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Jogos e gamificação no âmbito da educação

RC: 145734
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/tecnologia/ambito-da-educacao

CONTEÚDO

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

SOUZA, Vinicius Louzada de [1]

SOUZA, Vinicius Louzada de. Jogos e gamificação no âmbito da educação. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 06, Vol. 02, pp. 143-158. Junho de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/tecnologia/ambito-da-educacao, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/tecnologia/ambito-da-educacao

RESUMO 

Devido ao avanço tecnológico, às novas dinâmicas do mundo moderno, o acesso à informação em tempo real, dentre outros fatores, percebe-se uma mudança no perfil do estudante e uma necessidade de adequação do ensino para o atendimento desta demanda. Diante deste cenário, este artigo tem como objetivo verificar se a utilização dos elementos da Gamificação no setor educacional pode proporcionar aumento do engajamento e da motivação do aluno, que são desafios atualmente encarados por este setor. Para tal, foi realizada, primeiramente, uma exploração conceitual do termo Jogo e suas funções para, em seguida, entender o conceito de Gamificação, através de uma revisão bibliográfica. Também foram selecionados trabalhos que exploram a utilização do tema na educação e fazem uma análise crítica do assunto.

Palavras-chave: Jogo, Gamificação, Educação.

INTRODUÇÃO 

Ao se levar em conta a realidade da nova geração, que possui acesso amplo à diversas tecnologias como tablets e smartphones e, segundo Prensky (2002), não se satisfazem em ler manuais técnicos ou instruções, mas sim preferem o “aprender fazendo”, percebe-se que o setor educacional não está pronto para lidar com o desafio de atender essa nova demanda.

Para Castells (2016), a avalanche de informação disponível torna necessário encontrar novas formas de ultrapassar os métodos tradicionais de ensino, assim como outras maneiras para encantar e motivar os alunos da nova geração nas atividades educacionais.

Neste cenário, este artigo pretende entender o conceito de Gamificação e como seus elementos podem beneficiar este setor e, para isso, é preciso primeiramente realizar uma exploração do conceito de jogos e suas características, uma vez que este termo originário do inglês, é a junção da palavra “game” (em português, jogo) com o sufixo “fication” (neste caso, no sentido de transformar em algo). O que, em uma tradução literal seria: o ato de transformar algo em um jogo.

Contudo, o conceito de “Gamificação” surgiu como a utilização de elementos de jogos em contexto de não jogos, possibilitando  uma  experiência  diferente  que supra às expectativas e estimule o engajamento dos envolvidos e, embora o termo tenha surgido em 2002, a gamificação tem sido aplicada há muito tempo. Na educação, por exemplo, a criança podia ter seu trabalho reconhecido com estrelinhas (uma forma de recompensa) de modo que quem obtivesse maior quantidade de estrelinhas ao fim do período recebia algum prêmio como uma medalha (ranking/conquista).

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

JOGO E SUAS CARACTERÍSTICAS

Analisando a origem da palavra jogo, no latim existem duas correspondências, jocus (jogo) e ludus (lúdico). A primeira, era empregada, principalmente, no sentido de divertimento e de situações que provocassem o riso. Já a segunda, além de abranger os significados supracitados, também remetia para atividades de entretenimento, ou seja, atividades relacionadas com jogos e que eram realizadas simplesmente pelo prazer de as realizá-las. No contexto deste trabalho, a segunda correspondência é a que melhor se adequa ao significado de jogo utilizado.

Quanto ao significado, ao procurar no dicionário, encontra-se significados e conotações que podem ser aplicados ao termo jogo como: recreação, brincadeira, atividade regida por regras, conjunto de peças ou cartas, manipulação, trapaça.

Além destes, o termo jogo é comumente adotado em muitas expressões idiomáticas como: abrir o jogo (falar a verdade), esconder o jogo (omitir informações), entregar o jogo (desistir), jogar limpo (agir de acordo com as regras), dentre tantas outras.

