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Sistema de reuso de água cinza em plantações agrícolas: uma revisão da literatura

RC: 103070
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CONTEÚDO

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

BARRETO, Filipe Pinheiro [1], SILVA, Kaissa Azevedo [2], LIMA, Lívia Ramos [3]

BARRETO, Filipe Pinheiro. SILVA, Kaissa Azevedo. LIMA, Lívia Ramos. Sistema de reuso de água cinza em plantações agrícolas: uma revisão da literatura. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 06, Ed. 12, Vol. 04, pp. 59-74. Dezembro de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/plantacoes-agricolas

RESUMO

O Brasil é composto por regiões semiáridas que sofrem historicamente com a escassez hídrica em larga escala, necessitando assim da criação de alternativas capazes de potencializar a racionalização, bem como o uso sustentável de seu maior bem, a água. Uma metodologia que vem ganhando espaço neste contexto é o reuso da água, ou água cinza, que nada mais é do que o seu reaproveitamento em alguma atividade humana, visando suprir as necessidades em outros usos benéficos como, por exemplo, a agricultura. Diante deste contexto, o presente artigo, tem como principal questionamento: o emprego da água cinza em plantações agrícolas é capaz de controlar os impactos ambientais causados pelo uso indiscriminado da água? O objetivo do presente trabalho é realizar uma análise a respeito da importância do reuso de água cinza em plantações agrícolas no território nacional. Para tanto, realizou-se uma pesquisa do tipo exploratória e descritiva para o qual foi desenvolvida uma revisão bibliográfica. Depreendem-se por meio deste estudo que o reuso de água cinza em plantações agrícolas é importante, pois auxilia na diminuição da poluição ambiental, bem como visual, e garante a possibilidade de cultivo de alimentos em áreas com escassez hídrica, sem a necessidade de chuvas sazonais, além de atuar no controle dos impactos ambientais causados pelo uso indiscriminado da água nas plantações.

Palavras-chave: Água Cinza, Reutilização, Agricultura, Sustentabilidade, Meio Ambiente.  

1. INTRODUÇÃO

Não há vida sem água, mas mesmo sabendo que tal recurso está ficando cada dia mais escasso, os seres humanos ainda não foram capazes de entender que o seu uso consciente é uma necessidade imperativa, principalmente no que tange à agricultura, já que é este setor, segundo dados das Organizações das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura – FAO, o principal responsável não só pelo maior consumo de água no mundo, mas também pelo seu maior desperdício (SOUSA et al., 2005).

Segundo a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico – ANA, 70% de toda água disponível no mundo é empregada na irrigação, sendo que no Brasil, este índice chega a 72%. Além disso, pelas análises disponibilizadas pela Organização das Nações Unidas – ONU, entende-se que o uso da água tem se elevado a uma taxa duas vezes maior do que o crescimento da população ao longo do último século. Estima-se que até 2050 esta ascensão chegue a 50% nos países em desenvolvimento, enquanto nos países desenvolvidos, o aumento seja em torno de 18%, sendo que esta progressão será impulsionada principalmente pelo setor agrícola (MOTA, 2020).

Verifica-se que a adoção do processo de reutilização de água, desde que tratada corretamente, é uma opção a ser considerada para se tentar reduzir os impactos ambientais causados pelo desperdício e pelo seu uso indiscriminado. Tal artifício não é um conceito novo e tem sido perpetrado em todo o mundo há muitos anos. Existem relatos de sua prática na Grécia Antiga, com a disposição de esgotos e sua utilização na irrigação. No entanto, a demanda crescente por água tem feito do reuso planejado um tema atual e de grande importância (CETESB, 2010 apud CUNHA et al., 2011).

O reuso da água, ou água cinza, nada mais é do que o aproveitamento da água já utilizada em alguma atividade humana, visando suprir as necessidades de outros usos benéficos. Ela é proveniente de banhos, máquina de lavar roupa e lavatórios de banheiro, portanto, contém uma coloração turva. Também é possível verificar a presença de alimentos e altas concentrações de produtos de limpeza. É importante frisar que ela não entra em contato com águas negras, que são aquelas misturadas com fezes e urina (SOUSA et al., 2005).

