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O método autógeno integrado a psicoterapia breve: relato de um caso

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

JÚNIOR, Jorge Gomes [1]

JÚNIOR, Jorge Gomes. O método autógeno integrado a psicoterapia breve: relato de um caso. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 02, Vol. 05, pp. 61-88. Fevereiro de 2019. ISSN: 2448-0959.

RESUMO

O propósito deste trabalho é retratar a psicoterapia breve e possíveis elementos complementares em que os métodos e técnicas autógenas compõem a temática central. As propostas autógenas têm sua origem no conhecimento hipnótico. Logo, abordaremos pontualmente os antecedentes históricos e a investigação científica da produção de conhecimento sobre a hipnose. Concluindo, será relatada a experiência de caso, vivida pelo autor, expondo ocorrências importantes nas 12 sessões propostas na terapia, com o intuito de discutir o ganho terapêutico e o quanto o Relaxamento Autógeno veio acrescentar e acelerar o processo de modificação psicofisiológica e todos os demais benefícios.

Palavras chaves: Psicologia, Psicoterapia Breve, Relato de caso, Hipnose, Relaxamento Autógeno.

INTRODUÇÃO

O propósito deste trabalho é retratar a psicoterapia e possíveis elementos complementares em que os métodos e técnicas autógenas compõem a temática central. Será relatada a experiência de caso, vivida pelo autor, com o intuito de discutir o ganho terapêutico e o quanto o Relaxamento Autógena veio acrescentar e acelerar o processo de modificação psicofisiológico e todos os demais benefícios.

As propostas autógenas têm sua origem no conhecimento hipnótico. Nesta área específica, verifica-se o trabalho árduo e a seriedade científica de inúmeros autores dando continuidade a estudos complexos. Logo, nos deparamos com elementos extraídos das técnicas hipnóticas, com os elementos no campo da percepção dos estados hipnóticos, os efeitos fisiológicos nos praticantes e também os elementos externos que constituem o ambiente.

Antes de retratar autores e teorias, referindo-se aos métodos autógenos, faz-se interessante abordar, brevemente, os antecedentes históricos e a investigação científica da produção de conhecimento sobre a hipnose.

É sabido que a hipnose é conhecida há muito tempo na história da humanidade. Dando início num período em que a temática já gerava efeitos e muita curiosidade, na história moderna da hipnose no séc. XVIII, o primeiro nome é Franz Anton Mesmer (1779). Sua proposta de tratamento era realizada com grande número de pessoas e, com elas, acreditava atuar com um magnetismo animal na cura das mesmas ao gerar um equilíbrio entre os seres. Não há ainda provas científicas do magnetismo animal (Chertok, 1989). Hoje é conhecida a força da sugestão tanto a nível verbal quanto a importância de um ambiente sugestivo em sua terapia coletiva propiciando inúmeras curas. Esses fenômenos deixaram a amostra à relação entre estado hipnótico e estado coletivo (Chertok & Stengers, 1990). Os resultados obtidos na época eram advindos de sugestões em diversos níveis, aprendizagem por imitação de modelos, pelas expectativas diante da tarefa e etc.

Foi James Braid (Braid, 1843; Díaz & Hidalgo, 2008; Schultz, 1966), que “inventou” ou introduziu a palavra hipnotismo a prática proposta sendo usada pela primeira vez em 1843. Ele pensou que o sonho hipnótico era produzido pela fadiga ocular devido ao paciente olhar de forma fixa os olhos do terapeuta ou um objeto luminoso. A partir desse momento, a hipnose adquire espaço sendo bem sucedida na França como um tratamento para a histeria.

Seguindo mais adiante, no fim do séc. XIX, surgiram duas escolas com posicionamentos teóricos distintos. A primeira era a escola de pensamento de Nancy, onde Auguste A. Liebeault e Hipolyte Berheim propunham que o estado hipnótico é uma intensificação dos recursos presentes no sonho e na vigília, onde a sugestão atua sobre a imaginação do praticante. Já a escola do hospital Salpètrière em Paris, cujo representante é Jean-Martin Charcot (1889) defendia a ideia de que o estado hipnótico é um estado patológico produzido pela histeria.

Em outubro de 1885, chega um rapaz em Paris para trabalhar no laboratório de Charcot e assistir suas aulas. Seu nome era Sigmund Freud (Breuer & Freud, 1893,1895; Chertok & Stengers, 1990). Ele tinha muito interesse nos estudos até porque já havia ocorrido um contato, em 1882, com o caso de Anna O., cujo terapeuta era o Dr. Joseph Breuer. E qual seria a explicação para o processo de auto-hipnose após a morte do pai da paciente. Fato esse que manifestava sintomas histéricos, como paralisia dos membros, contraturas, distúrbios visuais e de linguagem e etc. E, também, vira o desaparecimento de sintomas após a paciente relatar como se originara um deles. Ao voltar a si, o sintoma havia desaparecido. Em 1889, Freud (1996ª) defini o método catártico inaugurado por Breuer. Mas foi com Charcot que aprendeu ser preciso recorrer à Psicologia para a explicação da neurose histérica e da hipnose.

Ao longo dos estudos, com uma complexidade que oculta o conhecimento do ocorrido, Freud (1996b) angariou algumas informações. Para ele a maneira ideal no qual surgi às lembranças por meio da hipnose devia-se ao fato de que, naquele momento a resistência era totalmente suprimida. Outro detalhe é que a sugestão direta se opunha à análise como técnica. E a hipnose, por sua vez, opunha-se à análise da resistência do paciente, e principalmente a transferência. Sobre esta última, a velha técnica hipnótica, gerava sentimentos violentos, positivos ou negativos. Os hipnotizadores estavam sujeitos aos avanços dos hipnotizados que confundem atração com amor (tal como aconteceu entre Breuer e Bertha Pappenheim e entre Freud e Anna von Lieben). Isto é, seria preciso aprender controlar corpos e almas. A consequência de toda essa questão foi o afastamento cada vez maior entre teoria e terapia. Então, Freud abre mão da hipnose, por esses e mais alguns outros motivos, e segue seu caminho desenvolvendo a Psicanálise (Chertok & Stengers, 1990).

É importante ressaltar a fase da segunda guerra mundial. Neste período ocorreram estudos e aplicações diversas de técnicas de hipnose conforme a demanda dos soldados no campo de batalha. Um momento de muita dor física e inúmeros traumas de batalha, a técnica foi bastante usada principalmente na Europa (Díaz & Hidalgo, 2008).

Enfim, chegamos no primeiro laboratório de investigação da hipnose fundado por Ernest Hilgard, em 1957, na Universidade de Stanford. A investigação buscava relacionar variáveis como idade, sexo e características da personalidade e etc. Em seguida, em 1959, Barber cria um laboratório na fundação Medfield do Hospital de Massachussetts. Era estudado o efeito da imaginação, das expectativas, das crenças, da motivação e da emoção sobre a capacidade do paciente ser hipnotizado. Martin Orne foi o terceiro fundador de laboratório, em 1960, na Universidade de Harvard, e remanejado posteriormente para a Universidade de Pennsylvania na Filadelfia. Eles analisavam os fatores motivacionais da hipnose (Díaz & Hidalgo, 2008).

Podemos, então, adentrar os estudos e desenvolvimento dos métodos autógenos. E, ao verificarmos suas origens, descobrimos que a produção de conhecimento das técnicas de hipnose e o relato das percepções dos praticantes descrevendo como se sentiram durante o estado hipnótico ao longo dos estudos produziram, aos poucos, um aglomerado de conteúdos psicofisiológicos sobre o ocorrido. Ao acumular características específicas do estado hipnótico profundo, viu se abrir novas possibilidades de práticas benéficas nesta vertente da natureza humana. Este momento deu início a oportunidade de criação de novos e valiosos métodos.

Durante os anos de 1900, alguns pesquisadores neuropatologistas e neurofisiologistas se empenharam em estudos sobre o sono e a hipnose, sendo uma referência deles Oscar Vogt. Ele relata que certos pacientes atingiam por si mesmos um estado hipnóide executando autossugestão de sensações de peso e de calor nos membros. Ao aplicar os exercícios mentais de peso e de calor regularmente os resultados foram: a redução da sensação de fadiga e a redução da tensão muscula. Logo, o método foi denominado pelo autor “repouso autohipnótico profilático”(Rivera, 1980, 1982).