Dada a pluralidade e a abrangência do emprego do termo jogo em situações  cotidianas, não há  um consenso sobre o seu significado. De acordo com Huizinga (2007, p. 10):

” jogo é uma função da vida, mas não é passível de definição exata em termos lógicos, biológicos ou estéticos. O conceito de jogo de permanecer distinto de todas as outras formas de pensamento através das quais exprimimos a estrutura da vida espiritual e social. Teremos, portanto, de limitar-nos a descrever suas principais características”.

Seguindo a pesquisa do autor, pode-se destacar oito características principais e comuns a todas as atividades que possam ser consideradas jogos:

  • Participação voluntária: um jogo é uma atividade na qual todos os participantes envolvidos possuem a liberdade de fazer parte, ou não.
  • Distração: um jogo jamais será algo obrigatório, não pode ser considerado uma tarefa. Dessa forma, é praticado em momentos de ócio, como uma distração.
  • Exterior à realidade: o jogo é uma evasão da vida real para uma esfera paralela de tempo e espaço, não pode ser considerado parte integrante do cotidiano.
  • Limites espaciais e temporais: por ser uma evasão da vida real, um jogo requer espaço e duração delimitados para a sua prática. Essas limitações são responsáveis por deslocar o participante para a realidade paralela do jogo.
  • Meta: um jogo possui objetivo definido e claro para todos os participantes.
  • Regras: para alcançar a meta, deve-se agir de acordo com as regras pré- determinadas, com o objetivo de inserir os participantes na realidade paralela do jogo.
  • Sistema de feedback: considerando a existência de uma meta a ser atingida, consequentemente, existirá um resultado, representando o alcance, ou não, desta meta. Portanto, faz-se necessário a determinação de um sistema de contagem de pontos ou avaliação de Feedback, a fim de definir claramente o resultado do jogo entre os participantes envolvidos. Em um jogo, não existe dúvida quanto ao alcance, ou não, do objetivo final, por parte dos seus jogadores.
  • Término: todo jogo sempre possui um fim.

Sobre a limitação de espaço e tempo, Huizinga defende que, ao jogar, seja em um tabuleiro, ou em uma quadra de futebol, há um esforço para tentar ganhar do adversário, existe uma sensação de imersão naquele ambiente, o que por muitas vezes faz perder a noção de tempo.

A essa imersão, Huizinga dá o nome de Círculo Mágico, conceito utilizado por outros autores como, por exemplo, Mastrocola (2012) e Alves (2014). O Círculo Mágico, representado na figura a seguir (fig. 01), de acordo com o autor, possui um espaço e um tempo bem definidos. Dentro dele existe uma ordem, provida não apenas pelas delimitações de espaço e tempo, mas também pelas regras propostas e previamente aceitas por parte do jogador.

Figura 01 – Representação do Círculo Mágico

Representação do Círculo Mágico
Fonte: Mastrocola (2012, p. 25).

Segundo Mastrocola (2012), “um jogo belíssimo, mas com regras desconexas e que não atingem seus objetivos, acaba sendo dispensado pelos jogadores, que possivelmente não vão se divertir ao se envolverem na experiência.”. Ou seja, regras que não façam sentido aos olhos dos jogadores, ou não promovam uma certa ordem, impedem a imersão, fato que, muito provavelmente, culminará na desistência por parte do jogador.

Koster (2005) define os jogos como exercícios para o cérebro. Portanto, aqueles que não são capazes de estimular o cérebro, tendem a ser deixados de lado.

Essa falta de estímulos pode ocorrer por diversas razões, como facilidade muito elevada do jogo, assim como dificuldade muito elevado, ou, como supracitado, quando há regras desconexas que impeçam a criação de ordem.

Outra definição relevante é apresentada por Suits (1972), que explica o jogo como sendo uma tentativa de transpor obstáculos desnecessários. A ideia por trás dos obstáculos desnecessários é, principalmente, fazer com que os jogadores se esforcem ao seu limite. Quanto maior o número de obstáculos, mais desafiador se torna o jogo. Porém, é importante que se tome muito cuidado para que os desafios não ultrapassem as habilidades dos jogadores, caso contrário, os mesmos desistirão.

