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Os registros de propriedade industrial do açaí: um olhar histórico entre 1991 a 2021

RC: 74792
602
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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

MELO, Sheila De Souza Corrêa De [1], MELO, Alexandra De Souza Corrêa De [2], OLIVEIRA, Ana Vieira De [3]

MELO, Sheila De Souza Corrêa De. MELO, Alexandra De Souza Corrêa De. OLIVEIRA, Ana Vieira De. Os registros de propriedade industrial do açaí: um olhar histórico entre 1991 a 2021. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 01, Vol. 06, pp. 148-166. Janeiro de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/meio-ambiente/propriedade-industrial

RESUMO

Esta pesquisa tem como foco os registros de propriedade industrial do açaí (euterpe oleracea). A pesquisa foi metodologicamente orientada como um estudo de caso e foi executada através de pesquisa em bancos de dados industriais do INPI e The Lens. Os resultados sinalizam para a grande adoção do registro Macário no Brasil e de poucas tecnologias patenteáveis na cadeia produtiva do açaí brasileira.

Palavras-chave: Marcas de açaí, patentes de açaí, propriedade industrial, açaí.

1. INTRODUÇÃO

Segundo dados do IBGE, o Estado do Pará é o maior produtor de açaí do Brasil. Conforme a área em lilás no Gráfico 01, até 2010, a produção de açaí paraense ultrapassava 85% de toda a produção nacional e a partir de 2011 outros estados brasileiros passaram a contribuir de forma mais expressiva com a produção nacional e, como consequência, a participação do Estado do Pará passou a representar pouco mais do que a metade da produção nacional.

Gráfico 1 – Quantidade de açaí produzida em toneladas: Brasil x Pará.

Fonte: IBGE – Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura.

Em razão das suas características ecológicas, grande parte da produção de açaí está situada em áreas de várzea no estuário do amazônico. Até os anos de 1990, a produção de açaí era resultante, quase que exclusivamente, da atividade extrativista e, para isso, ela necessitava de um longo tempo de crescimento para frutificação, em média quatro anos. Após os anos 1990 a produção passou a ser constatada também em áreas de terra firme, porém ainda que com sementes de açaizeiro de origem genética desconhecida e que tiveram como efeito uma alta heterogeneidade no que se relaciona a qualidade e produtividade dos frutos (OLIVEIRA; FARIAS NETO, 2005). Frente aos obstáculos de pouca produtividade dessas variedades que eram de origem genética desconhecida, a Embrapa empreendeu uma série de pesquisas que resultaram em uma variedade de açaí altamente produtiva, com baixa estatura, de modo a facilitar a colheita, e mais adaptada às especificidades do plantio em grandes extensões de terra firme.

As pesquisas que culminaram no desenvolvimento da cultivar de açaízeiro “BRS-Pará”  começaram nos anos de 1980 tendo, como principal via de objetivo, a compreensão genética e o melhoramento da palmeira de açaí para cultivo em grandes áreas. A pesquisa paraense desenvolvida pela Embrapa acompanhou a popularização do fruto, nos anos seguintes, e a heterogeneidade dos resultados de cultivo com sua introdução em áreas de terra firme. Mais precisamente, o cultivo racional do açaí no Pará, que atualmente é o maior produtor do fruto, se iniciou em 1995 através de sementes de procedência desconhecida (OLIVERA et al., 2002).

Em um estudo desenvolvido no período do início do cultivo racional do açaí, Nogueira et al. (2013) analisaram que o mercado foi se transformando, de maneira sensível, conforme a demanda pelo produto no mercado interno se expandia,  popularizando-se em outros espaços regionais. Assim, durante o período por eles analisado (1994-2009), os mesmos observaram que

poucos estados tiveram crescimento tão expressivo nas exportações de frutas quanto o Estado do Pará. A exportação de suco de frutas, do Pará, entre os anos de 2004 e 2009, cresceu de 5.418 toneladas, para 11.350 toneladas respectivamente. (…) A nova dinâmica do mercado do açaí, tanto em nível local, quanto nacional e internacional, tem-se caracterizado por uma demanda crescente e superior à oferta (…). Neste contexto, o mercado de açaí paraense vem passando por mudanças estruturais nos últimos anos, tanto no consumo, com a elaboração de novos produtos industrializados, quanto no sistema de produção (NOGUEIRA; SANTANA; GARCIA, 2012, s/p.).