Johannes H. Schultz um pesquisador psiquiatra também alemão, ao ter contato com os estudos de Vogt se demonstra interessado. Então, desenvolve um método em que o paciente participe um pouco mais, atuando no campo da hipnoterapia. Esse método é o Treinamento Autógeno. Schultz aprofundou seus estudos ao fazer uso da concentração sobre as sensações de peso e calor nas extremidades, já sabendo ser possível a indução dos pacientes a um estado de relaxamento profundo, observado anteriormente por Oscar Vogt (Rivera, 1980, 1982).

Mais tarde, veio introduzir a concentração sobre as funções respiratória e cardíaca, sobre os órgãos abdominais e também sobre a cabeça (Schultz,1967). Esse estado específico que traz com ele muitos detalhes que o diferencia do estado hipnótico foi chamado de estado autógeno. É bem enfatizado pelo autor o conceito de concentração passiva, visto que a participação mental é imprescindível. Mantém-se a atenção nas tarefas com atitudes involuntárias deixando o processo de concentração agir naturalmente. Ao acompanhar o exercício, a vivência não se afirma nem no extremo da concentração voluntária, nem no abandono à mercê da imaginação. A prática repetida aumenta a habilidade dos pacientes na autoindução em atingir esse estado benéfico. Exercício mental que convida o praticante desde o início a conhecer suas potencialidades e adquirir autonomia. O estado autógeno vai atingindo níveis cada vez mais profundos, acompanhado pelos ganhos que tudo indica se ampliarem.

As pesquisas demonstraram ganhos relevantes nos praticantes. Foi percebido um tipo de fenômeno de descarga que acontece durante o estado autógeno (Luther, 1970 et al. citado por Rivera,1980). Por exemplo, foram identificadas descargas neuronais motoras, sensoriais e psíquicas em que acredita-se ser um benefício do estado autógeno. Até porque, outros tipos de relaxamento não são eficazes a ponto de produzirem os efeitos fisiológicos típicos do estado mencionado.

A atuação do Relaxamento Autógeno (RA) no campo fisiológico acontece de forma a auxiliar o sujeito a adaptar-se perante os elementos estressores. A busca de uma homeostase interna é o melhor meio para o processo de adaptação frente ao estresse, o auxílio do RA corresponderia ao habitual de um ser ideal perante uma vivência sem acumular caracteres psicologicamente estressantes.

Vemos os resultados diante dos estudos de Luther (1970) citado por Rivera (1980) em que o estado autógeno ocasiona uma diminuição generalizada da reatividade do sistema nervoso simpático. Sistema esse responsável por grande parte das atividades involuntárias de órgãos internos como, o aumento do batimento cardíaco, o aumento da pressão arterial e outros. Ocorre a ação na zona ergotrópica atuando em regiões como a parte posterior do hipotálamo e núcleos de matéria gris, e também o mesencéfalo e o romboencéfalo anterior. Regiões essas relacionadas com a excitação em geral, e com os mecanismos fisiológicos responsáveis pela atividade motora e o trabalho físico. Logo, há uma inibição da reação de estresse, com a redução generalizada dos impulsos corticais no hipotálamo posterior, através do sistema límbico, e com a consequente desativação relativa da zona diencefálica ergotrópica.

Nessas bases neurofisiológicas é visto que a ação trofotrópica do Treinamento Autógeno, e de outras formas de relaxamento e concentração passiva, pode vir a exercer uma redução de estímulos aferentes propioceptivos sendo que o relaxamento muscular é um fenômeno essencial que compõe a condição para atingir o estado autógeno. A zona trofotrópica compreende principalmente a porção rostral do hipotálamo, a área pré-óptica e supra óptica, e parte do septo. Regiões essas intimamente relacionadas com os mecanismos de proteção, recuperação e eliminação. Eliminação essa: defecação e vômito (Luther, 1970 et al. citado por Rivera,1980).

As alterações fisiológicas acompanhadas, nos primeiros momentos de pesquisa, por relatos, se intensificaram com os dados mensurados em laboratório e toda a tecnologia que veio se aprimorando.

É necessário abordar algumas características fisiológicas típicas do Estado Autógeno (Luther, 1970 et al. citado por Rivera,1980). Uma característica marcante é a interferência generalizada do Estado Autógeno no tônus muscular. Durante a prática é gerado um relaxamento e a redução do tônus em todo o corpo. Há registro de sujeitos que experimentaram um aumento de tensão do tônus muscular. A hipótese cautelosa é que podendo ser um erro técnico na prática do exercício, ou, até mesmo, uma não adequação do sujeito à prática do exercício. Outra possibilidade é estar acontecendo uma descarga autógena no momento de tensão. Ou seja, uma manifestação do tipo motor, sensorial ou psíquico, onde acredita-se que o fenômeno mantém sua origem relacionada com uma história traumática do indivíduo. Momento este benéfico ocorrendo uma eventual eliminação de tensão psíquica acumulada.

Sobre a função cardíaca, o estado autógeno diminui significativamente a frequência cardíaca. Neste item há indicações severas para uso consciente em cada sujeito, havendo contraindicação para fórmulas específicas com o intuito de redução da frequência cardíaca. A respiração também sofre uma redução. Pode atingir uma diminuição de até 15% sobre a frequência de repouso.

Sobre a circulação periférica e temperatura da pele, Schultz (1967) observou uma sensação subjetiva de aumento de temperatura no exercício de calor. O detalhe é que ocorre realmente a elevação de 1 a 3 graus Celsius (c°) apenas neste momento da prática, e também um aumento da circulação periférica das extremidades. Sobre a resistência epitelial galvânica, observou-se na maioria das vezes, um aumento progressivo da resistência elétrica da pele. Mas em alguns sujeitos foi detectada a diminuição da resistência galvânica, cuja atribuição hipotética deu-se a intromissão de pensamentos ansiogênicos e de descargas autógenas somáticas. Concluindo com a pressão sanguínea arterial, em que as pesquisas indicaram a redução da pressão sanguínea nos praticantes. Visto que essa redução apresenta-se de forma regular após a 3ª ou 4ª semana de treinamento (Luther, 1970 et al. citado por Rivera,1980).

Importante destacar que a maior parte dos itens citados possuem respostas fisiológicas discrepantes por parte de poucos sujeitos não se adequando à prática em meio há algumas semanas. Constituiu assim, contraindicação para a prática do método em alguns sujeitos.

De um modo geral a produção de conhecimento abriu a oportunidade de criação de novos métodos, mas principalmente, uma atuação de forma mais específica conforme as necessidades do praticante, como exercícios específicos de órgãos, formulas de orientação fisiopatológica e psicopatológica específicas (Luther, 1970 et al. citado por Rivera,1980; Schultz, 1969;).

Aproveitando o ensejo é adequado neste momento abordarmos a técnica autógena que foi utilizada na proposta terapêutica deste caso e será relatada no trabalho. Técnica essa criada pelo Profº Dr. Almir T. Boechat, no Laboratório de Prevenção e Controle do Stress do Departamento de Psicologia da UFJF (Boechat, 1998).

A técnica de Relaxamento Autógeno (RA) foi derivada do método de Treinamento Autógeno (TA) de Schultz (1967), sendo considerada uma variante deste último. Também se apresenta como um valioso auxílio para a saúde e melhoria da qualidade de vida das pessoas, contrapondo-se, assim, ao dia-a-dia conturbado em que vivemos.

A primeira distinção a ser levantada é quanto à redução da quantidade de exercícios. Por exemplo, não é realizado exercícios específicos sobre o coração, no plexo solar e na fronte. Outro detalhe importantíssimo é a distinção entre o método e a técnica. Os métodos anteriores atuavam gradativamente aprimorando cada exercício por vez, de semana a semana. O sujeito ao dominar todos os exercícios após certo tempo buscaria a vivência integral do método em prol de atingir o estado autógeno pleno. Já a técnica do RA possibilita a vivência integral do processo em cada vez em que se propõe a prática. Ou seja, o exercício é global onde a aquisição do estado autógeno se faz como meta e os efeitos são atuantes nos sujeitos que aderem a técnica. A técnica é simplificada e com a duração indicativa de vinte minutos a tornando pouco maçante em sua prática.