Pode-se citar como exemplo o ato de jogar golfe, onde todos os jogadores têm como objetivo colocar a bola no buraco. De maneira racional, se não houvesse regras e nem obstáculos, os jogadores completariam o objetivo da maneira mais rápida e eficiente possível, ou seja, caminhar e colocar a bola no buraco com a mão. Porém, os jogadores aceitam os obstáculos propostos no jogo como a utilização de tacos para tocar na bola e iniciar a primeira tacada de uma certa distância dos buracos.

No momento de aceitação dessas regras, o desafio é criado. Adiciona-se ainda mais um elemento, referente ao número de jogadas para acertar o buraco, onde é definido que, quanto menor for o número de jogadas realizadas, maior será a pontuação do jogador.

Caso fossem apresentados obstáculos além das capacidades dos jogadores como, por exemplo, jogar com uma venda tapando sua visão, provavelmente o mesmo desistiria do jogo, por achar muito difícil. Da mesma forma, caso os obstáculos não oferecessem um grau de dificuldade coerente como iniciar as jogadas muito próximas do buraco, provavelmente o jogador também abandonaria o jogo, neste caso por falta de interesse.

De acordo com Mastrocola (2012), a parte central desse pensamento nos mostra a responsabilidade que está nas mãos de um designer de jogos. Afinal, se o desafio criado não divertir ou valer a pena, com certeza será descartado pelos jogadores.

A partir do levantamento dos aspectos citados anteriormente nesta seção, é possível entender o termo jogo como uma atividade inerente ao instinto natural do ser vivo de se relacionar, se divertir e se preparar para atividades complexas que acontecerão no futuro, e anterior à cultura, pois sua existência está diretamente relacionada à sociedade e à consciência humana (HUIZINGA, 2007).

GAMIFICAÇÃO E SUAS CARACTERÍSTICAS

Considerando que o jogo é uma atividade inerente ao homem e precedente à cultura, entende-se que os seus mecanismos estão presentes na forma de viver e de se relacionar do ser humano, desde o início da civilização. O próprio ato de viver pode ser considerado um jogo, onde cada indivíduo atua no papel de “jogador” da sua respectiva vida.

Sendo assim, não se pode entender o conceito de Gamificação como algo relativamente recente na sociedade, levando em consideração que seus elementos já eram utilizados antes mesmo da criação do termo, que ocorreu em 2002, pelo consultor britânico Nick Pelling. Segundo ele, o termo foi criado com a intenção de ser “deliberadamente feio” e para descrever “a aplicação de interfaces cuja aparência era similar a jogos para tornar transações eletrônicas mais rápidas e confortáveis para o cliente” (BURKE, 2015).

Ainda seguindo a visão de Pelling, a Gamificação tinha tudo a ver com hardware, e sua criação tinha como objetivo descrever os serviços de uma consultoria startup chamada Conundra Ltd. Entretanto, o termo acabou sobrevivendo e indo além da própria startup e, desde então, passou a descrever algo completamente distinto do significado original.

Apesar de não existir uma definição específica amplamente aceita do termo Gamificação, a maioria das definições compartilham de algumas características. A partir disso, define-se o termo Gamificação como o uso de design de experiências digitais e mecânicas de jogos para motivar e engajar as pessoas para que elas atinjam seus objetivos (BURKE, 2015).

A Gamificação não implica na criação de um jogo para abordar um determinado problema no mundo real, recriando uma situação dentro de um mundo virtual, mas sim em usar as mesmas estratégias, métodos e pensamentos utilizados para resolver problemas semelhantes nos mundos virtuais, em situações do mundo real. A seguinte figura (fig. 02) posiciona a Gamificação entre dois eixos, a fim de situá-la e diferenciá-la de outros contextos semelhantes.

