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Simulação realística em urgência e emergência na perspectiva discente

RC: 140763
615
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/urgencia-e-emergencia

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

TOZETTO, David José Oliveira [1], BOTELHO, Nara Macedo [2]

TOZETTO, David José Oliveira. BOTELHO, Nara Macedo. Simulação realística em urgência e emergência na perspectiva discente. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 02, Vol. 03, pp. 25-39. Fevereiro de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/urgencia-e-emergencia, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/urgencia-e-emergencia

RESUMO

O ensino médico, após inúmeras mudanças, tem, hoje, o aluno como sujeito ativo na construção do raciocínio clínico, do diagnóstico assertivo e das condutas adequadas. Assim, este trabalho tem como questão norteadora: de que forma a simulação realística em urgência e emergência pode contribuir para identificar as principais dificuldades de aprendizado dos alunos de um curso de medicina? O objetivo deste trabalho está pautado em identificar dificuldades de aprendizado dos alunos de um curso de medicina durante treinamento em atendimentos simulados em situações de urgência e emergência. Sobre a metodologia, trata-se de um estudo transversal, descritivo, com abordagem qualitativa, com amostra constituída por 29 alunos matriculados na disciplina de Urgência e Emergência em Clínica Médica do internato do curso de Medicina de Marabá da Universidade do Estado do Pará (UEPA). Foram realizados treinamento teórico e estações de simulação realística em atendimentos de pacientes em Parada Cardiorrespiratória (PCR), Dor Torácica Aguda (DTA) e Acidente Vascular Encefálico (AVE), com gravações e sessões de debriefing após cada estação prática. Para a coleta de dados, foram utilizados questionários/checklists de avaliação para cada sessão/atendimento, respondidos pelos alunos e pelo professor/avaliador nas 3 situações citadas (PCR/DTA/AVE). Os estudantes também puderam fazer sugestões para melhorar o treinamento simulado nos questionários por eles respondidos. Os dados coletados mostraram uma avaliação positiva do método por parte dos alunos, e o melhor desempenho dos participantes ocorreu nas sessões de treinamento sobre atendimento à PCR (72% dos alunos acertaram mais que 80% das questões) e à AVE (75% dos alunos acertaram mais que 80% das questões). Entre as dificuldades encontradas estão a falta de checklists em locais de fácil visualização durante os atendimentos, a falta de elaboração dos resumos (“flashcards”) para consulta rápida em cada cenário específico, a não utilização de simulação com pacientes atores (podendo-se utilizar, inclusive, os próprios alunos nesses papéis) e a necessidade de maior diversificação dos casos clínicos. Essas sugestões foram importantes, e seriam de fácil implementação durante os cenários citados neste trabalho.  Como conclusão, foi possível observar que a simulação realística em urgência e emergência deve ter um lugar de destaque no treinamento de estudantes de medicina. Ressalta-se, porém, que dificuldades são encontradas, e as sugestões e o constante feedback de quem está sendo treinado torna-se muito importante para o aprimoramento contínuo deste método.

Palavras-chave: Treinamento por simulação, Emergências, Estudantes de medicina.

1. INTRODUÇÃO

O ensino médico brasileiro é notavelmente caracterizado por diversos períodos de estagnação e recomeços. Enquanto as colônias espanholas vizinhas detinham cerca de 20 universidades consolidadas em 1800, a colônia portuguesa na América do Sul (Brasil) teve somente sua experiência em 1808, com a implantação da Escola de Medicina e Cirurgia da Bahia, atuando, pouco tempo depois, na formação dos chamados “cirurgiões barbeiros”, dotados de pouco ou nenhum conhecimento teórico, sendo somente reproduzidas as práticas da classe (MACHADO; WUO e HEINZLE, 2018).

Após diversos anos de estagnação do ensino médico no país, na busca do ensino ideal à realidade brasileira, houve a incorporação de alguns modelos internacionais. O modelo francês (napoleônico), implementado com a criação da Universidade do Rio de Janeiro, em 1920, foi baseado na fundamentação técnico-científica e nos conceitos do iluminismo, todavia, voltados puramente à profissionalização, dissociando o ensino da pesquisa (LUCKMANN e BERNART, 2014). O modelo norte-americano, marcado pela integração do ensino e da pesquisa, assim como pela fragmentação do aprendizado em disciplinas isoladas, trabalhava o ensino focado na especialização do serviço médico (LUCKMANN e BERNART, 2014).