O RA mantém o termo “autógeno” devido aos processos de autoaprendizagem e autodesenvolvimento nos quais o sujeito é estimulado a participar ativamente ao longo da vivência. São fornecidas instruções para que o exercício de autoaplicação da técnica ocorra de forma diária e para que haja a descoberta de como retirar dela o melhor proveito.

Ao usar a técnica abre-se um leque de possibilidades intrínsecas ao ser humano, mas o objetivo principal é proporcionar ao praticante a capacidade de criar, vivenciar e apropriar-se de um estado mental tranquilo, de um relaxamento físico e gerar consequentemente equilíbrio do sistema nervoso. Assim as consequências das situações mais diversas de angiogênese podem vir a serem modificadas de forma rápida.

Ao relatar de forma sucinta uma sessão de RA (Boechat, 1998) podemos expor que de começo o sujeito é convidado a buscar uma posição confortável. Pode ser sentado ou deitado. É necessário desligar-se mentalmente de qualquer fonte de preocupação com o propósito de criar um estado íntimo de máxima tranquilidade consolidando, assim, um relaxamento físico e mental dentro das suas capacidades que intensificarão com a constante prática. Ao longo da vivência o sujeito é instruído a evocar ou criar cenas ou imagens mentais que o facilite a atingir subjetivamente um estado de paz e relaxamento.

Então o sujeito é convidado a respirar tranquilamente, aprofundando-se na experiência subjetiva de relaxamento. Ao longo da prática passará por diversos exercícios sendo os básicos: o desligamento do meio externo, o relaxamento corporal, o peso, o calor, a chave de acesso e a preparação para o retorno.

O papel da imaginação no RA é fundamental, ou seja, um sujeito com elevada habilidade imaginativa possui um elemento de grande recurso para melhor adesão à técnica. Durante a prática a imaginação do sujeito é estimulada o tempo todo, não apenas em seu aspecto reprodutivo, evocativo, mas também em seu aspecto criador e prospectivo. Encerrando a prática, tendo o sujeito o interesse de voltar às atividades normais do dia-a-dia, deve-se realizar o exercício de “retrocesso”, de Schultz (1967), com a fórmula: “flexionar o braço, respirar profundamente, abrir os olhos”.

Outro elemento útil no RA é o uso de uma chave de acesso. Faz-se necessário o uso de uma formula padrão para possibilitar ao praticante alcançar rapidamente o estado de comutação psicofisiológica. Na prática da hipnose, de forma semelhante, esta função de acesso é preenchida pelo uso do sinal hipogênico. No RA os mesmos resultados podem ser obtidos se o praticante criar uma chave de acesso utilizando-se de uma palavra, uma frase, uma imagem mental, um trecho musical ou uma combinação desses elementos. A preocupação na escolha da chave de acesso deve-se voltar para um elemento em que o sujeito possa representar de forma significativa sua experiência pessoal do estado de relaxamento. Essa particularidade subjetiva do sujeito abre espaço para dois tipos de aplicação da técnica de formas distintas, tanto individualmente quanto em grupo. A aplicação em grupo requer do orientador cuidados específicos que facilitem a cada participante, de forma individualizada, a sua vivência do processo.

É importante citar que, como no método do TA, têm sujeitos que possuem dificuldades para aderir a técnica do RA. Há situações em que apenas uma adequação soluciona as dificuldades e o mal-estar presente nas pessoas. Seja o não uso de algum exercício específico, a aplicação com menos minutos nas vezes iniciais e etc. Mas, ainda assim, há um pequeno índice de pessoa desistentes da prática por não conseguirem aderir à técnica de forma agradável e proveitosa.

A PSICOTERAPIA BREVE ADOTADA E SUAS TEORIAS E TÉCNICAS

Esse capítulo tem o propósito de abordar, resumidamente, as teorias e técnicas adotadas para a Psicoterapia Breve, no qual trabalhamos o caso relatado, sendo este o arcabouço da terapia. Seguimos a proposta de Héctor J. Fiorini (1987), onde suas teorias nos possibilitam uma atuação interventiva de forma integrada. Ou seja, o estágio supervisionado adotou tais teorias e técnicas com o intuito de que, ao chegar à conclusão da necessidade de aderir a terapias complementares, conforme as demandas se apresentassem, teríamos esse recurso. É importante ressaltar que alguns itens foram encaixados no roteiro devido às indicações experientes do professor que supervisionou o estágio obrigatório. Estágio este coordenado pelo departamento de Psicologia. Sendo, o mesmo, realizado em dependências específicas, neste caso, num ambiente clínico, onde são vivenciadas as experiências práticas dos alunos formandos pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Fiorini (1987) destaca que, em seus estudos, ficou evidenciado o papel importantíssimo do primeiro contato com o paciente na Psicoterapia Breve. Nessa primeira entrevista, o desempenho do terapeuta pode ter uma influência decisiva na continuidade ou no abandono do tratamento. Ao haver prosseguimento, seus efeitos ecoarão na eficácia que o processo terapêutico possa vir a alcançar. Assim, enfatiza a importância das entrevistas iniciais terem uma estrutura básica e premeditadamente definida.

Primeiramente, buscamos cumprir funções diagnósticas e de fixação de um contrato. Mas a preocupação vai além, onde o teórico enfatiza um ponto crucial que é o efeito de um papel terapêutico gerado nesse momento inicial. Cabe ao terapeuta a realização de intervenções adequadas para potencializar o efeito. O autor (Fiorini, 1987) expõe um estilo de entrevista que consolida uma aliança sólida já de início. Em suas diversas observações clínicas, os dados obtidos que analisam o novo estilo de entrevista vêm demonstrando uma redução acentuada no índice de deserção e outros mais benefícios.

Ao fazer uso da proposta recomendada o roteiro utilizado nas três primeiras sessões ficou da seguinte maneira: na primeira sessão, os quinze minutos iniciais foram reservados para deixar o paciente bem à vontade expondo o que o trouxe à psicoterapia. Neste momento manter-se atento aos gestos, à inclinação do olhar, como e onde se acomoda na sala e etc. Manter, já de início, uma preocupação com o diagnóstico aproximativo e a condição de vida do paciente. Leva-se em conta a estabilidade geográfica, horário, situação econômica, local de residência e obrigações familiares. O interesse é propiciar o máximo de empenho possível do paciente, como também identificar fatores patogênicos.

Ao longo do diálogo, abordar de forma natural o que o paciente conhece sobre o tratamento, o que espera do tratamento e o quanto está disposto a empenhar-se. É necessário esclarecimentos e antecipações mínimas com o intuito de tirar dúvidas do que virá a ser feito. Para que essa dinâmica na entrevista ocorra é necessário um posicionamento relacional simétrico entre paciente-terapeuta. A indicação é que construa uma regra interacional que caracterize reciprocidade de direitos à mútua informação. Nesta primeira entrevista, cabe ao terapeuta uma imagem global, introdutória, porém ao mais precisa possível, acerca do diagnóstico, em primeiro lugar, e do prognóstico que liga a uma perspectiva de tratamento.

Na segunda entrevista, é necessário enfatizar o modo como será conduzida a interação na tarefa terapêutica. Após a fase do nervosismo de começo de terapia, faz-se importante ouvir mais o que o cliente traz em sua fala com um pouco mais de atenção e domínio dos aspectos a serem referidos e analisados. Os três diagnósticos como metas a serem cumpridas são: primeiro, o diagnóstico de condição de vida. Há indicações para que ele se conclua apenas na segunda entrevista. E o segundo diagnóstico é o clínico e psicodinâmico, possuindo muitos subitens. Os mais importantes são: principais sintomas que o motivam, tempo e evolução e circunstâncias de variação, supressão e agravamento; grupo familiar do paciente, estrutura, marcos em evolução, enfermidades importantes, clima emocional e papeis assumidos; relação êxito-fracasso, em diversas áreas: maturação, jogos, estudos ou trabalho, sexualidade, sociabilidade e autoestima (avaliação do ego); e aspectos interacionais do comportamento na entrevista, modalidade de comunicação, dados transferenciais e contra-transferenciais e identificação de estruturas de comportamentos predominantes.

E por último, o diagnóstico da motivação e das aptidões do paciente para a psicoterapia, o reconhecimento do caráter psicológico de seus distúrbios, a capacidade de introspecção e sua disposição para transmitir com honestidade o que possa reconhecer de si próprio, o desejo de se compreender, a atitude de participação ativa na busca, a disposição para experimentar e tentar mudar, a esperança de que o tratamento alcance resultados positivos, a disposição de realizar certos sacrifícios para alcançar tais resultados.

