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O papel da governança corporativa na escolha da arbitragem como mecanismo de resolução de disputas

RC: 146127
384
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/escolha-da-arbitragem

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

ROCHA FILHO, João Cesar de Oliveira [1]

ROCHA FILHO, João Cesar de Oliveira. O papel da governança corporativa na escolha da arbitragem como mecanismo de resolução de disputas.  Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 06, Vol. 05, pp. 05-16. Junho de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso:https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/escolha-da-arbitragem, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/escolha-da-arbitragem

RESUMO

O conflito de interesses é um fenômeno inato ao ser humano, sendo que, invariavelmente, dentro das relações particulares, públicas, societárias e empresariais, haverá disputas pelo mesmo objeto ou pretensões resistidas pelos mais variados motivos. A sociedade hipercomplexa em que estamos inseridos trouxe consigo alterações no comportamento humano, onde os objetivos, sucesso e resultados de cada indivíduo estão sendo buscados de uma maneira cada vez mais imediata. Os reflexos desses valores deságuam diretamente nas empresas, pois além de serem responsáveis pela produção de serviços e produtos que serão consumidos por aqueles que buscam a plena satisfação, também pretende que a lucratividade da sua organização supere as metas ano após ano. As exigências do mercado fizeram com que as relações empresariais se tornassem multidisciplinares, exigindo dos sócios, conselheiros, administradores e diretores o conhecimento e a cautela para a atuação em áreas antes nunca exploradas de maneira profissional, bem como os cuidados na tomada de decisões e suas repercussões sociais, onde a consulta ao corpo jurídico, contábil, tecnológico, administrativo e comercial são cada vez mais recorrentes. A questão problemática é definir os contornos e elementos que devem preceder a tomada de decisão da empresa para eleger um método adequado para a resolução de seus conflitos. O objetivo geral deste estudo é analisar os valores e características que um conflito possui para que possa ser levado à arbitragem, sem que com isso surjam novos problemas, socorrendo-se da boa governança corporativa e dos valores ESG. Utilizando o método dedutivo e com a análise da doutrina especializada no tema, chega-se à conclusão de que quando as partes em conflito não conseguirem por si próprias pôr fim à controvérsia por meio de uma eventual negociação e nem mesmo pela via da conciliação ou mediação, é neste momento que a arbitragem ganha espaço, vez que o Poder Judiciário não se mostra apto a resolver questões complexas com eficiência, sigilo e num prazo razoável exigido pelas sociedades empresárias em razão do mercado cada vez mais competitivo. Diante o presente trabalho visa estudar as vantagens da arbitragem e o papel da governança corporativa na participação de tomada dessa decisão.

Palavras-chave: Governança Corporativa, ESG, Solução extrajudicial de conflitos, Arbitragem.

1. INTRODUÇÃO

Empreender atualmente no Brasil não é uma tarefa simplória, pois o pretenso empreendedor se depara com uma infinidade de obstáculos, demandando um altíssimo grau de estudo e planejamento antes de se lançar mão em alguma atividade econômica. Conhecer o ambiente de negócios, nossa cultura, as imprevisibilidades inerentes às atividades desenvolvidas, a regulação e as incertezas naturais do nosso País são providências fundamentais na busca pelo sucesso (CAMARGO, 2018).

O instituto da governança corporativa é o caminho pelo qual os empreendedores podem buscar uma boa gestão empresarial reduzindo seus riscos, desenvolvendo suas atividades de maneira sustentável e obtendo lucro a partir dela. Mas ainda existem outros valores que acompanham a governança corporativa, que embora possuam um significado extremamente abrangente, podem ser sintetizados nas siglas ESG (Environmental, Social, and Governance).

