônia inglesa se organizou foi em grande medida a responsável pela maneira como a qual a sociedade foi se desenvolvendo não sendo circunscrita apenas ao tipo de pessoa que se instalou na América do norte. Pois é muito comum certa associação, de senso comum, que as mazelas sociais, no caso brasileiro, seriam explicáveis por conta de que nossa herança seria baseada no envio da escória portuguesa (na figura de ladrões, assassinos etc.) na época da colonização. No caso da colonização da América do norte, os que foram enviados também eram tipos humanos que a metrópole não desejava mais em seu território (sobretudo os que estimulavam as insurreições). A ideia de que foram enviados colonos com alto grau de instrução e com grande fortuna é uma generalização incorreta. (KARNAL, et al., 2015).

[4] Sem aprofundar nas diferenças dessas duas regiões da colônia da América do norte, cabe frisarmos que esta dualidade será o palco dos grandes eventos, como a Independência e a Guerra Civil americana que marcaram as disputas internas que deram origem à história estadunidense.

[5] Nesse período os principais nomes foram os dos padres jesuítas: Manuel da Nóbrega e Giuseppe Anchieta.

[6] Cabe destacar que esta aprendizagem profissional, nos seus primórdios foi destinada aos índios e para os escravos. Estes últimos tinham sua aprendizagem acontecendo dentro do próprio espaço de trabalho, pois este não tinha direito ao estudo, além do que a educação profissional da época não exigia que se tivessem estudos formais para sua realização e era destinada, além dos escravos, para as classes desfavorecidas que não tinha condição de acesso ao ensino regular básico. Isto demonstrava desde aquela época a dualidade da educação presente na sociedade brasileira, em que se tinha um tipo de educação voltada para a elite e outra para maioria da população. (CORDÃO, 2005).

[7] Um exemplo dessa pedagogia brasílica pode ser identificada na doutrinação religiosa feita por Anchieta, que nas suas produções (poéticas e teatrais) procurava fazer uma articulação maniqueísta, das divindades indígenas Tupinambás com a cristã, colocando de um lado Tupã-Deus e do outro Anhangá-Demônio.

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Graziany Penna Dias

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