As principais vantagens citadas pela literatura quanto ao reuso da água cinza são: economia na conta de água, conservação dos recursos hídricos, redução da poluição hídrica nos mananciais, alívio na demanda do tratamento de esgoto na rede, agricultura alimentar e geração de renda, produção de humos e minhocas, entre outros. Claro que, para ser aproveitada na agricultura, esta água deve passar por um processo de tratamento prévio, bem como devem ser seguidas as normas e critérios de regulamento do reuso da água na agricultura, conforme recomendações do CONAMA e da Organização Mundial da Saúde – OMS (SOUSA et al., 2005).

Diante deste contexto, o presente artigo, tem como principal questionamento: o emprego da água cinza em plantações agrícolas é capaz de controlar os impactos ambientais causados pelo uso indiscriminado da água?

Esta pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de analisar, através de uma revisão sistemática da literatura, a importância do reuso de água cinza em plantações agrícolas no território nacional. Como objetivos específicos, pretendem-se: apresentar os aspectos qualitativos e quantitativos da água cinza; descrever os principais sistemas de tratamento existentes até então; e, por fim, informar os benefícios apresentados quanto a sua adoção no âmbito agrícola.

A principal finalidade no desenvolvimento desta análise é a disseminação de informações a respeito, já que ainda é possível verificar a presença de poucas indagações, tanto na sociedade, quanto no âmbito acadêmico. Outro propósito é a valorização destes procedimentos frente aos profissionais da área, incentivando assim o treinamento dos envolvidos em toda sua conjuntura, causando assim uma diminuição dos impactos gerados no meio ambiente.

2. METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa do tipo exploratória e descritiva para o qual foi desenvolvida uma revisão bibliográfica.

Os materiais empregados foram obtidos de acordo com os seguintes critérios de inclusão: artigos indexados completos; nacionais; presentes nas bases de dados da LILACS, Scielo e Google acadêmico; e, por fim, publicados no período de 1997 a 2021. Como métodos de exclusão, utilizaram-se os seguintes fatores: artigos em língua estrangeira, artigos incompletos e que não estivessem inseridos na base de dados citados anteriormente.

É necessário informar que, para a seleção dos materiais, foram empregados os seguintes descritores: “Água Cinza”, “Reutilização”, “Agricultura”, “Meio Ambiente” e “Sustentabilidade”.  Foram obtidos 122 artigos, que, após a inserção dos critérios de inclusão e exclusão, chegou-se a 21 publicações.

Após a busca de todos os materiais, deu-se início a apreciação deles, visando responder os desígnios do estudo. Conforme Minayo (2008), todos os materiais foram lidos, elegidos, aparelhados e categorizados. A partir das análises de todos os seus conteúdos, realizou-se a interpretação, e, a partir de então a elaboração clara e concisa do texto final. Todo o processo ocorreu no mês de novembro do ano de 2021.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 REUSO DA ÁGUA

De acordo com Bazarella (2005 apud SELLA, 2011), a água é um recurso natural renovável devido ao ciclo hidrológico, todavia, possui volume finito. E, devido ao seu uso inadequado, podemos verificar que a sua escassez é um problema grave em diversos estados brasileiros, principalmente no Nordeste.

Para Fernandes et al. (2021), o reuso da água pode ser definido como o processo em que se reutiliza a água, que, após sofrer um processo de tratamento específico, pode ser empregada em diferentes propósitos, visando não só a preservação dos recursos hídricos existentes, mas também a sustentabilidade. É importante salientar que este reuso pode ser conduzido de quatro maneiras diferentes, ou seja, indireto não planejado; indireto planejado; direto planejado e reciclagem da água.

Segundo Costa e Barros Júnior (2005), o reuso indireto não planejado ocorre quando a água advinda do uso humano é descarregada no meio ambiente e reutilizada a jusante, de maneira não intencional e não controlada. Até chegar ao novo usuário, esta água passará por um processo de diluição e depuração. No reuso indireto planejado, os influentes, após serem tratados, serão lançados de forma planejada nos corpos d’água para serem empregadas a jusante, de modo altamente monitorada, permitindo assim o controle sobre as novas descargas, bem como a inexistência de alterações dos requisitos de qualidade de reuso objetivado.