Os temas ambientais (E – environmental), sociais (S – Social) e de governança (G – Governance) formam os valores basilares em uma nova visão organizacional global, para uma perspectiva de criação de valor a longo prazo, agradando investidores e todos aqueles que de alguma forma possuem relação com a organização. Embora não sejam temas novos, o fato é que esses temas eram tratados pelas empresas de forma separada e individual, sendo que essa nova vertente propõe uma análise e aplicação de modo conjunto, balanceando e cultivando valores (NASCIMENTO, 2021).

É por isso que dentro das mais variadas formas de sociedade, a governança corporativa se refere a tomar decisões, controlar a sua implementação e distribuir os resultados de maneira justa (prevenindo ou inibindo disparidade) para as diferentes partes envolvidas, criando valores à corporação a longo prazo, preservando o equilíbrio entre os interesses dessas mesmas partes (GUERRA, 2021).

A governança corporativa diz respeito a um conjunto de mecanismos, práticas, processos e normas de relacionamento alicerçados sobre princípios comuns, como por exemplo a transparência, prestação de contas, equidade e responsabilidade corporativa (SILVEIRA, 2020).

Também pode ser entendida como um sistema pelo qual as empresas se apresentam no mercado, deixando em evidência a sua forma de gerenciamento, o processo de tomada de decisões e o relacionamento entre proprietários, acionistas, investidores, conselheiros, empregados e clientes (NASCIMENTO, 2021).

Tomar boas práticas de governança corporativa não é sinônimo de blindagem a conflitos ou crises, pois havendo vícios na estrutura organizacional da empresa, onde não houve uma correta distribuição de tarefas, responsabilidades, limites e nem mesmo uma escolha sábia dos membros que a compõem, os problemas não demorarão a surgir.

Considerando a complexidade da sociedade em que vivemos e a multidisciplinariedade das relações que são diariamente contratadas, o Poder Judiciário acaba perdendo espaço para as soluções alternativas de resolução de conflitos, pois a sua estrutura e morosidade não é capaz de dar ao jurisdicionado uma resposta eficaz, de qualidade e em um razoável espaço de tempo como se exige o atual mercado financeiro e comercial.

O próprio código de melhores práticas de governança do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) prevê que o estatuto ou contrato social, quando possível, deve prever cláusula de arbitragem ou outras formas de resolução de conflitos quando a negociação direta se mostrar incapaz de solucionar a cizânia.

A arbitragem é uma das formas de heterocomposição de solução de controvérsias, onde partes capazes, de comum acordo, diante de um litígio ou por meio de uma convenção, estabelecem que um terceiro ou colegiado, solucione o conflito sem que exista intervenção do Estado, sendo que a decisão terá a mesma eficácia que uma sentença judicial transitado em julgado (CAHALI, 2020).

Mas a grande polêmica por trás dessa alternativa de solução de conflitos é que embora seja recomendada, será que a arbitragem é um meio adequado para todo e qualquer conflito empresarial? E qual é o papel da governança corporativa para se chegar a tal conclusão?

Diante da questão acima que norteia esse estudo, há que se observar que nem todo conflito pode ser arbitrável, mas somente aqueles que envolvam direitos patrimoniais disponíveis. E é exatamente aqui onde a maior parte das limitações surgem, necessitando da empresa uma estratégia e ponderação de valores para a tomada de decisões.

Dentro da estrutura organizacional da empresa e das suas relações comerciais e contratuais, há uma infinidade de situações que podem ser levadas à arbitragem, sendo que o grande papel da governança é analisar a natureza do conflito e diante dos princípios e valores da corporação, definir se a arbitragem é ou não o melhor caminho a ser tomado.

2. A GOVERNANÇA CORPORATIVA E OS VALORES ESG NO GERENCIAMENTO DE CONFLITOS

Todas as organizações possuem uma combinação específica de características de governança, algumas mais formais, dependentes da administração de certos cargos e buscando sempre o resultado econômico satisfatório independentemente dos meios utilizados, e outras, mais informais e com uma maior delegação de poderes e responsabilidades entre seus integrantes, buscando uma sustentabilidade entre pessoas, meio ambiente e lucro.