Essas transformações sinalizadas pelos autores sugerem a necessidade de uma avaliação sobre a proteção de marcas e patentes, tendo em vista a sua popularização, a versatilidade de incorporação a produtos e a compreensão dos possíveis gargalos que poderiam ter passado despercebidos na análise das políticas de inovação no contexto paraense e nacional.

Em 2006, Alfredo Homma afirmava que a expansão do consumo da polpa de açaí estaria promovendo, nos anos seguintes ao de sua publicação sobre os desafios e tendências deste fruto, a transformação do beneficiamento tradicional do açaí por modernas indústrias, visando aumentar a produtividade. E, enumerava sobre as novas possibilidades do uso da polpa de açaí que deveriam ser acompanhadas de maiores investimentos em Ciência e Tecnologia (C&T) para garantir os direitos de propriedade intelectual.

O fruto do açaizeiro deve ser o novo produto a ser consumido em todo o país e no mundo como aconteceu com o guaraná e atingindo nichos de mercado de produtos funcionais e nutracêuticos. O plantio domesticado deverá avançar nas áreas de terra firme, não só na Amazônia, mas em diversos Estados brasileiros situados na Mata Atlântica, mais próximas dos grandes centros consumidores. Não se descarta quanto ao caminho seguido por diversas plantas amazônicas, como a seringueira, cacau, guaraná e de outras plantas do Novo Mundo, como o fumo, mandioca, tomate, batata inglesa, milho, abacate, que se tornaram universais e cultivados em diversas partes do planeta. (HOMMA et al., 2006, p. 07)

Dois anos antes desta publicação, estava sendo lançado em Belém, pela Embrapa, a primeira cultivar de açaízeiro do Brasil: o BRS-Pará. Uma inovação em relação ao sistema tradicional (extrativo), que possibilitou a produção precoce de frutos de açaí, o maior rendimento de polpa e o incremento de produtividade (MELO et al., 2017).

Visto que a distribuição dos efeitos da adoção desta cultivar, a partir de 2005, na cadeia produtiva do açaí apresentava-se em escalas variadas, desde os pequenos produtores até grandes corporações, esses produtos e serviços passaram a ser objeto de proteção industrial através do registro Macário.

Em virtude da importância do açaí como produto da socioeconômica paraense, este artigo analisa a expansão do comércio do fruto através dos registros de propriedade industrial em bases de dados.

2. OS REGISTROS DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL

O sistema de propriedade industrial brasileiro pode ser considerado como o conjunto de normas que tem o objetivo de proteger os ativos intangíveis da indústria, ou seja, a riqueza não material gerada, podendo esta ser representada por uma marca, uma patente, um desenho industrial e uma indicação geográfica. A marca está associada à conquista e manutenção de mercados pelo fabricante e ao seu prestígio junto ao mercado consumidor (FRANÇA, 1997).

No Brasil, o registro de marca é regulamentado na lei n.º 9.279 (BRASIL, 1996). O legislador Brasileiro, em 1996, conceitua  “marca” como um sinal visualmente perceptível que tem como finalidade distinguir os produtos ou serviços de outros idênticos. Este sinal distingue as marcas de produtos e serviços, das marcas de certificação utilizadas para atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinada norma ou especificação técnica, das marcas coletivas, usadas por membros de entidades.