Somente após a criação e implementação do Sistema Único de Saúde (SUS), em 1988, na busca por formar médicos generalistas no atendimento de uma população desigual e com patologias diversas, as universidades passaram a adotar metodologias que pudessem facilitar e realmente fomentar o aprendizado médico através da união do ensino, pesquisa e extensão. A partir de então, com projetos pedagógicos focados no aluno como o sujeito de aprendizagem e tendo o professor como facilitador do processo, notou-se a melhora da assistência médica brasileira (MACHADO; WUO e HEINZLE, 2018).

As metodologias ativas de ensino, através da problematização de questões médicas cotidianas e da busca ativa de sua resolução, proporcionam ao discente a responsabilidade de formular hipóteses, buscar respostas e, por consequência, produzir e sedimentar o conhecimento desejado (FARIA e AMARAL, 2021). Apropriando-se desse importante processo, destaca-se a utilização de simulações realísticas controladas como metodologia de ensino em saúde. Essa técnica proporciona a participação do aluno como sujeito ativo, correlaciona teoria e prática na solução de casos clínicos em ambientes altamente controlados e seguros, tornando-se um importante recurso, principalmente no ensino de urgências e emergências médicas no Brasil e no mundo (ALVES et al., 2020).

Dentre as diversas vantagens do ensino através de simulações, destacam-se o treinamento e consolidação de competências, racionalização e sistematização do atendimento médico, investigação diagnóstica direcionada e, notavelmente, a possibilidade da intervenção e orientação do tutor experiente, com feedback imediato das tomadas de decisões aos alunos participantes (GUEDES et al., 2017).

Além disso, um grande ganho dos treinamentos simulados é a utilização, cada vez mais realística, de bonecos especializados em emitir os sinais físicos para cada situação clínica, mimetizando um paciente real. Por isso, ao proporcionar a vivência de situações realísticas simuladas, os adultos se sentem mais estimulados a aprender e, através do treinamento prático, a reduzir possíveis eventos adversos futuros (IGLESIAS e PAZIN FILHO, 2014; PEDROSA e COUTO, 2014).

O treinamento em equipe durante a simulação está associado a um aumento no desempenho do grupo, uma vez que permite que habilidades como comunicação, respeito aos colegas e divisão de tarefas sejam colocadas em prática, preparando os alunos para atuarem em equipes multiprofissionais durante a vida profissional, sendo este preparo muito importante para o atendimento de pacientes em situações de urgência e emergência (BOHMANN et al., 2021). Diante disso, tal prática vem sendo aplicada no ensino médico, justamente por contribuir de forma significativa para influenciar e melhorar positivamente os resultados dos pacientes.

Todavia, o êxito do treinamento realístico simulado é determinado por inúmeros fatores, como a boa preparação dos cenários de prática, equipamentos adequados para a prática proposta, treinamento dos professores que serão responsáveis por conduzir e orientar as sessões, além da realização de feedback durante e após o treinamento (LUNA e SPIGHT, 2014). Nesse sentido, para que as simulações realísticas se tornem cada vez mais sistematizadas e consolidadas como metodologia de ensino, buscando dirimir as possíveis falhas de treinamento e dificuldades dos alunos, é necessário que haja avaliações e correções periódicas dos processos realizados.

O ensino baseado em simulação em urgência e emergência é uma ferramenta valiosa, e deve ser incorporada aos currículos dos cursos de medicina, assim como já é utilizada amplamente em cursos e treinamentos de profissionais da área de saúde já formados (MELO et al., 2016).

Nesse sentido, o presente estudo buscou identificar de que forma a simulação realística em urgência e emergência pode contribuir para identificar as principais dificuldades de aprendizado dos alunos de um curso de medicina.

2. MÉTODOS

Este trata-se de um estudo transversal, descritivo, com abordagem qualitativa, realizado entre junho de 2021 e junho de 2022 na Universidade do Estado do Pará (UEPA) – Campus VIII, Laboratório de Habilidades Profissionais /Simulação Realística.

A população do estudo foi composta por estudantes do curso de medicina da Universidade do Estado do Pará, campus Marabá, que estavam no internato. Nesse sentido, para compor a amostra do estudo, foi utilizado o cálculo amostral analisado mediante o programa Epi Info 7®, que considera o erro amostral máximo de 5% e intervalo de confiança de 95%, a partir da população de referência de 31 estudantes, que estavam devidamente matriculados na instituição. Desse modo, a amostra a ser atingida foi de 29 estudantes.