A boa relação entre as principais lideranças é vital para uma boa governança, pois engloba áreas como ética empresarial, gestão, liderança, psicologia social, induzindo executivos e colaboradores a procurar voluntariamente, cumprir regras, agir eticamente e tomar decisões no melhor interesse de longo prazo para a organização (SILVEIRA, 2021).

Porém, o simples fato de existirem sistemas de governança implantados em uma corporação não quer dizer por si só que ela estaria, automaticamente, livre de crises, conflitos, escândalos ou prejuízos. Apesar de continuamente em evolução, os instrumentos de governança não têm sido capazes de impedir os piores fracassos empresariais, sempre com sérios impactos sociais diretos e indiretos (GUERRA, 2021).

É por isso que há alguns anos se tem falado de uma nova vertente, o ESG (Environmental, Social, and Governance), que se solidificou com a pós-pandemia, visto que os valores devem se encontrar em uma posição superior à busca incessante pelo lucro a qualquer custo (NASCIMENTO, 2021).

O pensamento ESG na linha da governança, deve ser aquele que volta a atenção para a marca, a reputação, qualidade de governança, qualidade de gestão, histórico de respeito aos direitos trabalhistas e a consideração dos ecossistemas na comunidade onde a empresa opera, sendo indevida a separação entre pessoas, planeta e lucros (IBGC, 2007).

Os objetivos de uma boa governança são aprimorar continuamente o processo decisório visando o melhor interesse da organização; reduzir a probabilidade de surpresas negativas decorrentes de ações intencionais ou involuntárias de seus membros; proporcionar transparência aos públicos interno e externo, bem como assegurar a equidade de tratamento e o exercício efetivo dos direitos de todos os sócios (SILVEIRA, 2021).

E para assegurar toda essa gama de objetivos, cada conflito deverá ser tratado de uma maneira específica e adequada, evitando cartilhas pré-fabricadas utilizadas para todo e qualquer problema.

Como exemplo, a negociação diretamente entre as partes é uma das formas mais econômicas de se pôr fim a um eventual conflito, mas que depende essencialmente de uma boa comunicação entre os envolvidos. A negociação pode ser definida como uma arte de assegurar um acordo entre duas ou mais pessoas interdependentes entre si, que procuram maximizar seus resultados, compreendendo que ganharão mais se trabalharem juntas do que permanecerem litigando (GALDOS, 2000).

Essa forma de resolução de controvérsias pode ser utilizada nas mais variadas hipóteses, como conflitos pessoais, profissionais, políticos, jurídicos, familiares, empresariais, trabalhistas, comerciais etc. O objetivo primordial da negociação é a obtenção da mútua satisfação das partes envolvidas (SCAVONE JUNIOR, 2020).

Porém, na ausência de comunicação entre os contendores e em hipóteses que o grau de litigiosidade parece estar acima do normal, a negociação cede espaço às outras formas de resolução de conflitos, como a mediação, conciliação ou a arbitragem.

A mediação é indicada para situações em que existe um vínculo jurídico ou pessoal continuado entre os envolvidos no conflito, ensejando a necessidade de se averiguar os elementos pessoais e profissionais que levaram ao estado de divergências.

Uma vez identificadas essas divergências e lembrando que a mediação também pode ser utilizada antes da instauração de um conflito, o objetivo é prevenir ou corrigir os pontos sensíveis entre as partes, decorrentes da interação humana, onde o mediador irá dedicar mais tempo aos mediados, criando um ambiente propício à comunicação, abrandando emoções, mágoas, ressentimentos, para que eles próprios cheguem a uma composição (CAHALI, 2020).

A mediação empresarial e as reuniões privadas de cáucus (reuniões privadas com cada sócio) já se mostraram eficazes em empresas com administração familiar, onde o diálogo na família foi restaurado, o acordo fora cumprido espontaneamente sem a necessidade de homologação judicial, satisfazendo a todos após o conhecimento pelo mediador, das “dores” de cada um dos envolvidos no conflito (SARAIVA, 2020).