Na terceira entrevista, caso sejam realizados os diagnósticos anteriores, o programado é o esclarecimento do terapeuta sobre o tipo de orientação terapêutica mais adequada decorrente do diagnóstico geral. É feita a exposição do foco ou focos de atuação. E conclui com o tempo de tratamento, número de sessões semanais e o valor das mesmas. O número máximo de sessões é necessário deixar em aberto, sendo preciso avaliar constantemente o processo do tratamento e da relação terapêutica. Enfim, ocorre o momento de fechar o contrato.

Nas sessões subsequentes a programação era mais maleável. No início das demais sessões, ficaram reservados os primeiros quinze minutos livres para o paciente relatar o que desejasse. Em seguida, dava início fazendo uso de intervenções verbais conforme a necessidade, no foco ou focos, que se fizessem presentes ao longo do processo terapêutico. As intervenções foram as seguintes: interrogação, proporcionar informação, confirmar ou retificar os conceitos do paciente sobre sua situação, clarificar e reformular o relato do paciente, recapitular e resumir pontos essenciais, assinalar relações entre dados, interpretar o significado dos comportamentos, sugerir atitudes e mudanças a título de experiência, indicar a realização de certos comportamentos com caráter de prescrição (intervenções diretivas), dar enquadramento à tarefa, comentar o significado do uso das intervenções anteriores (meta-intervenções) e outras intervenções como: cumprimentar, anunciar, interrupções, mudanças de horários e etc (Fiorini, 1987).

O RELAXAMENTO AUTÓGENO: A APLICAÇÃO NO PACIENTE X.

É importante começar o relato esclarecendo que por não ser permitido descrever minuciosamente a aplicação da técnica, abordarei apenas pontos que embasam essa técnica e alguns elementos específicos utilizados no tratamento do paciente X.

A aplicação foi feita em uma sala de mais ou menos três metros quadrados. Havia uma poltrona disponível. E a acústica da sala era razoavelmente agradável. O silêncio no ambiente era fundamental. Era sugerido ao paciente a busca de desligamento do meio externo em uma posição sentada. Fecha-se os olhos sempre em busca de diminuir os sentidos e a agitação mental. O aplicador direciona suas palavras consolidando um ambiente sereno e tranquilo. Foi sempre colocado para o paciente a importância de valorizar esse momento de reposição de energias e descanso. Sendo necessário deixar passar os pensamentos de questões externas que viessem invadir sua tela mental. A concentração exige que o praticante volte-se apenas para sensações corporais e para o direcionamento realizado pelo aplicador via voz.

Após consolidado um estado agradável de redução da agitação física e mental realizamos uma vistoria sensitiva em que o praticante passava mentalmente por todas as partes do corpo analisando se havia pontos de tensão. Neste caso avaliamos também se havia algum ponto de dor. Sendo em seguida aplicado respectivamente os exercícios do peso e calor em suas distintas fases estimulando a percepção do sujeito dentro do processo de indução para afirmação do estado autógeno.

Durante o exercício de calor aproveitou-se a energia imaginada para sugerir saúde física e psíquica. Essa proposta sugestiva foi feita tanto antes quanto depois de fazermos uso da chave de acesso utilizada para ativar o estado autógeno. A chave de acesso usada foi a frase: ”sinto-me em paz!” No qual o praticante ficava repetindo mentalmente por um tempo. Onde, logo após o uso, era sugerido que não necessariamente havia pontos de dor ou tensão. A sugestão de dor foi utilizada de forma pontual, por um tempo, devido o mal-estar pós-cirúrgico fazer-se presente.

Ao longo da técnica foi utilizado termos que auxiliassem a consolidação de um ambiente tranquilo no meio interno. Foi utilizado termos como: sereno, tranquilo, suave, equilibrado e etc. Sempre após um exercício voltava-se a essas sequências de palavras. Tudo isso com um tom e intensidade de voz adequados para cada momento ao longo da aplicação.

Após ter atingido um estado profundo de relaxamento por um bom tempo era executado o preparo para o retorno. Era sugerido que percebesse sua respiração suave e tranquila. Em um fluxo natural no entrar e sair de ar dos pulmões. Que começasse a perceber o meio externo pouco a pouco. Viesse a mexer os braços e as pernas e abrisse os olhos no momento em que achasse adequado.

Concluindo com algumas características pessoais do paciente. É interessante abordar que o paciente X. teve uma intensa afinidade com a técnica. Disciplina e interesse também são algumas de suas características durante as aplicações. No início, era essencialmente necessário fazer uso do relaxamento em busca de equilíbrio psicofisiológico diminuindo dores, estresse e ansiedade. E o paciente mesmo praticando numa intensidade semanal baixa e ter pouca experiência com o processo de relaxamento, ainda sim conseguia um envolvimento extraordinário e, por consequência, bons resultados.

A PSICOTERAPIA BREVE EM SUAS SESSÕES

Paciente do sexo masculino, idade de 23 anos, chegou em uma instituição de estagiários em Psicologia Clínica com queixas de problemas no trabalho. Pelo fato do seu quadro abarcar consequências físicas graves, tendo feito uma cirurgia de emergência, foi indicado pelo psiquiatra buscar acompanhamento psicológico.

O caso do paciente X. foi avaliado na reunião de supervisão de estágio de um professor junto com os alunos prestes a se formarem. De início, percebia-se que seu quadro apresentava questões emergenciais de psicossomatização grave. Havia acabado de fazer uma cirurgia anal (esfíncter interno e externo da região). Situação essa devido à vivência do quadro de constipação intestinal. E, em seguida, por ter ocorrido um desarranjo abrupto, ocasionando uma fissura anal. Sendo que na fase pós-cirúrgica estava sendo acompanhado por um proctologista e um psiquiatra. O segundo citado, o encaminhou para a psicoterapia.

Nesse período, era relatado uma ansiedade intensa ao lembrar do local de trabalho. Lugar este que era fonte de suas queixas. Alegava estar sobrecarregado em suas funções de trabalho e prestes a abandoná-lo, para solucionar seus problemas. Encontrava-se temporariamente afastado devido à dimensão do ocorrido em sua recuperação física na fase pós-cirúrgica.

As queixas do paciente eram presentes em inúmeras ocasiões nesta fase inicial. Em seu discurso o mais enfático era sobre a ansiedade gerada apenas ao pensar no trabalho. Mas estavam presentes outros momentos difíceis frisados por ele. Por exemplo, a agressividade no trânsito, perda da memória em avaliações acadêmicas, impaciência no namoro e etc. Momentos estes colocados como desagradáveis. As dificuldades ecoavam como argumentos legítimos fazendo sentido a indicação do psiquiatra. Os detalhes o mobilizaram a buscar acompanhamento psicológico. Ao longo das entrevistas iniciais emergiram mais questões, no qual conflitos internos e inseguranças eram percebidos. Não sabia se gostava do curso de nível superior que estava fazendo. Não havia aprendido a escolher, segundo o paciente, e, assim, não refinou seu interesse pelas coisas ao longo de seu desenvolvimento nas fases anteriores da vida. Agora, se encontrava com conflitos, inseguranças e desmotivações.

Após avaliação de supervisão, as possíveis propostas terapêuticas foram consolidadas. A primeira indicação é que seria proveitoso que o paciente fizesse uma terapia de no mínimo um ano por haver, segundo sua demanda terapêutica, a necessidade de atuação em uma proposta de esclarecimento. O paciente demonstrava recursos para o tipo de intervenção. A questão é que era, também, necessário considerar os fortes sintomas de psicossomatização presentes no paciente. A demanda, inicialmente, exigia uma terapia de apoio visando a redução dos sintomas gerados pelo alto nível de ansiedade e estresse. Então, chegou-se a conclusão da necessidade de expor ao paciente que era o mais indicado um acompanhamento psicoterapêutico numa atuação de esclarecimento durante um ano. Proposta esta viável em outros estágios dentro da instituição. Mas, ressaltamos que era possível fazermos uma psicoterapia breve em uma proposta de apoio, visando atuar em questões emergenciais tanto no psíquico quanto no fisiológico.