Figura 02 – Contextualização da Gamificação

Contextualização da Gamificação
Fonte:  Deterding et al. (2011, p.5.).

O eixo horizontal representa a ideia de um jogo, desde completo até seus elementos. Já o vertical, traz a ideia de uma brincadeira, livre e descontraída, até o jogo, mais formal e com um objetivo bem definido. Logo, percebe-se que a Gamificação pressupõe a utilização de elementos dos jogos, sem que o resultado final seja um jogo completo, e se diferencia do design lúdico na medida em que este pressupõe apenas um aspecto de maior liberdade, de maneira lúdica, enquanto a Gamificação propõe a aplicação de uma metodologia precisa visando contemplar objetivos pré-definidos.

É possível citar, como elementos de jogos os seguintes: o lançamento de desafios, cumprimento de regras, metas claras e bem definidas, efeito surpresa, linearidade dos acontecimentos, sistema de conquistas, estatísticas e gráficos como Feedback, superação de níveis, criação de avatares virtuais, dentre tantos outros.

No entanto, a Gamificação não deve ser resumida a aplicação de apenas um outro dos elementos acima, e sim ser caracterizada somente a partir da junção desses fatores, a fim de estimular o engajamento dos envolvidos na resolução de uma determinada tarefa.

Segundo Karl Kapp (2012), o “game thinking”, ou pensamento baseado em estrutura e contexto dos jogos, é um elemento primordial, e provavelmente, o de maior importância no processo de Gamificação, pois é o responsável por converter uma atividade do cotidiano em uma atividade capaz de agregar elementos de competição, cooperação e narrativa.

Outro elemento de destaque, e também considerado primordial, é o engajamento. Segundo Alves (2014), podemos definir a ideia de Gamificação como:

Criar algo que seja tão interessante e envolvente que nos permita fazer com que as pessoas queiram investir seu tempo, compartilhar seu conhecimento e contribuir com sua energia para o alcance do resultado, transportando-os para o círculo mágico definido por Johan Huizinga.

Figura 03 – Engajamento

Engajamento
Fonte: Elaborado pelo autor.

RELAÇÃO ENTRE JOGO E GAMIFICAÇÃO

Segundo a desenvolvedora de jogos e entusiasta da Gamificação, Jane McGonigal (2012), na sociedade atual, os jogos de computador e videogames estão satisfazendo as genuínas necessidades humanas que o mundo real tem falhado em atender. Eles oferecem recompensas que a realidade não consegue oferecer. Eles nos ensinam, nos inspiram e nos envolvem de uma maneira pela qual a sociedade não consegue fazer. Eles estão unindo as pessoas de maneira pela qual a sociedade não está.

Deste modo, algumas características são identificadas como recompensa, conhecimento, engajamento e inspiração, sendo possível interligá-las com a teoria de Huizinga (2007), que destaca o jogo como uma atividade inerente ao instinto natural do ser vivo de se relacionar, se divertir e se preparar para atividades mais complexas do futuro.

McGonigal (2012) defende que o motivo pelo qual os jogos atuais conseguem ser inseridos na rotina do indivíduo, além dos momentos de ócio, é o fato de que o indivíduo pós-moderno, por viver em uma era de incertezas, acaba demandando esse tipo de resposta da sociedade, que, por sua vez, aliando elementos de jogos ao, cada vez mais veloz, avanço tecnológico, promove uma sensação de segurança e controle através da implementação de projetos utilizando a abordagem de Gamificação em diversas áreas e para diferentes públicos.

Neste caso, se Huizinga (2007) apresenta oito características comuns a todos os jogos, McGonigal (2012) resume o jogo com apenas quatro fatores comuns: metas, regras, sistema de feedback e participação voluntária. Essa redução não implica no desaparecimento dos outros fatores, mas sim na transformação e novo significado do conceito do termo jogo no contexto da pós-modernidade, através da aplicação da Gamificação.