Em relação a conciliação, este método implica participar ativamente da comunicação (aproximando os indivíduos), colaborando para a identificação dos interesses e ajudar a pensar em soluções criativas e estimular as partes a serem flexíveis, podendo o conciliador apresentar (se necessário) sugestões para a finalização do conflito.

Estabelecida de forma adequada, e não imposta, a conciliação poderá alcançar o objetivo de pacificação com justiça; caso contrário, transações ilegítimas ou quando uma das partes não esteja satisfeita, podem ensejar mais conflitos entre os contendores e futuras lides (TARTUCE, 2021).

Embora a conciliação esteja intimamente ligada ao poder judiciário, tendo audiências designadas para essa finalidade, a utilização extrajudicial da conciliação por profissionais especializados e capacitados é cada vez mais frequente. O conciliador intervém com o objetivo de apresentar os benefícios daquele método, explicando os percalços de uma eventual demanda judicial, criando um ambiente propício para serem superadas as animosidades na busca por uma composição (CAHALI, 2020).

O estudo dos meios extrajudiciais de resolução de conflitos por parte das empresas passou a ser uma preocupação constante para a preservação de toda corporação e de seus interesses e objetivos, vez que a heterocomposição por meio do Poder Judiciário não consegue mais satisfazer as demandas do mercado.

Conforme o relatório do Conselho Nacional de Justiça, por meio da “Justiça em Números” aponta que a média de uma sentença no processo de conhecimento, avaliando os Tribunais da Justiça Comum, é de 01 ano e 07 meses, sem se considerar do tempo de julgamento nos tribunais superiores e na fase de execução até eventual satisfação (Conselho Nacional de Justiça, 2022).

Uma das preocupações da governança corporativa é com a eficiência, rapidez e satisfação na resolução dos conflitos empresariais internos e externos, sendo que o Poder Judiciário não se mostra mais como único meio viável e nem mesmo como um método efetivo.

E é nesse panorama que a arbitragem ganha espaço, pois quando as partes falham na resolução de suas diferenças e pretensões resistidas, um terceiro deve ser chamado para substituir os litigantes e pôr termo à disputa com uma duração razoável e com todas as garantias do devido processo legal, e claro, desde que o conflito seja arbitrável e seu custo se encaixe às características da lide.

3. A ARBITRAGEM E SUAS CARACTERÍSTICAS ORGÂNICAS

A arbitragem pode ser conceituada como um meio de solução de controvérsias através da intervenção de um árbitro escolhido pelas partes em razão de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo que a decisão tem a mesma eficácia que uma sentença judicial, colocada à disposição de pessoas capazes para a solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis (CARMONA, 2009).

A sua contratação se dá por meio de uma convenção de arbitragem, podendo ser conceituada como um negócio jurídico que prevê a arbitragem como mecanismo utilizado pelas partes para a solução de eventual litígio, ramificando-se em cláusula compromissória e compromisso arbitral.

A cláusula compromissória é um negócio jurídico bilateral firmado dentro de um contrato, anteriormente ao litígio, que tem por objetivo fixar a arbitragem como modalidade para a solução de eventual conflito. Já o compromisso arbitral, diferentemente da cláusula compromissória, é formalizado após o surgimento de determinada controvérsia, regulando o presente e com a finalidade de instituir um Tribunal Arbitral para resolução da disputa (FERREIRA, 2021).

Mas o ponto nevrálgico da arbitragem está na matéria que será levada para a arbitragem. Encontram-se previamente definidos no artigo 1º da Lei 9.307/1996, que a matéria objeto do conflito deve ser relativa a direitos patrimoniais disponíveis.