Foram incluídos no estudo os alunos que: concordaram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE); estavam regularmente matriculados no curso de medicina da Universidade do Estado do Pará – Campus VIII – Marabá; e que estavam cursando o estágio curricular obrigatório de formação em serviço (internato) na disciplina de urgência e emergência em clínica médica. A recusa ou divergência em qualquer um desses critérios tornava o aluno inapto a participar do estudo.

Inicialmente, os acadêmicos foram submetidos a sessões teóricas sobre o atendimento inicial na PCR, abordagem da DTA na sala de urgência e o atendimento inicial no AVE, seguindo protocolos estipulados, por consenso, pela Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). Em um outro momento, os alunos foram submetidos a sessões práticas de simulação no atendimento de casos de PCR, DTA e AVE, utilizando um boneco de simulação realística de alta fidelidade da Laerdal Medical ® (MegaCode Kelly/SimPad), de forma que todos os participantes foram expostos a conteúdos e situações clínicas simuladas idênticas.

Estas sessões foram devidamente gravadas em áudio e vídeo, possibilitando a avaliação e o feedback do professor aos alunos participantes (debriefing) após o término do treinamento simulado. No final do processo, os participantes responderam a questionários de avaliação de cada atendimento realizado nos 3 cenários propostos, sendo permitida a sugestão de ações para melhorar as sessões de simulação, visando uma fixação mais adequada dos conteúdos e, consequentemente, uma melhor preparação para os atendimentos em cenários reais.

O professor /facilitador também avaliou o desempenho dos alunos participantes através de um questionário/checklist. As respostas obtidas através do questionário de avaliação dos atendimentos foram reunidas, lidas e analisadas a partir da análise de conteúdo do tipo temático, sendo aplicado as seguintes etapas no processo: pré-análise, exploração do material ou codificação e tratamento dos resultados e interpretação.

A presente pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado do Pará – Campus VIII, sob o Parecer nº 4.459.663, de 13/12/2020.

Questionários utilizados para coleta dos dados: 

Figura 1. Questionário referente a avaliação dos alunos sobre as simulações

Questionário referente a avaliação dos alunos sobre as simulações
Fonte: dados do autor.

Figura 2. Questionário de desempenho do aluno no cenário 1

Questionário de desempenho do aluno no cenário 1.
Fonte: dados do autor.

Figura 3. Questionário de desempenho do aluno no cenário 2

Questionário de desempenho do aluno no cenário 2.
Fonte: dados do autor.

 Figura 4. Questionário de desempenho do aluno no cenário 3

Questionário de desempenho do aluno no cenário 3
Fonte: dados do autor.

3. RESULTADOS

Diante disso, foram compilados os dados referentes ao desempenho dos alunos nas sessões de simulação. Esses dados foram retirados dos questionários/checklists respondidos pelo professor (questionários 02,03 e 04 – ver métodos) que ministrou as sessões de simulação nos três cenários (parada cardiorrespiratória, dor torácica e acidente vascular encefálico) para cada um dos 29 alunos participantes. Conforme as informações obtidas, as estações de PCR e AVE obtiveram uma percentagem de acerto acima de 80% pela maior parte da amostra estudada (72% dos alunos para PCR e 75% para AVE), enquanto no cenário de dor torácica aguda, apenas 55% dos alunos acertaram mais de 80% das questões pesquisadas, denotando uma maior dificuldade na assimilação dos conhecimentos dessa estação, conforme gráfico 1.

Gráfico 1. Desempenho dos alunos durante a atividade de simulação

Desempenho dos alunos durante a atividade de simulação
Fonte: dados do autor.

Foram compilados, também, os dados referentes ao nível de satisfação dos alunos nos três cenários de treinamento simulados (cenário 01-PCR, cenário 02-DTA, cenário 03-AVE). Esses dados foram coletados através da aplicação de questionário (questionário 01 – ver métodos) aos alunos, após a conclusão de cada sessão.  Foi possível concluir que 100% dos entrevistados avaliaram como satisfatório a prática das sessões de simulação realística como método ativo de ensino/aprendizagem no preparo dos alunos para realizarem atendimentos reais.