O reuso direto planejado está relacionado com o despejo dos efluentes tratados diretamente no local de reuso, ou seja, não serão difundidos no meio ambiente. Este tipo de modalidade é empregado normalmente nas indústrias ou na irrigação. E, por fim, a reciclagem da água, que é aquele em que ocorre antes mesmo de haver a sua descarga em um sistema de tratamento ou em um local de disposição específico. Como exemplo para esta classificação, podemos citar os sistemas de ar-condicionado ou as fontes ornamentais (COSTA; BARROS JÚNIOR, 2005 apud BARBOSA, 2019).

Sella (2011) faz um comentário altamente significativo em suas publicações que deve ser levado em consideração, isto é, as possibilidades e formas potenciais de reuso dependem das características, condições e fatores locais como, por exemplo, os preceitos políticos, os planos institucionais, as disponibilidades técnicas e os fatores econômicos, sociais e culturais. Além disso, os custos no processo de implantação, de manutenção, de operação, as exigências de tratamento, a qualidade e os parâmetros de segurança estão intimamente interligados com o destino que se dará a água reutilizada, portanto, um planejamento prévio é de total importância neste contexto.

Cunha et al. (2011) informa que a prática do reuso possui a finalidade basilar de proteger a saúde pública, bem como promover a conservação do meio ambiente. As principais vantagens verificadas em sua adoção são: menor custo com tratamento de água; manutenção da oferta de água nos mananciais em quantidade suficiente capaz de atender uma grande parte da população; elevação do desenvolvimento social e econômico em regiões onde a escassez hídrica seja uma realidade; geração de empregos diretos e indiretos; menos captação de águas superficiais e subterrâneas e menor lançamento de efluentes no ambiente.

Os autores subscritos também citam algumas desvantagens, sendo as principais: risco elevado de infecções; possibilidade de haver a concentração de poluentes na água, prejudicando assim o tratamento posterior e a não aceitação da população quanto ao sistema em questão.

É importante salientar que o reuso da água vem sendo difundido de forma positiva no Brasil, principalmente devido aos instrumentos trazidos pela Política Nacional dos Recursos Hídricos, na qual foi implementada pela Lei n° 9.433 de 1997, contudo, verifica-se ainda a ausência de uma normalização específica para os sistemas de reuso. Assim sendo, diante deste fato, cabe aos interessados somente a adoção de padrões internacionais ou mesmo o seguimento de normas técnicas geradas por empreendimentos privados (SELLA, 2011).

Almeida (2011) acredita que a adoção de alternativas regionais é um artifício mais viável, principalmente devido à existência de proporções geográficas e de características específicas regionais, que é tão peculiar no Brasil. Claro que, nada será realmente possível caso não haja uma parceria segura entre o setor público e privado quanto às campanhas de saneamento, que buscam somente o beneficiamento da saúde pública e ambiental em larga escala.

3.2 REUSO DA ÁGUA CINZA

Para Sella (2011) “Água cinza para o reuso é o efluente doméstico que não possui contribuição da bacia sanitária e pia de cozinha, ou seja, os efluentes gerados pelo uso de banheiras, chuveiros, lavatórios e máquinas de lavar roupa”. Complementando esta citação, Bazzarella (2005) declara que, por apresentar baixo teor de matéria orgânica e microrganismos patogênicos, se comparados à água negra, que é um efluente proveniente do vaso sanitário, esta água pode ser reutilizada para fins não potáveis como, por exemplo, a irrigação, lavagem de carros, descarga sanitária, recarga de aquíferos, combate a incêndios, dentre outros.

Brasil (2005 apud SELLA, 2011) informa que alguns cuidados devem ser adotados quanto à reutilização de água cinza, sendo eles: o sistema hidráulico deve ser adequadamente identificado, além de possui independência quanto ao sistema de abastecimento de água potável; os locais de acesso devem ser restritos e identificados; os responsáveis pelo sistema de reutilização devem ser capacitados para tal e os reservatórios destinados ao armazenamento devem ser exclusivos para esta finalidade. Qualquer anormalidade no sistema pode gerar a presença de odor na água ou mesmo um vasto problema de saúde pública.