Ao analisar sob o ponto de vista da Gamificação, conclui-se o porquê do “desaparecimento” dos outros quatro fatores:

(1) O jogo era concebido como uma atividade para ser realizada somente durante períodos de ócio, como uma forma de distração. A partir da Gamificação, hoje os jogos podem ser entendidos como uma ferramenta oficial de conhecimento e desenvolvimento, tanto pessoal quanto profissional. A distração continua presente, porém a mesma não é deslocada para fora do trabalho, escola ou tratamento, ela passa a ser trazida para dentro desses espaços, visando à cooperação e envolvimento do indivíduo, a partir da possibilidade de sanar a sua necessidade de satisfação e felicidade constantes.

(2) O jogo consistia na evasão do mundo real, sendo assim, pertencente a uma realidade paralela. A partir da Gamificação, essa divisão deixa de existir, pois o jogo ganha relevância e prioridade suficientes para ser entendido como parte integrante da vida real e cotidiana do indivíduo.

(3) Antigamente, o jogo dependia de espaço geográfico e temporal limitados para existir. A partir da Gamificação, os jogos podem ocorrer em qualquer lugar e momento, podendo fazer parte da competição interna entre funcionários, visando o alcance de alguma meta, do aprendizado nas escolas, bem como de um tratamento de reabilitação cognitiva.

(4) Talvez a maior mudança, antigamente o jogo possuía um fim. A partir da Gamificação, o jogo não possui a necessidade de terminar. Por não ter limites de espaço e tempo, o jogo acontece de maneira constante, especialmente no âmbito social da vida. Em alguns casos, a vida se mistura ao jogo, e vice-versa, excluindo assim, a necessidade de delimitar o seu começo, meio ou fim.

Voltando aos fatores remanescentes (metas, regras, sistema de feedback e participação voluntária), destaca-se algumas particularidades que podem, e devem, ser exploradas a partir da utilização da Gamificação.

Metas: Muitas vezes as pessoas acabam ficando desmotivadas no decorrer da realização de uma determinada tarefa, simplesmente por não se identificarem com a meta proposta, ou também, por não conseguirem enxergar progresso no alcance de uma meta de longo prazo. No contexto da saúde, por exemplo, se o paciente que acabou de sofrer algum acidente, e que decorrente disso, acabou sofrendo algum tipo de lesão cognitiva. Um tratamento de reabilitação cognitiva, por melhor que seja, costuma possuir um longo período de duração. O paciente, que tem como meta a recuperação de sua lesão, muitas vezes não consegue enxergar a relação entre os exercícios propostos no tratamento com a sua evolução, que nem sempre é tão perceptível, gerando assim um alto índice de desmotivação, que atrapalha o tratamento como um todo. McGonigal (2012) destaca que nos jogos, geralmente é possível cumprir diversos objetivos ao longo do percurso, e que todos eles estão relacionados com a meta principal proposta. Assim, esse conceito pode ser utilizado também no dia a dia, como motivação para a realização de tarefas.

Regras: As regras são fundamentais para qualquer jogo, “gamificado” ou não. Ao se pensar em um jogo, os envolvidos precisam saber o que podem ou não fazer, assim como o que esperar. As regras não precisam ser todas conhecidas de uma só vez, mas algumas convenções devem ser feitas, de maneira clara e objetiva, pois caso o jogador não saiba o que esperar, a tendência é que ele não se engaje. Sendo assim, pode-se definir que, ao se utilizar da lógica dos jogos, podem existir momentos de alternância nas regras, evitando que o sistema fique engessado. Porém, é necessário tomar bastante cuidado para que essa alternância não gere uma quebra de expectativa negativa, por parte do jogador, pois isso pode acabar desmotivando-os e levando-os a parar de jogar.