Em relação às sugestões para melhora das sessões de simulação, apenas 30% dos alunos da amostra fizeram suas considerações, estando listadas abaixo as principais (mais frequentes):

  • Confecção de checklist com os pontos a serem cumpridos em cada cenário e colocação desse checklist em local visível durante o treinamento.
  • Cronometrar melhor o tempo das estações.
  • Material didático resumido de cada estação, “flashcards” com informações como: algoritmos da PCR, tabelas de drogas mais utilizadas e sequências de passos durante as estações em cada situação específica.
  • Simulação com pacientes atores, permitindo realização de anamnese mais detalhada, que fica limitada no caso de uso de bonecos.
  • Diversificação de casos clínicos e maior repetição dos procedimentos durante as estações, permitindo melhor fixação dos conteúdos.
  • Uso de bonecos/manequins com mais recursos tecnológicos.
  • Maior número de exames de imagem e traçados de eletrocardiograma durante as sessões.
  • Manter as gravações dos treinamentos disponíveis para serem revisadas pelos alunos em outros momentos, e não só nas sessões de “debriefing”.
  • Organizar melhor as equipes e determinar a tarefa de cada um no grupo antes de iniciar os atendimentos.

Ao analisar a melhora das sessões de simulação, Ximendes et al. (2019) reforça a necessidade dos docentes acerca da confecção de checklist, bem como da diversificação de casos clínicos no laboratório de simulações, a fim de contribuir para uma boa formação acadêmica do estudante de medicina, pois é uma atividade antecipatória e realística das situações que serão vivenciadas na profissão.

Enquanto Bastos et al. (2020), além dos itens citados acima, sobre a melhoria, destaca a necessidade de uma melhor abordagem dos temas durante a formação médica, para que possa haver uma correta realização dos atendimentos, visto que tais temáticas são de suma relevância nos cenários de urgência e emergência em atendimentos reais.

Assim, o laboratório de simulação pode realmente fortalecer o cenário da educação médica, no intuito de contribuir na formação de profissionais com capacidade de exercer a profissão com maestria, melhorando os indicadores de saúde de forma geral (ARAÚJO et al., 2021).

4. DISCUSSÃO 

Estudos evidenciam que a simulação aumenta a percepção do clima de segurança do paciente na terapia do AVE agudo e reduz diretamente o tempo médio de atendimento em 12 minutos, assim como aumenta o número de pacientes que são trombolizados em menos de 30 minutos (TAHTALI et al., 2017; JANG et al., 2020), tornando claro o impacto positivo dessas atividades durante o processo de formação dos alunos. O AVE é uma das emergências mais frequentes nos prontos-socorros, e, para condução do atendimento a esta doença na fase aguda, são exigidos conhecimentos, habilidades, equipe multiprofissional e ações em uma curta janela de tempo (TAHTALI et al., 2017). Assim, o aumento do conhecimento sobre AVE torna-se de grande utilidade para a maioria dos participantes (CASOLLA et al., 2020). Somado a isso, o treinamento em equipe durante a simulação está associado a um aumento no desempenho do grupo, uma vez permite que habilidades como comunicação, respeito aos colegas e divisão de tarefas sejam colocadas em prática, preparando os alunos para atuarem em equipes multiprofissionais durante a vida profissional (BOHMANN et al., 2021).

A PCR foi o segundo cenário com maiores acertos, estando em consonância com o trabalho de Cortegiani et al. (2017), que mostrou que os treinamentos simulados apresentam melhoras imediatas de desempenho dos alunos, em termos de compressões torácicas corretas e outras habilidades, com manutenção desse impacto positivo até 6 meses após o treinamento.

A presença de feedback durante o treinamento de atendimento à PCR em sessões simuladas melhora o desempenho dos alunos de forma bem mais efetiva que outros métodos, como evidenciado por Cortegiani et al. (2017) no estudo randomizado feito com 144 alunos.

Como outros benefícios do atendimento simulado da PCR, podemos citar a melhora no desempenho dos alunos em até 30% nas seguintes habilidades: na sequência das manobras de reanimação cardiopulmonar; na carga elétrica do desfibrilador externo automático; na posição, profundidade e velocidade das compressões torácicas; na relação compressão/ventilação; e no manuseio do desfibrilador externo automático (AMERICAN HEART ASSOCIATION, 2020).