O registro de marca no Brasil é concedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) por um prazo de dez anos, prorrogável por períodos iguais, sucessivos e ilimitados. Nizete Araújo e Bráulio Guerra, em seu dicionário de propriedade intelectual, ressaltam o aspecto visual como condição essencial para a configuração da marca:

Pode ser formado por uma ou várias palavras distintas, letras, números, desenhos ou imagens, emblemas, cores ou suas combinações e por combinações de cores e palavras e ou outros sinais que podem compô-la, desde que caracterizado sempre o aspecto de ser visualmente perceptível. (ARAÚJO; GUERRA, 2010, p. 137).

O aumento de pedidos de registro de marca utilizando o termo “açaí“ apresenta característica econômica relacionada diretamente com o aumento da produção nacional de açaí nos últimos anos como o evidenciado no Gráfico 1, o que torna interessante a utilização do banco de dados do INPI como fonte de informação devido à quantidade crescente de novos documentos e a facilidade de acesso à base de dados disponibilizada gratuitamente através da Internet.

O levantamento das informações e dos dados foi feito através da consulta aos bancos de dados, onde os dados foram minerados e coletados através da palavra “açaí”, de forma única ou agregada a outras palavras, objetivando representar uma marca, seja ela de produto ou serviço.

3. AS MARCAS DE “AÇAÍ” NO BRASIL (1991 A 2018)

A coleta de dados sobre as marcas do açaí foi feita na Base do INPI. Depois de acessar a base, especificamente no repositório de marcas, foi feita a consulta utilizando o tipo de pesquisa radical, em que se objetivou localizar marcas utilizando o termo “açaí” em qualquer parte da marca, seja no início, no meio da frase ou formando nova palavra.

Ilustração 1 – Consulta na Base de Marcas por “açaí”.

Fonte: https://gru.inpi.gov.br/pePI/jsp/marcas/Pesquisa_classe_basica.jsp em 24/12/18.

O resultado da pesquisa feita em 24 de dezembro de 2018 às 21h17 obteve 3.534 processos conforme Ilustração 2.

Ilustração 2 – Resultado da pesquisa na base de marcas.

Fonte: https://gru.inpi.gov.br/pePI/servlet/MarcasServletController  em 24/12/18.

Este tipo de consulta é utilizado com bastante frequência por escritórios de registro de marcas e patentes para verificar se a marca que um cliente está buscando proteger está disponível para registro no Brasil ou se já existe alguma empresa utilizando determinada marca. Por ser uma base apenas de consulta, ela não dispõe de opção para download dos dados, sendo, portanto, necessário efetuar a transferência manual das informações presentes na base de dados do INPI para uma planilha do software editável, a partir do qual os dados poderão ser trabalhados em profundidade.

Através dessa busca inicial, uma planilha com os 3.534 processos foi gerada. Nela constam oito informações: 1) N.º de Processo; 2) Prioridade; 3) Marca Mista/Nominativa/ Tridimensional; 4) Marca; 5) Marca arquivada/registrada/requerida; 6) Situação; 7) Titular; 8) Classe.

Do volume inicial de 3534 processos, foram desconsiderados 154 processos que não estavam fazendo referência ao uso do termo açaí e que a consulta radical trouxe como resultado por conter a grafia “aça i”, e não “açaí”. Essa exclusão foi necessária para que fossem analisados apenas pedidos de registro de marca relacionados com o termo “açaí”, sem que dentre esses estejam termos contendo “aça i” como, por exemplo, as marcas contendo a palavra “cachaça” + palavra iniciada pela letra i: cachaça ipanema, cachaça iracema, cachaça itaipu, cachaça itupeva, cachaça investimento, cachaça isaías, cachaça in box e etc.

Portanto, considerando o resultado da pesquisa de 3.534 e excluindo os 154 processos que não estão relacionados com o termo “açaí”, obtivemos 3.380 (três mil trezentos e oitenta) processos administrativos no INPI de pedido de registro de marca.