Desde o início, o Relaxamento Autógeno era colocado dentro da proposta psicoterápica como uma ferramenta possivelmente eficaz na complementação do tratamento. Suas questões psicossomáticas foram o motivo de indicação para o tipo de terapia. Conforme a necessidade, após o tratamento, seria feito um encaminhamento para ele dar prosseguimento. Foi exposto ao cliente, na quarta sessão, o tempo a ser realizado e o número de sessões mínimas, a expectativa da terapia e objetivos esperados a serem atingidos. Além disso, encontraríamos um foco a ser trabalhado nos direcionando a uma temática principal. Sempre estávamos atentos a motivação do cliente avaliando se futuramente haveria investimento da parte do mesmo. Logo, foi iniciado o tratamento pelo fato do paciente X. demonstrar forte investimento pessoal para com o contrato proposto.

Este contrato terapêutico, já relatado com mais detalhes em itens anteriores, se constituiu da seguinte maneira: o compromisso de realizarmos doze sessões ao longo dos três meses, com a proposta inicial de uma sessão por semana. Foi conversado que se houvesse necessidade aumentaríamos o número de sessões por semana. Situação esta que não ocorreu. A abordagem teórica utilizada foi da Psicoterapia Breve de base psicanalítica cujo teórico é Héctor Fiorini. O atendimento foi realizado em uma dada instituição seguindo todas as suas normas. O acolhimento iniciou foi em 13/12/2012 (primeira entrevista) e a sessão final ocorreu em 14/03/2013.

Na primeira sessão, foi perguntado para o paciente o que o motivou a procurar a instituição. Ele expôs que havia procurado uma psicoterapia seguindo um encaminhamento do psiquiatra que alegava a necessidade de um acompanhamento psicológico. E ao voltar para ele a reflexão e responsabilidade sobre o ato, foi então perguntado o que ele achava. Seu posicionamento foi que sim, achava necessário. Argumentou lembrando passar um momento de grande dificuldade na vida, onde ele afirmava estar desmotivado com tudo, tanto com a faculdade quanto com o trabalho. E por ser uma pessoa bem instruída, concluiu detalhando que isso estava lhe gerando ansiedade e efeitos físicos danosos.

No continuar da sessão, ao ser perguntado quando começou essa desmotivação o paciente posicionou-se dizendo ser uma combinação de fatores: problemas no término da sua graduação, onde apareceram questões que o impediriam de se formar; no trabalho, houve uma mudança de equipe que o sobrecarregou de inúmeras formas e se tornou multifuncional, ou seja, teve que auxiliar no aprendizado das tarefas dos novos funcionários, fazer horas extras e etc. Atuou em diversos setores. No início disse que até gostava de participar de alguma forma. O que mexeu com ele mesmo, expõe o paciente, foi o patrão ter perguntado o que ele fará no futuro ao se formar. Ele não teve resposta. Afirma não se ver fazendo nada disso no futuro. Esclareceu que faz e começou a fazer o curso por acaso, por ter passado no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio). Lembrou que quase desistiu do curso no primeiro período. E complementa dizendo, com a mão na cabeça, que devia ter desistido. Alegou irritabilidade excessiva, onde citou implicância com os familiares em casa e falta de paciência no trânsito. Chegou a entrar em uma discussão na via pública. Quando percebeu em meio a essa correria estava na mesa de cirurgia por causa de problemas intestinais.

Em seguida, abordou suas atuações em diversos tipos de trabalho. Alega já ter feito quase tudo e ter adquirido uma ampla experiência. Falou sobre uma ex-namorada recente legitimando que um dos fatores que o leva a sarar é que todo este desgaste que o está abalando atrapalha em sua vida conjugal. A vivência de estados emocionais destemperados traz prejuízos para as relações.

Ao avaliar a primeira sessão, tanto em gestos, movimentação e expressões emocionais e linguísticas percebi uma pessoa bem à vontade. A pressão vivida no quesito novidade em uma psicoterapia pouco teve efeito. A sessão foi bem rica de conteúdos seguindo o roteiro da primeira entrevista. O acolhimento para com o paciente e a consolidação de uma boa relação aconteceram de forma sutil e natural pelo fato de o mesmo ter boa habilidade de comunicação linguística e pouca dificuldade para expor os detalhes de sua intimidade. Fez bom uso dos primeiros quinze minutos demonstrando ter se preparado mentalmente de forma antecipada. Em seu discurso bem organizado estava presente o mapeamento das questões com tom reflexivo no qual vinha elaborando.

O paciente foi bem detalhista e natural com as inúmeras questões, principalmente as mais delicadas. Tudo isso possibilitou um momento agradável e produtivo, acredito que para ambas as partes. Já possuindo um estilo interrogativo voltado para as questões vivenciadas, as intervenções interrogativas foram pontualmente usadas apenas direcionando o relato quando necessário. O posicionamento simétrico terapeuta/paciente fez-se plenamente atuante ao trazer as informações mínimas para que o paciente saísse confortável e seguro da primeira entrevista. Por exemplo, previsão de fechamento de contrato, mais tardar, na terceira ou quarta sessão. Definimos o valor da sessão. E por causa de um bom início consolidava-se uma boa relação na psicoterapia.

Na segunda sessão, dei continuidade complementando os diagnósticos programados pela psicoterapia. O paciente X. havia demonstrado uma boa relação e um investimento psicológico intenso para com o tratamento. Desta vez, chegou atrasado em dez minutos. Ele, espontaneamente, justificou o atraso logo que começamos.

Ao começar abordando a motivação de tratamento envolvendo pessoas importantes, lembrei o seu comentário sobre uma ex-namorada. Ele então deu continuidade. Relatou que essa pessoa estava tentando chamar sua atenção, mas para ele era uma ex-namorada mesmo. Mas afirmou ter servido muito para demonstrar seu desequilíbrio. Sobre a família, disse que não sabiam muito do tratamento que estava fazendo. Tenta preservar os pais por serem idosos, logo não havendo nenhum tipo de imposição dos mesmos. Conclui dizendo saber estar vivendo um momento estranho e de sofrimento.

Então o abordei sobre ocorridos importantes e êxitos e fracassos. Ele de imediato expôs queixas sobre a temática. Narrou suas experiências na fase infantil e fechou dizendo que era muito parado e isso o prejudicou gravemente. Ilustrou também contando seu trajeto de experiência de trabalho. Disse não saber escolher bem o que quer e o que gosta. Acredita ser devido não ter feito nenhum esforço para realizar seus desejos até a fase presente de sua vida.

Esta segunda entrevista foi bem tranquila. Principalmente, porque alguns dos diagnósticos do roteiro haviam sido preenchidos espontaneamente na entrevista anterior. Houve depoimentos longos de forma ainda mais firme e segura. Já havia construído uma boa relação terapêutica. Um detalhe importante é que, nesta sessão, ele não queixou-se de dores físicas. Mas relatou estar fazendo uso dos medicamentos. E mantinha ainda uma certa euforia para fecharmos o contrato o quanto antes possível.

Na terceira sessão, começou relatando que foi tudo tranquilo ao longo da semana. Manteve uma rotina de repouso dando início às atividades na faculdade bem aos poucos. Expôs que estava passando bastante tempo com sua mãe em casa. Teve a necessidade de voltar ao tema de fracassos e êxitos. Comentou que uns quatro anos atrás conversou com os pais sobre o tema. Ele chegou à conclusão que seus pais não impuseram/incentivaram nada a ele, podendo tê-lo prejudicado ao longo de seu desenvolvimento. Mas não os culpa porque são pessoas muito simples. Continuando a sessão, trouxe que, às vezes, o que o tem incomodado é pensar que terá que voltar para o trabalho. Em suas palavras: “só de pensar fico triste”. Sua condição física estava menos desagradável. Com menos dores. Os sistemas gástrico e intestinal pouco o incomodavam, sendo retomado o funcionamento de ambos. Relatou a preocupação pelo controle de uma alimentação saudável, buscando um funcionamento intestinal adequado, pois ainda estava muito sensível. E, neste momento, expôs o nome dos medicamentos que eram usualmente necessários nesta fase pós-cirúrgica. Um antidepressivo contínuo e um de dor para usar quando necessário.

Na terceira sessão concluiu-se a fase de entrevistas. A experiência foi bem gratificante fluindo de forma bem natural e otimista. O paciente, mesmo num emaranhado de fatores, já voltava-se para questões da personalidade requisitando não só terapia de apoio, mas demonstrando uma maturidade psíquica para uma terapia de esclarecimento. Era preciso fechar um contrato mais adequado possível junto à equipe de supervisão.