O próprio Código Civil, no seu artigo 852, dispõe que: “É vedado o compromisso para solução de questões de estado, de direito pessoal de família e de outras que não tenham caráter estritamente patrimonial”. Nesse passo, o legislador estabeleceu não apenas a necessidade de disponibilidade patrimonial, mas também, uma disponibilidade jurídica (FIGUEIRA JUNIOR, 2019).

Embora existam vários estudos sobre a possibilidade da arbitragem dentro do direito de família, do direito tributário, nas relações trabalhistas, de consumo e quanto ao direito ambiental, todo cuidado é pouco na contratação de eventual cláusula compromissória ou compromisso arbitral. Dentro desses temas, em razão da eventual vulnerabilidade, hipossuficiência ou interesse público das partes contratantes em determinadas relações contratuais, existe uma considerável probabilidade de o conflito ser rejeitado pelo árbitro indicado pelas partes ou até mesmo de eventual ação anulatória ser julgada procedente.

Cada disputa deve ter a sua arbitrabilidade verificada, ou seja, se a questão pode ser levada à arbitragem ou não. Para essa verificação há a necessidade de saber se os sujeitos envolvidos são capazes de contratar e se o objeto de divergência envolve direitos patrimoniais disponíveis, assim entendidos aqueles que abranjam bens contidos na esfera patrimonial das partes e que eles possam ser alienados ou transferidos para terceiros (GUERRERO, 2021).

E além da arbitrabilidade, vale ressaltar que embora a arbitragem seja considerada como jurisdição privada, ainda depende do Poder Judiciário caso a parte vencida não cumpra espontaneamente a decisão do árbitro, bem como nas hipóteses de medidas cautelares e de urgência em caso de descumprimento de formalidades do procedimento arbitral.

Desse modo, a empresa antes de eleger a arbitragem para a solução da sua controvérsia, deve estar atenta às desvantagens naturais dessa escolha, como por exemplo a demasiada confidencialidade que pode limitar o acesso de alguns sócios; uma vez iniciada a arbitragem não poderão em regra, buscar a tutela jurisdicional; em caso de não cumprimento espontâneo da sentença arbitral haverá a necessidade de ingresso no Poder Judiciário para dar início à execução forçada; e por fim, os custos elevados das câmaras arbitrais e a remuneração dos árbitros também devem ser levados em consideração (CAMARGO, 2018).

Mas as aparentes desvantagens não eliminam a arbitragem como uma opção aos conflitos empresariais, pois a sua confidencialidade pode ser necessária quando a lide envolve os faturamentos da empresa e valores contratuais; as partes podem eleger a forma de como será o processo e o procedimento arbitral, produção de provas entre outros deveres assegurando ao máximo o devido processo legal; o árbitro se dedica exclusivamente aquele conflito para o qual foi escolhido, sendo expert na matéria debatida, fato que justifica os custos e honorários elevados, sendo uma alternativa perfeita para contratos complexos e de grande monta.

E é a partir dessa complexidade de características que a governança corporativa deve ter o conhecimento e experiência necessários para levar suas disputas para a arbitragem ou mantê-la em alguma outra forma extrajudicial de solução de conflitos, sendo que a sua última via, caso todos os outros métodos fracassem ou a natureza do litígio não permita uma solução alternativa, se utilizar do Poder Judiciário.

4. CONCLUSÃO

A governança corporativa é um instituto cada vez mais presente nas empresas e quando bem estruturada é motivo de crescimento e agregação de valores para a corporação que a adota.

Os conflitos de interesses por serem da própria natureza do ser humano são inevitáveis, cabendo ao departamento de gestão de conflitos ou ao gestor capacitado, minimizá-los ou resolvê-los da maneira que melhor preserve os valores da entidade envolvida.

Diante da atual evolução legislativa, o arcabouço jurídico para todas as modalidades extrajudiciais de solução de conflitos é vasto, mas as atenções das partes devem estar voltadas para a efetividade de cada uma delas em comparação com a natureza do conflito.