Os pedidos de registro de marca utilizando o termo “açaí” no Brasil iniciaram em 1991 e, nos anos seguintes até 2010, os pedidos não ultrapassavam uma centena por ano. A partir de 2011 os pedidos se tornaram mais expressivos em quantidade, conforme ilustrado pela Tabela 1. Os pedidos de 2018 são até 24 de dezembro de 2018.

Tabela 1 – Quantidade de processos depositados no INPI para registro de marca contendo o termo “açaí”.

ANO PEDIDOS
1991 1
1992 0
1993 0
1994 2
1995 3
1996 4
1997 10
1998 10
1999 25
2000 30
2001 22
2002 20
2003 22
2004 30
2005 32
2006 51
2007 49
2008 59
2009 71
2010 78
2011 121
2012 137
2013 199
2014 272
2015 342
2016 465
2017 703
2018* 622
Total 3380

Fonte: Elaboração própria (2020).

Trinta anos após o primeiro pedido de registro de marca utilizando o termo “açaí”, foi possível observar que os pedidos se intensificaram após o ano de 2005, ano em que a Embrapa Amazônia Oriental lançava a primeira cultivar de açaizeiro: BRS-Pará, que passou a ser cultivada em outras regiões do país nos anos seguintes.

A cultivar de açaízeiro BRS-Pará foi lançada em 2005 e é uma variedade que tem como vantagem a estatura menor, a maior produtividade e a regularidade em termos de qualidade. A tecnologia BRS-Pará é uma inovação que introduziu resultados relativos não apenas ao contexto da produção, mas sobremaneira aos processos que levaram ao seu desenvolvimento tecnológico. A pesquisa de melhoramento genético e a seleção foi desenvolvida durante três ciclos de seleção massal que culminaram o cultivo de frutos após o terceiro ano, chegando a produzir anualmente cerca de 10 toneladas por hectares após o oitavo ano de cultivo.

Antes da nova variedade de açaí, o seu abastecimento era fornecido exclusivamente pelo extrativismo. Com a intensa adoção da tecnologia gerada pela Embrapa no Estado do Pará, a oferta de açaí aumentou e possibilitou a expansão do consumo do açaí, ao passo que a compreensão de “grandes perspectivas de utilização do fruto na indústria de corantes naturais, bebidas isotônicas e de refrigerantes, passou a exigir maior oferta do produto, viabilizando a exploração manejada e o cultivo em terra firme, técnicas mais eficientes, cuja aplicação resulta em maior produtividade da atividade” (BENTES et al., 2017).

O aumento na produtividade do açaí, a partir da cultivar BRS-Pará, possibilitou a expansão de sua comercialização no comércio interno e externo a partir de um fruto de plantio mais fácil, rápido e com maiores rendimentos. Estima-se que a polpa do fruto tenha um rendimento de 10% a 25%, o que supera em muito as variedades tradicionais. A distribuição dos efeitos da inserção da cultivar a partir de 2005 na cadeia produtiva pode ser observada em escalas variadas, desde os pequenos produtores que comercializam os frutos nos mercados em relações de pequena extensão, até grandes corporações que comercializam o fruto em apresentações diversas (polpa, sorvete, in natura, para finalidades culinárias ou mesmo farmacológicas) para grandes empresas no mercado nacional ou em exportação.

Ilustração 3 – Evolução dos processos administrativos no INPI de pedidos de registro de marca contendo o termo “açaí”.

Fonte: Elaboração própria (2020).

Dentre os pedidos de marca utilizando o termo “açaí”, 354 (10,6%) estavam buscando a proteção em todo o território nacional apenas do tipo nominativo, enquanto 3.026 (89,4%) pedidos estavam associados a um logotipo e a um nome de caráter misto.

Em relação à tramitação dos pedidos até 24 de dezembro de 2018, verificou-se que 761 foram arquivados, 1.777 estavam aguardando análise do INPI (requeridos) e 842 processos foram concedidos às marcas.