Sistema de feedback: Como visto anteriormente, um sistema de Feedback constante é importante para motivar e aumentar o engajamento dos jogadores, pois demonstra o quão bem eles estão indo e o seu progresso em relação às metas a serem cumpridas. O feedback pode ser exibido através de diversas formas, desde visuais (por exemplo uma mensagem na tela exibindo um avanço de nível) e auditivos (por exemplo emitir um som diferenciado ao avançar de nível) até sistemas mais complexos, envolvendo níveis, pontos, rankings, medalhas, entre outros. Quanto mais constante e diversificado o sistema de feedback, melhor.

Participação voluntária: Aqui encontra-se um grande ponto de diferenciação entre jogos com finalidade exclusivamente lúdicas e jogos/sistemas “gamificados”. Em sistemas “gamificados”, nem sempre a participação poderá ser voluntária. No caso de uma escola, por exemplo, se as notas forem concedidas através de um sistema de pontos, não haverá opção para os alunos de não participar. Isto não significa que eles estarão menos dispostos a participar ou menos engajados. Para McGonigal (2012), a participação voluntária pode ser entendida como a aceitação das metas, regras e do sistema de feedback. Sendo assim, é necessário o desenvolvimento de um sistema em que os participantes envolvidos queiram jogar.

Associando ao conceito já discutido de Suits (1972), sobre os obstáculos desnecessários, é necessário criar um sistema onde os participantes tenham interesse e disposição para transpor estes obstáculos. Porém, diferentemente do jogo com finalidade lúdica, os obstáculos nesses casos são necessários em todos os sentidos, não apenas para o jogador.

SISTEMA EDUCACIONAL

Com o advento da globalização, o mundo cada dia mais dinâmico tem sinalizado a necessidade de mudanças e adaptações profundas no sistema educacional. Segundo Viegas (2018), as velhas práticas educacionais e as ferramentas e metodologias pedagógicas ultrapassadas não são suficientes para suprir as verdadeiras necessidades da atual educação no Brasil.

Os estudantes estão possuem cada dia mais autonomia e, segundo Viegas (2018), em virtude de sua grande conexão com a tecnologia, tem revolucionado a maneira de ensinar e aprender. Atualmente a maioria dos alunos são nativos digitais (DUDENEY e HOCKLY, 2007). Esta é uma geração que cresceu juntamente com a revolução digital e para quem os jogos eletrônicos utilizados como lazer são parte integrante da construção de sua cultura (AZEVEDO, 2012).

Ainda, segundo Filé (2011), esta geração lida com aparatos modernos, como computadores e videogames com extrema desenvoltura, como se fosse parte deles e, os professores e mediadores do processo educacional ainda seguem estagnados a paradigmas considerados ultrapassados, utilizando métodos tradicionais, aulas expositivas e pouco produtivas (AYRES MAC, et al., 2016).

Deste modo, há um ascendente movimento em direção ao reordenamento de currículos e a busca por implementação de tecnologias ativas de ensino e aprendizagem no qual o aluno é o foco, o que desvincula a percepção de soberania do conhecimento focada no mediador do processo (FABBRO, et al., 2018).

Diante deste cenário, partindo dessa abordagem inovadora, a Gamificação se destaca como recurso pedagógico para o novo sistema educacional, ou seja, uma ferramenta poderosa para potencializar a aprendizagem, uma vez que constitui uma abordagem centrada no estudante, na qual sua participação é fator de sucesso para o processo de aprendizado. Os jogos motivam, de diferentes formas, ao avançar em suas etapas adquirindo recompensas, à medida que os desafios são superados. Eles ensinam, inspiram e envolvem de uma maneira que a sociedade não consegue fazer (MCGONIGAL, 2012).

Segundo Moran (2017), aulas roteirizadas com a linguagem de gamificação estão cada dia mais presentes e são estratégicas importantes de engajamento e motivação para uma aprendizagem rápida e próxima da vida real e do contexto no qual esses estudantes estão inseridos.

Visto que os jogos são ferramentas que motivam seus usuários a ficarem por horas em tarefas a fim de atingir objetivos, pesquisadores vêm estudando o potencial dos jogos para fins educacionais, evidenciando entre outros fatores, a relação dos jogos com a motivação e o engajamento dos alunos (ALVES, 2014).