A quarta sessão fugiu ao padrão, sendo marcada um pouco antes por não haver um intervalo de uma semana devido a aproximação de um recesso. E, como já citado anteriormente, foi, neste momento, colocado ao paciente a possibilidade de buscar uma proposta terapêutica de duração de um ano em outros núcleos dentro da instituição, ou poderíamos atuar dentro do nosso contrato de três meses em focos específicos. O foco principal dirigia-se para abordar o seu ambiente de trabalho. Foi exposto no contrato a oportunidade de preparo para uma futura terapia de esclarecimento ou análise, para onde futuramente o encaminharíamos. Mas que, neste momento, voltávamo-nos para uma terapia de apoio. As operações de enquadramento foram bem efetuadas. Ele confirmou estar animado e que pretendia começar o mais rápido possível.

Na quinta sessão o paciente X iniciou dizendo ter passado bons dias. Mesmo em período de muitas festas, no fim do ano, afirma ter controlado sua alimentação. E, também se privou do uso de bebida alcoólica. Buscou descansar em uma cidade pequena de forma bem tranquila. Já esteve pensando em trancar a faculdade e se preparar para fazer um novo curso de graduação. Comentou que, ao longo dos acontecimentos da semana, conheceu uma pessoa. Voltando-se para sua condição física e psíquica, disse que teve dias recentes em que pensou no trabalho, porque, inclusive, encontrou com amigos funcionários, e se sentiu muito ansioso e triste. Alguns dias antes da sessão teve queimação estomacal e o intestino cessou seu funcionamento mesmo mantendo sua rígida alimentação. Onde expôs a vontade de retornar ao gastroenterologista, sendo que a data marcada para retorno vence só três meses após a última consulta. Foi liberado pelo proctologista não sendo necessário retornar. A não ser que houvesse intensos desconfortos no local da lesão ou outras questões emergenciais. Disse, também, que não gostou do psiquiatra que o atendeu. Pediu que indicasse um, se possível. Não indicamos.

Nesta sessão, a dinâmica de comunicação foi naturalmente agradável, mas a sensação de sofrimento vinda do paciente se aproximou da sensação percebida na primeira sessão. Fez-se presente uma adesão à psicoterapia e consolidação da confiança para com a proposta. Além das questões desagradáveis, percebidas em sua fala alegando dor e sofrimento, ele também perpassou por temas como: programação futura de estudo e o início de um possível futuro namoro. Para o trabalho, havia consolidado uma estratégia de apenas responder e corresponder com suas responsabilidades específicas. No final da sessão apliquei pela primeira vez o Relaxamento Autógeno com a duração de quinze minutos. Um tempo de duração adequado para quem está conhecendo a técnica.

No momento de avaliação após a aplicação, ele relatou que se sentiu muito bem. O tempo de aplicação curto foi proposital para que o praticante se aproprie da técnica sem sensações desagradáveis. Sobre a concentração, disse ter poucos momentos em que os pensamentos invadiram. Vivenciou a sensação de calor, mas não a de peso. O ambiente foi bem controlado, sem ruídos. Ao aplicar, percebi uma adaptação rápida a proposta. Logo, enfatizei a necessidade de praticar diariamente. Viu-se, no paciente, um otimismo devido a boa adesão da técnica e, por consequência, a expectativa de bons resultados.

Na sexta sessão, o paciente foi direto ao assunto. Disse que a semana começou de forma difícil porque ele teve que retornar ao serviço. A decisão era se voltava para o trabalho ou não. Isso lhe gerou muita ansiedade, afirmou o paciente. Não conseguia escolher o que era melhor a se fazer: se era melhor pedir demissão ou voltar e fazer com que os patrões o demitissem. Então, um dia antes do retorno relatou que não estava bem. Como estratégia, foi atrás da recém-namorada em outra cidade, só voltando no horário do trabalho. Iniciando a atividade, cumprimentou os amigos e resolveu tratar bem os não tão amigos. Quando deu o horário de se dirigir para a sua psicoterapia não entrou em detalhes com os patrões, apenas disse que tinha que sair. Alegou ser um tipo de estratégia para eles o mandarem embora. No final da sessão apliquei o relaxamento.

Nesta sessão sua temática foi apenas o trabalho e a angústia gerada. O ambiente estava associado à dor e ao sofrimento. Por meio de intervenções de clarificação, era compreensível que as relações interpessoais não eram saudáveis naquele ambiente. E apenas com intervenções de assinalamentos e recapitulações, ele mesmo construiu suas momentâneas estratégias de enfrentamento e convivência. No momento de avaliação de como foi o relaxamento, ele afirmou que foi bom mas que naquele dia estava bem cansado, consequência de sua noite. Expôs que, ao longo da aplicação do RA, teve a sensação de ter cochilado porque parou de ouvir a voz e se perdeu no processo. Na verdade ele dormiu sim, gerando até uma certa dificuldade para fazê-lo retornar no término. Neste período o paciente não havia tentado a autoaplicação da técnica em casa alegando falta de tempo.

Na sétima sessão, o paciente chegou bem enérgico expondo que o trabalho está muito estressante. Com apenas duas semanas de retorno, vivenciava desagrado e sofrimento intenso. Sendo que no início de sua semana acabou se sentindo muito mal. Acredita ter desandado seu intestino devido ao tamanho estresse do fim de semana. Período este em que mais trabalha. E afirma que não alterou sua alimentação. Mas traz uma novidade. Comentou que sua mãe lhe disse que de madrugada tem acordado de duas em duas horas para comer. Ia até a cozinha e pegava pães inteiros e puros, e voltava para a cama mastigando. Ele conclui dizendo que odeia pão puro e não se lembra do ocorrido. Normalmente, não possui comportamentos sonambúlicos. Comentou, também, sobre a estratégia rígida no trabalho de não ajudar ninguém. Ele acredita haver um complô contra ele criado pelos funcionários próximos da gerência. Mas os próprios funcionários já estão se cansando da gerência. O paciente confirmou que trancou a graduação e começará de imediato o cursinho preparatório do vestibular. Na aplicação do relaxamento, ocorreu tudo bem. Mas, em seguida, o paciente disse que marcaria os médicos para tratamentos paralelos. Eu confirmei ser muito importante a medida a se tomar.

A importante avaliação desta sessão é que ao abordar a questão do trabalho, fomos relembrar os elementos significativos vividos por ele. Ao ir relatando, após alguns minutos, eu fazia reformulações sintéticas do relato, quando adequado, dentro de uma proposta de clarificações. Em sessões anteriores, foi exposto ao paciente que era necessário encontrar alternativas capazes de substituir estereótipos pessoais ou grupais que gerassem boas consequências. Ao expor a estratégia rígida de não fazer nada além da sua função, postura essa que ele nunca teve no passado, perguntei como lidaria com os amigos. Disse conversar com cada um lhes avisando que não é pessoal e sim contra a gerência.

Algumas sugestões foram realizadas com o intuito de que ele percebesse que sua postura influenciaria no tipo e na qualidade das relações e modificaria a dinâmica do ambiente. Onde também o ambiente poderia lhe rejeitar. A escolha era dele. Mas por trás de tudo isso, a técnica sugestiva tinha como alguns de seus objetivos a redução de ansiedade a níveis toleráveis e o fortalecimento egóico. Elementos estes visivelmente abalados no paciente. E junto a psicoterapia utilizávamos paralelamente o relaxamento autógeno e, via a “descarga autógena”, mantínhamos o paciente em níveis de estresse e ansiedade toleráveis aos seus campos físico e emocional.

Na oitava sessão, começou falando do carnaval. Comentou que trabalhou os quatro dias. No último dia se divertiu saindo um pouco. Sobre a saúde, disse estar bem. Veio com uma novidade em que terá que fazer biópsia porque apareceu alteração em uma de suas pintas. Comentou que se alimenta pouco no verão, logo o intestino funciona menos neste período. Mas está bem. Comentou que, há poucos meses atrás, ao fazer atividade esportiva (futebol) percebeu alterações prejudiciais em sua criatividade, cognição e resposta motora. A questão é que teve que parar a atividade e não sabe bem o que aconteceu. Até porque trocou o futebol pela corrida. Tem corrido um dia sim outro não. No trabalho o ambiente está ficando desgastante de novo, ele afirma. Ocorreram inúmeras questões de mau funcionamento no estabelecimento que o incomoda muito. No final da sessão foi realizado o Relaxamento Autógeno. Ele comentou que iniciou seu exercício de autoaplicação do relaxamento. Reservaram os vinte minutos necessários para o relaxamento aproveitando o intervalo de almoço.