Mas a iniciativa para a solução das crises deve observar não apenas o caminho mais curto e menos custoso, mas todos os valores do meio ambiente em que a atividade empresarial está inserida, seus reflexos sociais e a atuação da governança corporativa na preservação desses princípios.

As posturas mais rígidas de não negociação ou de ausência de conciliação nos campos judiciais ou extrajudiciais não têm mais espaço no mundo contemporâneo, pois quais valores a empresa estaria cultivando se com seus próprios funcionários e consumidores adota uma postura extremamente litigiosa, de não conciliação, fazendo prevalecer a “lei do mais forte”?

Nesse prisma, a arbitragem se mostra eficaz e indicada para conflitos onde as partes estejam em um patamar de igualdade econômica e jurídica, minimizando assim possíveis alegações e situações de vulnerabilidade ou hipossuficiência no momento da sua contratação.

Além da qualidade das partes, o objeto do litígio deve ser estudado com calma, verificando-se a patrimonialidade da disputa, evitando causas que envolvam direitos difusos ou coletivos que podem em tese infirmar a arbitragem por serem indisponíveis ou não essencialmente patrimoniais.

Embora seja claro que a negociação, conciliação e mediação sejam procedimentos menos traumáticos e menos custosos do que a imposição da decisão por um terceiro imparcial, quando a causa envolver matéria complexa, de alto valor econômico e que necessite de uma resolução em um curto espaço de tempo, a arbitragem parece ser a escolha ideal.

Mas isso não quer dizer que os outros meios de composição devam ser descartados, muito pelo contrário, devem ser incentivados a todo o momento, pois nem todas as discussões podem ser levadas à arbitragem.

O papel da governança corporativa deve ser o de enxergar além das linhas contratuais, prevendo possíveis focos de conflitos e estabelecendo qual será o melhor remédio diante da situação hipotética analisada. Em conjunto, sabendo-se que eventual disputa irá necessitar de uma atenção ímpar por parte de quem irá decidir a controvérsia e as partes ainda irão permanecer em contato por um longo período em razão da interdependência entre elas, o terreno estará favorável à arbitragem.

Já na hipótese de uma situação conflituosa instalada, o tempo, sigilo, especialidade do julgador e os custos são fatores primordiais para a análise do caminho até eventual convenção de arbitragem.

Diante das características da arbitragem e da profissionalidade e valores que integram e circulam em volta da governança corporativa, quando a comunicação entre as partes falhar, o tempo for escasso, o sigilo for indispensável e a matéria for complexa e envolve alto valor econômico, o Poder Judiciário deverá ser a última via a ser escolhida.

Todos os outros métodos de resolução extrajudiciais de conflitos podem ser tentados antes da arbitragem, principalmente a negociação, que poderá resolver a demanda em um curto espaço de tempo e com uma grande economia.

Mas para que isso ocorra, é atribuição da governança corporativa a elaboração e contratação de uma ótima convenção de arbitragem específica e direcionada para cada contrato, além de já ter esses valores negociais e conciliatórios implantados dentro da sua corporação com seus colaboradores.

Não há fórmula ou diretrizes pré-fabricadas para a contratação de toda e qualquer cláusula compromissória ou de compromisso arbitral, bem como, se a própria empresa não costuma resolver suas pendências internas por métodos adequados, não conseguirá solucionar seus conflitos externos com grande eficiência.

Assim, a atuação da governança corporativa na escolha da arbitragem deve ser de cautela e de visão aguçada, considerando os custos e limitações procedimentais, devendo ainda se atentar para a qualidade das partes que estão em jogo, a litigiosidade e o grau de comunicação entre elas e por último, qual a natureza do conflito em contenda, para que somente após, tomar a decisão na contratação de eventual convenção de arbitragem ou submeter a disputa ao Poder Judiciário.

REFERÊNCIAS

CAHALI, Francisco José. Curso de arbitragem: Mediação, conciliação, tribunal multiportas. 8.ed. São Paulo. Thomson Reuters Brasil. 2020.