Conforme as diretrizes da International Liaison Committee on Resuscitation (ILCOR), o treinamento e a atualização em RCP e emergências cardiovasculares (infarto agudo do miocárdio – DTA e AVE) precisa ser adaptado para o público-alvo em diferentes campos metodológicos, promovendo a disseminação de conhecimentos e habilidades e melhorando a qualidade do atendimento aos pacientes reais (BRUNETTE e THIBODEAU-JARRY, 2017).

O fato do cenário 03 (atendimento da dor torácica aguda na urgência) ter obtido o menor número de acertos pelos alunos ao responderem aos questionários, pode ser atribuído a alguns fatores: neste cenário, eram abordadas situações clínicas diversas, tais como doença isquêmica do miocárdio, tromboembolismo pulmonar e dissecção aguda de aorta, exigindo dos alunos uma carga de conhecimento prévio maior, além de um raciocínio clínico mais acurado para fazer o diagnóstico correto. As condutas iniciais (exames e tratamentos) eram mais variadas e não obedeciam ao mesmo padrão como nos outros cenários, e as dificuldades na interpretação de exames de imagem e eletrocardiograma podem prejudicar a condução dos casos, aumentando os erros dos alunos.

O estudo de Oliveira (2018) também evidenciou a dificuldade dos estudantes de medicina em enfrentar situações relacionadas ao tema dor torácica. Nessa pesquisa, o autor evidencia que não foi observado o fenômeno da transferência de aprendizagem no item proposto; nesse contexto, uma das principais limitações apresentadas pelos estudantes concerne aos múltiplos diagnósticos diferenciais presentes na dor torácica, os quais, muitas vezes, não são capazes de serem elucidados pelos acadêmicos de medicina, sendo fundamental o estímulo ao raciocínio clínico ao longo do curso e o fomento a simulações reais sobre o assunto (OLIVEIRA, 2018).

Diante dessas peculiaridades e da maior complexidade deste cenário, como foi sugerido pelos alunos, a elaboração de checklists para as situações específicas, elaboração de “flashcards” com os tratamentos iniciais e uma maior diversificação dos casos clínicos durante as sessões simuladas poderiam certamente aumentar o aprendizado e o aproveitamento dos estudantes tanto nas estações sobre atendimento da dor torácica como em outras situações na Urgência.

Os estudantes deste estudo apresentaram alta satisfação com as sessões simuladas nos três cenários propostos, e isso pode ser justificado pelo fato da simulação replicar a realidade e se caracterizar por ser um método seguro e efetivo de aprendizado, sem oferecer riscos para a pessoa que está participando (PÉRSICO et al., 2020).

As fases de preparação do ambiente, com ajustes ao contexto e experiência do participante, um momento de debriefing, gerando reflexão sobre a atividade realizada e permitindo a integração dos diferentes saberes oriundos daquele meio, tornam o estudo mais participativo e eficaz (ABULEBDA; AUERBACH e LIMAIEM, 2021).

A simulação tem sido aplicada em vários ambientes, inclusive em unidades de terapia intensiva, como recurso de ensino para equipes multiprofissionais, complementando a formação e desenvolvendo mais habilidades, tendo como principal resultado a melhora na qualidade da assistência prestada aos pacientes (ABULEBDA; AUERBACH e LIMAIEM, 2021; ESCHER et al., 2017). 

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

O presente artigo evidenciou a importância da simulação realística em urgência e emergência na perspectiva discente, visto que essa é uma ferramenta útil para educação e treinamento dos alunos, que estimula o aprendizado de forma prática e dinâmica e facilita a fixação de conhecimentos e treinamento de habilidades técnicas. Ressalta-se, porém, que, como várias outras técnicas e recursos de ensino-aprendizagem, dificuldades são encontradas, e as sugestões e o constante feedback de quem está sendo treinado torna-se muito importante para o aprimoramento contínuo deste método.

Assim, ao analisar os dados deste estudo, foram identificadas algumas dificuldades e várias sugestões que podem ser facilmente implementadas para melhorar a simulação como método de ensino. Entre as sugestões para minimizar as dificuldades encontradas, as principais foram:  a utilização de checklists, a elaboração de flashcards para tratamentos e condutas iniciais, a diversificação de casos clínicos, o uso de pacientes simulados, a repetição das estações com rodízio e melhor organização das equipes.

Este estudo possui algumas limitações, como o número reduzido de participantes e as características da população estudada (apenas acadêmicos de medicina), sendo necessário, em estudos futuros, uma amostra mais abrangente, que inclua profissionais já formados e estudantes de outros cursos da área de saúde, possibilitando, assim, conclusões mais abrangentes sobre o método de simulação realística.