GAMIFICAÇÃO E EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA

Para Bissolotti; Nogueira e Pereira (2014),  a educação à distância tem uma colaboração ampliada na democratização do ensino e na aquisição do conhecimento, por ser um instrumento capaz de atender um grande número de pessoas simultaneamente, independentemente de sua localização geográfica, contudo um dos grandes desafios deste modelo é a desmotivação que pode ocorrer por parte dos estudantes, além do fato de muitos professores e mediadores ainda utilizarem os ambientes virtuais como um repositório de material didático, o que agrava a questão.

Diversos estudos apontam que a procura por cursos à distância aumentou substancialmente desde 2019, diante da pandemia de COVID-19 e, muitos alunos acostumados com estímulo presencial diário se viram obrigados a utilizar o ambiente virtual de aprendizagem, por exemplo, e não conseguiram avançar.

Alguns pesquisadores, então, perceberam que a utilização de elementos de jogos fora do ambiente dos jogos, como no ambiente educacional, estimula a motivação dos alunos, auxiliando na resolução dos problemas e auxiliando na aprendizagem. Para Fardo (2013), esse conceito supracitado trata-se de um “fenômeno emergente, que deriva da popularidade dos games e de suas capacidades intrínsecas de motivar a ação, resolver problemas e potencializar as aprendizagens nas diversas áreas do conhecimento e na vida dos indivíduos”.

Bissolotti; Nogueira e Pereira (2014) descreve alguns mecanismos gamificados que são úteis para a manutenção do engajamento dos alunos que utilizam ambientes virtuais, são eles: feedback constante o que promove a noção de progresso, desafios que estimulem os alunos a realizarem uma ação e superá-los, competição e recompensas para estimular os alunos para as próximas atividades, ao passo que desperta emoções positivas. Neste sentido, então, a gamificação é utilizada para motivar e engajar o aluno a ser mais participativo e aumentar sua relação com outros alunos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema educacional brasileiro está passando por intensas transformações. O docente deixou de ser visto como detentor do conhecimento, o novo perfil de estudante necessita de um novo modelo de ensino e a facilidade de acesso à informação em conjunto com mídias digitais e tecnologias impulsionam os professores a se adequarem a novas metodologias.

A presença da Gamificação na educação encontra-se em ascensão, no formato à distância  principalmente, diante do aumento desta forma de ensino com pandemia de COVID-19, e seus recursos parecem promissores, uma vez que o aluno deixa de ser um elemento passivo, mas sua aplicação ainda carece de estudos, uma vez que seu uso esteja relativamente no início.

Uma vez que o jogo é uma atividade inerente ao homem e precedente à cultura, faz sentido que o jogo também faça parte do ambiente educacional, proporcionando ao estudante uma experiência não tão fácil de ser alcançada  através do ensino tradicional (GIARDINETTO, 2005).

Sendo assim, podemos enxergar o conceito de Gamificação como um fenômeno emergente com diversas potencialidades de aplicação, em diversos campos da atividade humana, como na resolução de problemas, desafios em grupo, para realização de atividades cotidianas, entre outros, inclusive na área da educação, uma área bastante fértil para a sua aplicação, uma vez que pode trazer maior engajamento, eficiência e prazer ao processo de aprendizado.

REFERÊNCIAS

ALVES, F. Gamification: Como criar experiências de aprendizagem engajadoras : um guia completo do conceito à prática. 1.ed. São Paulo: DVS Editora, 2014.

AYRES M.A.C, et al. Influência e inclusão das tecnologias da informação no processo ensino aprendizagem. Dissertação (Mestrado em Planejamento e Desenvolvimento Regional) – Departamento de Gestão e
Negócios – GEN. Universidade de Taubaté, São Paulo, 2014; 171 p.