Tabela 2 – Situação dos processos administrativos no INPI quanto ao pedido de marca contendo o termo “açaí”. 

Status do pedido Quantidade
Marcas registradas 842
Marcas requeridas 1777
Pedidos arquivados 761

Fonte: Elaboração própria (2019).

Corroborando com essa baixa busca pela proteção de registro de marcas, em setembro de 2018, a Unidade de Gestão Estratégica do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) com apoio da Unidade de Inovação do Sebrae Nacional realizou uma pesquisa sobre “O registro de marca nos pequenos negócios” (SEBRAE, 2018), a fim de compreender a taxa de registro de marca pelos pequenos negócios. A pesquisa contou com mais de quatro mil empresas participantes, distribuídas em todas as unidades federativas do país e nela observou-se que 76% das empresas têm um nome fantasia, 59% tem uma logo ou logomarca, porém apenas 34% das empresas entrevistadas já buscou informações sobre o registro da marca.

4. AS PATENTES DE “AÇAÍ” NO MUNDO (1998 A 2020)

A pesquisa de dados patentários para este estudo foi realizada utilizando a plataforma australiana The Lens que permite acessar as informações de forma gratuita. Podendo, a mesma análise ser utilizada para outros produtos da biodiversidade paraense como o cupuaçu e o bacuri, por exemplo.

Ilustração 4 – Tela inicial da base The Lens.

Fonte: Lens.org.

Ilustração 5 – Tela de consulta à base The Lens.

Fonte: Lens.org.

O critério utilizado para busca de materiais teóricos no campo de pesquisa foi o nome científico do açaí que é euterpe oleracea, pois a grafia da palavra “açaí” em outros idiomas poderia ser prejudicada pelo não uso do “ç”. Desta forma, a pesquisa na base The Lens foi executada em 08/01/2020 e o resultado foi de 666 patentes.

Ilustração 6 – Evolução de patentes para “euterpe oleracea” de 1998 até 2020.

Fonte: Lens.org.

Ao analisar os países que estão buscando proteção industrial para alguma tecnologia relacionada com o açaí, observamos que os Estados Unidos representam mais da metade de toda a tecnologia desenvolvida no mundo com açaí. No caso de patentes brasileiras, até 08/01/2021, elas são apenas três.

Ilustração 7 – Jurisdição dos pedidos de patente para “euterpe oleracea”.

Fonte: Lens.org.

Dentre as empresas e as instituições que buscaram patentear alguma tecnologia relacionada com “euterpe oleracea” aparece a Mary Kay Inc como a titular de 68 pedidos, seguida da Colgate Palmolive Co com 27 pedidos, conforme ilustração 8.

Ilustração 8 – Maiores requerentes de patente com “euterpe oleracea”.

Fonte: Lens.org.

5. OS DESENHOS INDUSTRIAIS DE “AÇAÍ” NO BRASIL (2000 A 2016)

O Desenho Industrial é um ramo da Propriedade Industrial e o seu conceito está previsto na Lei da Propriedade Industrial nº 9.279/96 no artigo 95:

Considera-se desenho industrial a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial.

 Os desenhos industriais se aplicam a uma grande variedade de produtos industrializados e muitos outros implementos industriais, porém o resultado da pesquisa na base de dados do INPI, conforme a Ilustração 9, evidencia a inexistência de proteção industrial do tipo “Desenho Industrial” para formas plásticas contendo “açaí” em seu título. Contudo, existem somente duas tentativas de proteção industrial do tipo Desenho Industrial que foram indeferidas pelo INPI, em que a primeira foi feita em 2000 e a segunda em 2016. Assim, conforme a pesquisa feita em 08/01/2021 não existe nenhum desenho industrial de “açaí” no Brasil.

Ilustração 9 – Consulta à base do INPI de desenhos industriais contendo “açaí”.

Fonte: INPI.