REFERÊNCIAS 

ABULEBDA, Kamal; AUERBACH, Marc; LIMAIEM, Faten. Debriefing techniques utilized in medical simulation. Treasure Island: StatPearls Publishing, 2021. Disponível em: www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK546660/. Acesso em: 22 fev. 2023.

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AMERICAN HEART ASSOCIATION. Guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiovascular care. Dallas: American Heart Association, 2020. Disponível em: https://cpr.heart.org//media/cprfiles/cprguidelinesfiles/highlights/hghlghts_2020eccguidelines_portuguese.pdf. Acesso em: 22 fev. 2023.

ARAÚJO, Hugo Wesley de et al. Implantação do laboratório de simulação clínica de uma escola médica no interior do nordeste brasileiro: reflexões sobre o processo. Medicina (Ribeirão Preto), v. 54, n. 2, 2021.

BASTOS, Thalita da Rocha et al. Conhecimento de estudantes de medicina sobre suporte básico de vida no atendimento à parada cardiorrespiratória. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 44, n. 4, 2020. DOI: 10.1186/s42466-021-00132-1.

BOHMANN, Ferdinand O. et al. Simulation-based training improves patient safety climate in acute stroke care (STREAM). Neurological Research and Practice, v. 3, n. 1, p. 1-7, 2021. DOI: 10.1186/s42466-021-00132-1.

BRUNETTE, Veronique; THIBODEAU-JARRY, Nicolas. Simulation as a tool to ensure competency and quality of care in the cardiac critical care unit. Canadian Journal of Cardiology, v. 33, n. 1, p. 119-127, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cjca.2016.10.015. Acesso em: 22 fev. 2022.

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ESCHER, Cecilia et al. Method matters: impact of in-scenario instruction on simulation-based teamwork training. Advances in Simulation, v. 2, n. 25, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1186/s41077-017-0059-9. Acesso em: 22 fev. 2023.

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LUNA, Renato A.; SPIGHT, Donn. Simulação em educação médica: uma mudança necessária. Revista Hospital Universitário Pedro Ernesto, v. 13, n. 4, p. 57-61, 2014.

MACHADO, Clarisse Daminelli Borges; WUO, Andrea; HEINZLE, Marcia. Educação médica no Brasil: uma análise histórica sobre a formação acadêmica e pedagógica. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 42, n.4, p. 66-73, 2018.

MELO, M. et al. Ensino mediado por técnicas de simulação e treinamento de habilidades de comunicação na área da saúde. Revista Médica de Minas Gerais, v. 26, p. e-1805, 2016.

OLIVEIRA (2018)

PEDROSA, Tania Moreira Grillo; COUTO, Renato Camargos. Erros e eventos adversos na assistência médico-hospitalar. Revista Médica de Minas Gerais, v. 24, n. 2, p. 216-222, 2014.

PÉRSICO, Raquel Stocker et al. Simulação realística na residência multiprofissional, contribuições na formação e segurança do paciente: relato de experiência. Research, Society and Development, v. 9, n. 8, p. e232985609-e232985609, 2020.

TAHTALI, Damla et al. Implementation of stroke teams and simulation training shortened process times in a regional stroke network: a network-wide prospective trial. PLoS One, v. 12, n. 12, p. e0188231, 2017. DOI:10.1371/journal.pone.0188231.

XIMENDES, Gerson da Silva et al.  Avaliação da implantação do laboratório de habilidades e simulação: percepções e vivências de docentes da graduação médica. Revista Colloquium Vitae, v. 11, n. 3, p. 72-78, 2019.

[1] Doutorando do Programa Ensino em Saude na Amazônia da Universidade do Estado do Pará (PPG ESA UEPA). Mestrado em ciências médicas na área de concentração clínica médica-Investigação Clínica pela Universidade de São Paulo (USP). Especialização em Clinica Médica: RQE n° 5349; Especialização em Cardiologia: RQE n° 5342; Especialização em Ecocardiografia: RQE n 5364; Especialização em Medicina Intensiva : RQE n 5350. ORCID: 0000-0002-2334-360X. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/7890221131531452.

[2] Orientador. ORCID: 0000-0003-1781-0133.

Enviado: Dezembro, 2022.

Aprovado: Fevereiro, 2023.

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David José Oliveira Tozetto

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