AZEVEDO, V. A. Jogos eletrônicos e educação: construindo um roteiro para a sua análise pedagógica. Renote – Novas Tecnologias na Educação, UFRGS, Porto Alegre, v. 10, nº 3, 2012. Disponível em: < https://seer.ufrgs.br/renote/article/view/36409>. Acesso em: 12 maio 2023.

BISSOLOTTI, K.; NOGUEIRA, H. G.; PEREIRA, A. T. C. Potencialidades das mídias sociais e da gamificação na educação a distância. RENOTE, Porto Alegre, v. 12, n. 2, 2014. DOI: 10.22456/1679-1916.53511. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/renote/article/view/53511. Acesso em: 23 mar. 2023.

BURKE, B. Gamificar: Como a gamificação motiva as pessoas a fazerem coisas extraordinárias. 1ed, São Paulo, DVS Editora, 2015.

CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 2016.

DETERDING, S. et al. From Game Design Elements to Gamefulness: Defining “Gamification”. In: Proceedings of the 15th International Academic MindTrek Conference: Envisioning Future Media Environments (MindTrek ’11). ACM, Nova Iorque, EUA. Disponível em: < https://www.researchgate.net/publication/230854710_From_Game_Design_Elements_to_Gamefulness_Defining_Gamification>. Acesso em: 12 maio 2023.

DUDENEY, G.; HOCKLY, N. How to teach English with technology. Harlow: Pearson – Longman, 2007.

FABBRO, M. R. C. et al. Estratégias   ativas   de   ensino   e   aprendizagem:   percepções   de   estudantes   de enfermagem. REME – Ver. Min. Enferm. 2018.

FARDO, M. L. A GAMIFICAÇÃO APLICADA EM AMBIENTES DE APRENDIZAGEM. Revista Novas Tecnologias na Educação, Porto Alegre, v. 11, n. 1, 2013. DOI: 10.22456/1679-1916.41629. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/renote/article/view/41629. Acesso em: 13 jun. 2023.

FILÉ, V. Novas tecnologias, antigas estruturas de produção e desigualdades. In: FREIRE, W. Tecnologia e Educação: as mídias na prática docente. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2011.

GIARDINNETTO; MARIANI (Org.). Os jogos, brinquedo e brincadeiras: o processo de ensino-aprendizagem da Matemática na Educação Infantil. In Matemática e educação infantil, Cecemca, Bauru, Ministério da Educação, São Paulo, 2005.

HUIZINGA, J. Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 2007.

KAPP, K. M. The gamification of learning and instruction: game-based methods and strategies for training and education. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2012.

KOSTER, R. A theory of Fun for game design. Scottsdale, Arizona, 2005.

MASTROCOLA, V. M. Ludificador: Um guia de referências para o game designer brasileiro. São Paulo: edição do autor, 2012.

MCGONIGAL, J. A realidade em jogo: por que os games nos tornam melhor e como eles podem mudar o mundo. Rio de Janeiro: Best Seller, 2012.

MORAN, J. Como transformar nossas escolas: novas formas de ensinar a alunos sempre    conectados. In: Educação 3.0: Novas perspectivas para o Ensino. CARVALHO, M. (Org). Porto Alegre, Sinepe/RS/Unisinos, 2017. Disponível    em:    <http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2017/08/transformar_escolas.pdf>. Acesso em: 13 nov. 2019.

PRENSKY, M. The motivation of gameplay: the real twenty-first century learning revolution. On the Horizon, v. 10, 2002.

SUITS, B. What is a game? In: GERBER, E. Sport and the body: a philosophical symposium. Philadelphia: Lea & Febiger, 1972. p.16-22.

VIEGAS,  A. Os desafios da escola no mundo contemporâneo. Plataforma Educacional, 2018.

[1] Bacharel em Ciência da Computação. ORCID: 0009-0008-5104-945X. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/2041253920193548.

Enviado: 06 de março, 2023.

Aprovado: 12 de abril, 2023.

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Vinicius Louzada de Souza

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