Sobre sua ausência na sessão anterior, foi um ocorrido imprevisível de fácil compreensão. A preocupação estava no distanciamento de uma sessão para outra gerando possíveis prejuízos na dinâmica de sua elaboração psíquica e manutenção homeostática, ambas efetivadas pela terapia.

Nesta sessão, é mais uma vez necessário destacar o seu sofrimento com as questões do trabalho. As dificuldades no ambiente foram tão desgastantes que relatou na sessão que estava pensando em pedir dispensa. Ele já tinha sido avisado que a escolha era dele, não ia dar nenhum parecer sobre a melhor decisão a se tomar. Era de fácil compreensão que naquele momento ele esperava algum auxílio da minha parte. A minha intervenção foi sugestiva, ao fim da sessão. Indiquei que ele pensasse, vivenciasse mentalmente, e relatasse os fatores que o faziam continuar no emprego. Mas que fizesse esse exercício também com a segunda hipótese que eram os fatores para sair do emprego. Ele disse que poderia fazer isso ali no mesmo instante. Eu indiquei que não era o mais adequado. O importante era que fizesse isso com calma em casa. Ele entendeu.

Sobre o relaxamento, ele expôs muitas dificuldades no exercício de autoaplicação. Esclareci-o que até dominar a técnica, essa dificuldade faz- se presente. A única indicação para progredir, é que continue exercitando. Neste período, ele vivia muitos conflitos e dúvidas, mas estávamos conseguindo manter uma condição fisiológica equilibrada.

Na nona sessão, iniciou relatando estar bem. Focou primeiro no namoro, onde afirma que o relacionamento está bem agradável. Depois, foi para sua questão de dúvida vivida devido alguns amigos lhe oferecerem emprego. E afirmou que gostaria muito de ter saído do trabalho antes do carnaval e estava procurado uma questão para ser despedido. Expôs que alguns funcionários pediram dispensa. E, com empolgação, comentou que a postura dos funcionários em geral tem modificado. Perceberam que o grande gerador de dificuldades no ambiente de trabalho é por culpa da gerência. A saúde está bem, mas tem ocorrido alguns esquecimentos tanto nos estudos quanto com tarefas diárias. Disse estar mantendo a atividade física. O relaxamento foi bom, onde relata estar percebendo todos os exercícios.

O paciente continua demonstrando estar cada vez mais envolvido na prática do Relaxamento Autógeno. Sua habilidade de concentração vem aumentando. Na parte do “sinto-me em paz” ele aparentemente deu uma cochilada. Não sabemos ao certo, pois na avaliação ele não chegou a uma conclusão precisa. Sabemos que ele atingiu níveis profundos no estado autógeno. Sutilmente, comecei prepará-lo para o fim do tratamento. Também conversamos sobre as expectativas do tratamento. Ele demonstrou estar satisfeito com os presentes resultados.

A décima sessão começou animadíssima. Ele entrou perguntando efusivamente: adivinha o que aconteceu? Eu respondi: “vai casar, ou melhor, foi mandado embora”. Ele confirmou. E demonstrou sentir-se muito bem. Veio em uma hora boa. O paciente vivia um estado de muito sofrimento. Um dia antes de voltar ao serviço, porque não trabalhava todos os dias da semana, uma noite antes sempre tinha insônia. Disse que era envolvido por pensamentos sobre ter que ir trabalhar no dia seguinte. A saúde está bem. A biópsia acusou apenas excesso de melanina na pinta. Disse estar reorganizando sua rotina. Atualmente, sente-se um “passarinho fora da gaiola”. Principalmente nos fins de semana.

Sobre o Relaxamento Autógeno: A aplicação ocorreu de forma bem proveitosa durante os vinte minutos. O paciente relatou ter acompanhado e vivenciado todas as fórmulas. Mas comentou ter ocorrido pensamentos invasivos. Ao expor sinceramente que não conseguiu praticar a técnica em casa. Eu o motivei e esclareci a importância da prática aumentando a intimidade e a eficácia da técnica. Pontuei a importância de tentar não entregar-se ao sono e tentar distinguir o relaxamento profundo e o sono. E concluí o preparando para o término do tratamento. Neste momento, ele afirmou ter chegado à conclusão que, após o término desse período em terapia, ele buscará outro psicólogo.

Na décima primeira sessão, o paciente entrou bem descontraído. Ele disse: “pode relaxar e se abrir”. Eu apenas sorri. Ao começar ele iniciou com um tom de término. Disse que estava tudo bem. Dos seus quinze minutos, inteiramente livre, falou apenas sete minutos. Passou pelo cursinho e sua facilidade nos estudos. Afirmou estar sem ansiedade nenhuma, característica essa que considera sua. A sensação que tem é que parece estar até tomando remédio. Afirma que seu problema era o trabalho. E concluiu dizendo que tomou a decisão de que não voltará ao psiquiatra.

Apliquei o Relaxamento Autógeno e foi tudo muito bem. Ele comentou que tentou praticar a técnica só que tem dormido no meio do exercício. Realizou também a noite, a aí dormiu antes de chegar ao final. O motivei a continuar exercitando até consolidar o domínio da mesma. A sensação de “passarinho fora da gaiola” está diminuindo. “Aparece apenas no fim de semana”, afirma o paciente. Não é uma questão que o incomoda muito. Por ter ficado muito tempo sem poder usufruir os finais de semana perdeu o costume. Precisa apenas de readaptação, ele mesmo relatou em sessão. Sobre o psiquiatra, chegamos à conclusão que não era necessário intervir em sua tomada de escolha já que ele estava psicofisiologicamente bem.

Na décima segunda sessão, ao iniciar eu passei ao paciente os detalhes de como seria nossa programação nesta sessão final. Foi dado um tempo para ele falar como se sentia. O Acolhimento como tradicionalmente foi feito, mas não necessariamente os quinze minutos. Indiquei que fosse sucinto já que estávamos terminando a proposta terapêutica. Em seguida faríamos o Relaxamento Autógeno. Atividade essa que foi bem aproveitada pelo praticante. Fomos então analisar os ganhos gerados pela terapia. Começamos pelo objetivo principal do estágio que é a redução do estresse e da ansiedade. Depois passamos por temas como: habilidade de mapeamento das questões, estratégias de enfrentamento, autoconhecimento e etc. Concluí motivando-o sobre o amadurecimento e preparo para um tratamento mais profundo.

CONCLUSÃO

O trajeto terapêutico do paciente deu início nos graves sintomas físicos. Naturalmente, sua avaliação diante do momento de sofrimento dirigiu sua atenção para o ambiente de trabalho. Sendo esse seu principal motivo de queixa. Era assim a postura e percepção ao chegar para a terapia: “Estou com disfunções fisiológicas por causa do meu trabalho”.

Ao mapearmos e analisarmos descritivamente questões de cunho interativo no passado percebemos que se mantinham mentalmente atuantes no presente. Aos poucos, chegamos a crenças e sentimentos que o incomodavam. Exemplo: “Virei multifuncional por causa da gerência que não se preocupa nem com os funcionários – eu estou incluído – nem com o bom funcionamento do estabelecimento”.

Foi relevante o fato do patrão ao perguntar sobre o que ele faria ao se formar o incomodando tanto. Reviu, minuciosamente, vários acontecimentos, expôs vários exemplos da má conduta do gerente. Até aqui, o culpado, ainda e somente, era o externo. Suas lembranças eram dolorosas devido à incoerência entre a sua conduta onde ajudava a todos os setores de boa vontade sem ter ocorrido o mínimo de reconhecimento dos patrões. Ao atingir alto nível de estresse no trabalho, isso lhe gerou prejuízo no sistema gastrointestinal. Após a vivência da dificuldade física veio à tona não só a dor do mal-estar para com o trabalhar em demasia, mas também o mal-estar de não afinidade com a área de conhecimento e atuação em que se metera. Então viu que além daquela instituição ser mal gerenciada, aquele tipo de serviço não era o que ele queria. Mas, ainda aqui, se expressava culpando o meio externo unicamente. Exemplo: “Os funcionários, especialmente do escritório, estão de conluio com a direção e contra mim”.