6. A POTENCIAL INDICAÇÃO GEOGRÁFICA DE “AÇAÍ” NO BRASIL

No Brasil as indicações geográficas podem ser do tipo Indicação de Procedência (IP) e do tipo Denominação de Origem (DO), sendo o primeiro representado pelo nome geográfico da cidade, do país, da região ou da localidade que é reconhecida como centro de produção, extração ou fabricação de determinado serviço ou produto.  Enquanto o tipo DO é representado pelo nome geográfico da cidade, do país, da região ou da localidade que designa serviço ou produto com características ou qualidades essenciais ou exclusivas ao meio geográfico, incluídos fatores humanos e naturais.

A advogada Melissa Paz, em sua dissertação de mestrado de 2019, apontou o “Açaí das Ilhas de Belém” como uma potencial indicação geográfica, porém ainda não consta nenhum pedido junto ao INPI, objetivando o reconhecimento deste nome geográfico até o dia 08/01/2021, quando foi consultada a base de dados do INPI.

Ilustração 10 – Lembrança de Belém do Pará com bandeira de açaí.

Fonte: Própria autora.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para o caso específico da cadeia do açaí, o conjunto confrontado de todos esses dados indicam o crescimento no número de marcas e sua intensificação entre o final da década de 1990 e início dos anos 2000, com expressivo crescimento no número de pedidos de registros de marcas a partir dos anos 2010, sugerindo assim cada vez mais um interesse pelo fruto em território nacional.

Essa intensificação na última década foi acompanhada também quando o foco de análise recaiu sobre os pedidos de registro de patentes, que conforme os dados apresentados têm se intensificado significativamente a partir de 2008.

A configuração desse fluxo de transações para registro de produtos e serviços também oferece uma perspectiva interessante para reflexão. Se no contexto mundial os requerentes mais significativos, interessados no produto, estão em campos de ação ligados a setores do mercado de cosméticos e fármacos, observa-se que no Brasil a utilização mais comum tem sido para uso alimentar.

A Amazônia sempre se configura como um território de disputas no quadro geral da história brasileira. Essas disputas podem ser vislumbradas desde muitas perspectivas, que dizem respeito desde as dinâmicas históricas de conformação territorial até as questões mais sensíveis relativas ao equilíbrio entre práticas de uso da terra, economia e política.

Nosso intuito, ao longo desse artigo, foi traçar, através de pesquisas nas bases de propriedade industrial do INPI e The Lens, um olhar histórico para o desenvolvimento da cadeia produtiva do açaí. E, em que medida é possível construir arenas de promoção de desenvolvimento econômico e social frente às potencialidades e fragilidades da região na constituição da economia nacional.

Ao analisarmos a balança comercial do estado do Pará, fica notório o papel que a produção de commodities tem para a economia do estado, fundamentalmente no setor agrícola. Esse setor perde apenas para a exploração mineral, conforme dados do IBGE.

Ainda há um impasse no interesse nacional e internacional pelo uso e pelo registro de patentes com o fruto. Se no Brasil a maior parte do uso é para fins alimentícios, no exterior esse uso é mais diversificado contemplando setores sofisticados como a indústria de cosméticos e de fármacos. Além disso, é notório o interesse internacional demonstrado pelo número de pedidos de patente registrados em territórios como os Estados Unidos, que detém mais da metade das patentes para o intervalo investigado.

Nesses termos, podemos concluir que a riqueza patrimonial embutida no território amazônico é um espaço produtivo e criativo para intervenções. Essas intervenções devem estar pautadas em uma relação de responsabilidade e compromisso com a preservação ambiental, o desenvolvimento social e a distribuição justa das riquezas. A tecnologia pode ser uma via importante para esse processo de reorganização de mercado e seu fortalecimento frente aos setores competitivos, devendo assim ser respeitados as particularidades do espaço social, a distributividade territorial, a extensão compatível da rede de interlocução e a deferência a relações marcadas pela transparência e processo formativo constante, de modo que as políticas de propriedade intelectual possam atuar como um real vetor de desenvolvimento.