CAMARGO, André Antunes Soares de. Aspectos jurídicos do ambiente empresarial brasileiro. São Paulo. Almedina. 2018.

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/96. 3. ed. São Paulo. Atlas. 2009.

Conselho Nacional de Justiça. Justiça em Números. edição 2022. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022-1.pdf>. Acesso em: 11. mai. 2023.

FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves; ROCHA, Matheus Lins; FERREIRA, Débora Cristina Fernandes Ananias Alves. Lei de arbitragem comentada artigo por artigo. 2.ed. São Paulo. Juspodivm. 2021.

FIGUEIRA JUNIOR, Joel Dias. Arbitragem. 3.ed. Rio de Janeiro. Forense. 2019. Kindle

GALDOS KAJATT, C. P. M. Negociación. Derecho & Sociedad, n. 14, p. 19-35, 2 maio 2000. Disponível em:< https://revistas.pucp.edu.pe/index.php/derechoysociedad/article/view/16622/16959>. Acesso em: 11.mai.2023.

GUERRA, Sandra. A caixa-preta da governança: Conselhos de administração por quem vive dentro deles. 4.ed. Rio de Janeiro. Best Business. 2021. Kindle

GUERRERO, Luis Fernando. Arbitragem e processo arbitral. In: SALLES, Carlos Alberto; LORENCINI, Marco Antônio Garcia Lopes; SILVA, Paulo Eduardo Alves da (Coords). Negociação, mediação, conciliação e arbitragem: curso de métodos adequados de solução de controvérsias. 4. Ed. Rio de Janeiro. Forense, 2021. Kindle

Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC. Guia de sustentabilidade para empresas. 2007. Disponível em:    <https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/22127/Caderno_4_Guia_Sustentabilidade_Empresas.pdf>. Acesso em. 11. maio. 2023.

NASCIMENTO, Juliana Oliveira. ESG vivo: A nova jornada da globalização pela transformação do capitalismo regenerativo e de stakeholder no mundo dos negócios. In: NASCIMENTO. Juliana Olvieira (coordenadora). O cisne verde e o capitalismo de stakeholder: a tríade regenerativa do futuro global. São Paulo. Thomson Reuters. 2021. Kindle

SARAIVA, Ivone Hiromi Takahashi. Mediação empresarial: a força das reuniões privadas de caucus. In: LAPORTA, Celeida Maria Celentano; BORGES, Sabrina Nagib de Sales (Coord). Mediação de conflitos na prática: estudos de casos concretos. 2.ed. Rio de Janeiro. Lumen Juris, 2020.

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Arbitragem: mediação, conciliação e negociação. Ed.10. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

SILVEIRA, Alexandre Di Miceli da, Governança corporativa no Brasil e no mundo: Teoria e Prática. 3.ed. Vinhedo. Virtuous Company, 2021. Kindle.

SILVEIRA, Alexandre Di Miceli da, Governança corporativa: O essencial para líderes. 2.ed. Vinhedo. Virtuous Company, 2020. Kindle.

TARTUCE, Fernanda. Conciliação em juízo: o que (não) é conciliar? In: SALLES, Carlos Alberto; LORENCINI, Marco Antônio Garcia Lopes; SILVA, Paulo Eduardo Alves da (Coords). Negociação, mediação, conciliação e arbitragem: curso de métodos adequados de solução de controvérsias. 4. Ed. Rio de Janeiro. Forense, 2021. Kindle. 

[1] Mestrando em soluções alternativas de controvérsias empresariais pela Escola Paulista de Direito – EPD. Graduado e Pós-Graduado em Direito Processual Civil e Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade de Direito de Itu – Estado de São Paulo. ORCID: 0000-0001-5978-8806. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/1549372764591171.

Enviado: 02 de junho, 2023. 

Aprovado: 27 de junho, 2023.

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João Cesar de Oliveira Rocha Filho

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