Diante das circunstâncias o paciente teve um ego forte para lidar com a realidade de seu trabalho sendo um projeto que se empenhara, mas não tinha nada a ver com suas expectativas. Doou-se vivendo o excesso de trabalho e uma preocupação em manter o funcionamento mínimo do estabelecimento, segurança e bem-estar dos usuários. E ao se encontrar enfermo sofreu por não haver o mínimo de gratidão. Exemplo: “Fiquei três meses de repouso em casa e não recebi nem um telefonema por parte da direção perguntando se eu estava me recuperando bem”.

E então atingimos o nível de autoavaliação e autocompreensão em busca de esclarecer o porquê de tamanha ansiedade ao lembrar-se do trabalho. Inicialmente, fomos aos poucos preparando o campo, por meio de clarificações, assinalando aspectos psicologicamente mais ricos. E se era uma queixa dele, nas primeiras fases, onde as dificuldades eram uma combinação de fatores, havíamos introduzido um método que faz chegar à autocompreensão pela discriminação. Método esse que indica percorrer a massa de acontecimentos e de suas vivências, fixando os pontos marcantes.

Emergia, enfim, suas “verdadeiras” questões. Lembra que não escolheu o curso e o campo de atuação. Na verdade, acredita não saber escolher. Revê como foram suas experiências nas fases anteriores da vida, e também de um diálogo antigo com seus pais sobre essa questão. Neste momento já havia uma maturidade dentro da terapia. Descobre que é de seu poder a tomada de escolha direcionando sua vida. Assume então a responsabilidade de mudança. Exemplo: “Meus pais são pessoas simples, não os culpo”.

Sobre as questões fisiológicas, foram todas controladas. Estava bem regenerado de sua cirurgia. No início, era essencialmente necessário fazer uso do relaxamento em busca de equilíbrio psicofisiológico diminuindo dores, estresse e ansiedade. O funcionamento do sistema gastrointestinal que vivia abalado encontrava-se estável. Mas, acima de tudo, o paciente X. estava equilibrado emocionalmente e com bastante autoestima para encontrar uma profissão e novos projetos de conquista em que tivesse verdadeira afinidade. De imediato, voltou para o cursinho. Exemplo: “Gosto da área de saúde”! O paciente atingiu o nível para uma terapia de esclarecimento. Foi feito o encaminhamento.

Diante do processo de tratamento da Psicoterapia Breve em conjunto com o Relaxamento Autógeno (RA), a pergunta que me fiz era se o desenvolvimento do paciente iria acontecer da mesma forma se não houvesse a junção de técnicas. E mais além, quais foram os fatores do RA e da Psicoterapia Breve que geraram mudanças terapêuticas no Paciente X.?

O interessante é que a Psicoterapia Breve está por toda parte, até porque o RA está contido dentro da proposta da psicoterapia, logo é evidente a maior presença das técnicas da Psicoterapia Breve ministradas a cada sessão e gerando um visível desenvolvimento no paciente.

Venho enfatizar a importância do RA no tratamento. É uma técnica que disponibilizou um suporte essencial para darmos prosseguimento à terapia de apoio. Mesmo no caso deste paciente que não foi tão disciplinado com a prática da técnica de relaxamento ao longo da semana, em casa, ele veio aderiu a vivência da técnica ao lhe ser aplicado com tamanha facilidade. Acredito que tenha vivenciado um tipo de fenômeno de descarga que acontece durante o estado autógeno (Luther, 1970 et al. citado por Rivera,1980). O benefício do estado autógeno gerando descargas neuronais motoras, sensoriais e psíquicas, em conjunto da psicoterapia breve, foi surpreendente. Este ponto que vem justificar e valorizar a eficácia da técnica de relaxamento dentro desta realidade.

Era percebido que o paciente, por ter atingido estados profundos de relaxamento dentro do estado autógeno, de imediato, só com algumas aplicações, se reequilibrava psicofisiologicamente de forma tão agradável que isso o motivava a se empenhar nas questões racionais e emocionais que geravam conflitos internos. Houve características intensamente presentes no paciente como as dores locais pós-cirúrgicas, as dores estomacais e a disfunções intestinais foram habilmente controladas até a dissolução e resolvimento de questões psicológicas.

Claro que nas questões psicológicas houve uma ação mútua entre a Psicoterapia Breve e o RA. Mas é sabido que o estado autógeno dentro da proposta terapêutica atua sobre a ansiedade e o estresse do sujeito. Sua eficácia no bom uso aconteceu devido o direcionamento lúcido da técnica ao ser diagnosticado a exigência da demanda do paciente.

Outro detalhe é o quanto o RA pode auxiliar indo além das questões fisiológicas. Neste caso, as sugestões foram direcionadas apenas em busca de equilíbrio, saúde e motivação. Sempre direcionando tanto para o campo físico quanto psíquico. É sabido ser preciso muitas pesquisas nesta área. Tudo indica que o poder de atuação com inúmeros recursos terapêuticos desta técnica, são vastos.

Sobre a minha experiência vivida dentro deste caso, na posição de terapeuta, foi marcante. Mesmo diante de toda a insegurança gerada pela minha inexperiência, a prática foi agradável e de grande aprendizado. O suporte fornecido pelo professor supervisor e os colegas de estágio também foram essenciais para essa pequena segurança que ali existia a me impulsionar.

A relação com o paciente e a sua habilidade de comunicação facilitaram bastante. Mesmo sabendo que naquele momento falaríamos mais de dor e sofrimento era um momento em minha semana muito agradável e esperado. O melhor de tudo é que conseguimos seguir à risca o contrato e no fim tudo saiu dentro das expectativas planejadas.

A experiência vivida no caso foi essencial para a minha construção de identidade na Psicologia. Agradeço a oportunidade de aprendizado, teórico e prático, tanto a Psicoterapia Breve de base psicanalítica quanto o relaxamento de base hipnótica, pois sei que essa vertente de pesquisa não é tão popular em nosso departamento de Psicologia. Acredito que esse pouco interesse está em todo o campo de atuação e pesquisa contemporânea da Psicologia mundial. Esse tipo de busca de conhecimento se coloca como exótico neste meio. Mas, para mim, que tenho grande afinidade com esse tipo de metodologia e interesse em pesquisar a natureza do ser nesta vertente, afirmo, me encheu de ânimo.

REFERÊNCIAS

Boechat, A.T. (1998). O Relaxamento Autógeno. O artigo foi publicado no antigo operador de hospedagem de sites GeoCities. Acessei uma versão digitalizada fornecida pelo autor.

Braid, James. (1843) Neuroypnology or the rationale of nervous sleep considered in relation with animal magnetism. London: J. Churchill.

Chertok. L.& Stergers. I. (1990). O coração e a razão: a hipnose de Lavoisier a Lacan. Rio de Janeiro, RJ.

Díaz, J.C.R. & Hidalgo, G.S. (2008). Definindo A Hipnose desde la psicobiología: Algumas líneas de desarrollo científico de los fenómenos hipnóticos. Caderno de Neuropsicologia. Vol. 2 Nº 2; Novembro 2008.

Fiorini, H.J. (1987). Teorias e técnicas de psicoterapias (7ª ed.) Rio de Janeiro: Francisco Alves.

MESMER, Franz Anton. (1779) Mémoire sur la découverte du magnétisme animal. Paris: P.F.R. Didot.

Rivera, J.L.G (1982). Del entrenamento autógeno de Schultz a la psicoterapia autógena de Luther (I). Psiquis. 3 (1): 16-21. Acedido em n.d., http://www.psicoter.es/search?ordering=&searchphrase=all&searchword=Psicoterapia+ Aut%C3%B3gen

Rivera, J.L.G. (1980). Psicoterapia Autógena. Manual de Psiquiatria. Editorial Karpos. Madrid, 39: 1-14. Acedido em n.d., http://www.psicoter.es/search?ordering=&searchphrase=all&searchword=Psicoterapia+Aut%C3%B3gen

Schultz, J. H. (1967). O treinamento autógeno. São Paulo: Editora Mestre Jou.

Schultz, J.H. (1966) Técnica da hipnose; Editora Mestre Jou.

[1] Graduado em Psicologia pela Universidade Federal de Juiz de Fora.

Enviado: Outubro, 2018.

Aprovado: Fevereiro, 2019.

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Jorge Gomes Júnior

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