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, N. L.; GUERRA, B. M. Dicionário de propriedade intelectual. Curitiba: Juruá, 2010. ISBN 978-85-362-2784-9.

BENTES, E. dos S. et. al. Exportações de Polpa de Açaí do Estado do Pará: Situação Atual e Perspectivas. In: Anais Congresso da Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural, 55, Santa Maria, RS, 2017.

BRASIL. LEI Nº 9.279. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9279.htm>. Acesso em: 24/12/2018.

FRANÇA, R. O. Patente como fonte de informação tecnológica. Revista Perspectivas em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v. 2, n. 2, p. 235 – 264, jul./dez 1997. ISSN 1981-5344. Disponível em: <portaldeperiodicos.eci.ufmg.br/index.php/pci/article/viewFile/636/425>. Acesso em: 24/12/2018.

HOMMA, A. K. O. et. al. Açaí: Novos desafios e tendências. Amazônia Ciência & Desenvolvimento, Belém, v. 1, n. 2, p. 7 – 23, jan./jun. 2006. ISSN 1809-4058. Disponível em: <http://www.bancoamazonia.com.br/images/arquivos/institucional/biblioteca/revista_amazonia/edicao02/CD_V_II_Acai_Novos_Desafios_Al.pdf>. Acesso em: 24/12/2018.

INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL – INPI. Base de Marcas. Disponível em < https://www.gov.br/inpi/pt-br/servicos/marcas>. Acesso em 08-jan-2021.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. Produção da Extração Vegetal e da Silvicultura. Disponível em: < https://sidra.ibge.gov.br/tabela/289 >. Acesso em 08-jan-2021.

MELO, S. de S. C. de et. al. Paradigma tecnológico na agricultura: O caso da cultivar de açaí BRS-Pará. In: 1º Simpósio SOBER Norte. Belém: Sober, 2017. p. 1 – 4. Disponível em: <http://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/162940/1/SoberNorte-2017-4.pdf>. Acesso em: 24/12/2018.

NOGUEIRA, A. K. M. et. al. A dinâmica do mercado de açaí fruto no Estado do Pará: De 1994 a 2009. Rev. Ceres,  Viçosa ,  v. 60, n. 3, p. 324-331,  Junho  2013 .   Disponível em <https://doi.org/10.1590/S0034-737X2013000300004>. Accesso em: 08- Jan-2021.

OLIVEIRA, M. do S. P. de; FARIAS NETO, J. T. de. Cultivar BRS-Pará: açaizeiro para produção de frutos em terra firme. Comunicado Técnico 114. Embrapa Amazônia Oriental, 2005.

OLIVEIRA, M. do S. P. de et. al. Cultivo de açaizeiro para produção de frutos. Circular Técnica, n.26.  Belém: Embrapa, 2002.

PAZ, M. M. K. Indicação Geográfica e Etnodesenvolvimento: um meio para a valorização do açaí das Ilhas de Belém.  Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Direito do Centro Universitário do Estado do Pará – CESUPA, 2019.

SEBRAE. O registro da marca nos pequenos negócios: pesquisa quantitativa. 2018. Disponível em: < https://datasebrae.com.br/wp-content/uploads/2019/02/Registro-da-marca-nos-PN.pptx>. Acesso em: 08/02/2019.

THE LENS. Online patent search. Disponível em: <lens.org>. Acesso em: 08-jan-2021.

[1] Mestre em Propriedade Intelectual e Inovação pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e mestre em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação (PROFNIT/IFPA), Bacharel em Direito.

[2] Especialista em Direito, bacharel em Direito.

[3] Especialista em História, Bacharel em História.

Enviado: Janeiro, 2021.

Aprovado: Janeiro, 2021.

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Sheila De Souza Corrêa de Melo

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