Segundo Gonçalves e Mendes (2020), algumas observações são imprescindíveis quanto ao uso deste tipo de água, isto é: ela não deve ser ingerida; não deve haver o contato direto com a pele; não utilizar para dar banho em animais domésticos; não regar plantas comestíveis, exceto em árvores frutíferas e não regar plantas caso haja a presença de resíduos de cloro ou alvejante na água. Contudo, caso a água seja corretamente esterilizada, e utilizada em bacias sanitárias, na qual não seja necessária a presença de água tratada para veicular fezes, seu uso será bem-sucedido.

Os componentes necessários para o aproveitamento destes efluentes são: Sistema de Coletores, composto por condutores, tanto verticais como horizontais, que irão possibilitar o transporte da água do seu local de origem até o sistema de armazenamento; Sistema de Armazenamento, que porta um ou mais reservatórios, na qual serão responsáveis pelo armazenamento do conteúdo proveniente dos coletores e pelo Sistema de Tratamento, que dependerá da quantidade de água exigida para as necessidades do seu destino (MAY; HESPANHOL, 2006 apud FERNANDES, 2017).

O tratamento do efluente possui o desígnio de remover os resíduos sólidos, reduzir a demanda bioquímica de oxigênio, eliminar os microrganismos patogênicos e, por fim, reduzir as substâncias químicas consideradas indesejadas. Fernandes (2017) informa que a Norma 13.969, de 1997, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) fornece instruções claras a respeito do esgoto de origem doméstica para fins não potáveis, além de classificar, segundo a qualidade da água de reuso, as modalidades com seus respectivos valores de parâmetro para o esgoto, determinando ainda como Classe 4 a água de reuso para irrigação de campo agrícola e pastagens.

3.3 ASPECTOS QUALITATIVOS DA ÁGUA CINZA

Segundo Alves et al., (2009), a avaliação da qualidade da água cinza é essencial para o seu reuso. Além disso, deve-se levar em consideração que a composição deste material varia de acordo com a fonte escolhida e a forma com que foi empregada, ou seja, ela sofre influência direta das caraterísticas regionais e da cultura local como, por exemplo, a localidade da residência, faixa etária dos usuários, estilo de vida deles, classe social, uso de produtos de higiene, medicamentos, cosméticos, dentre outros.

Pena (2021) relata que as principais características esperadas para que a água cinza seja reutilizada em bacias sanitárias são: condições organolépticas adequadas; sem abrasão; não gerar manchas às superfícies em contato; não pode favorecer o surgimento de contaminações; ser segura em termos sanitários; não provocar incrustações nos objetos; não gerar espuma durante a descarga e, por fim, não permitir o surgimento de biofilme em menos de 48 horas na louça sanitária.

Para Bazzarella (2005), a turbidez, a cor, a temperatura e a concentração de sólidos dissolvidos são os itens de maior importância quanto às características físicas da água cinza. Já as composições químicas se subdividem de acordo com o composto presente, sendo eles: compostos orgânicos (avaliação dos valores de DBO e de DQO); compostos nitrogenados (presença de urina na água); compostos fosforados (uso de detergente na limpeza diária); compostos de enxofre (presença de gás sulfídrico, que gera odor fétido) e demais componentes (pH, alcalinidade, dureza, turbidez, concentração de sólidos dissolvidos, óleos e gordura).

Alves et al. (2009) descreve em suas análises que as características microbiológicas devem ser avaliadas com mais atenção, pois as águas cinzas possuem uma quantidade de organismos patogênicos, que podem ocasionar problemas graves de saúde, dentre eles, as bactérias, os vírus e os parasitas, claro que em concentrações menos elevadas do que aquelas presentes nos esgotos. Para haver o controle destes organismos é imperativa a concretização dos processos de desinfecção e de armazenamento por profissionais capacitados para tal.

3.4 ASPECTOS QUANTITATIVOS DA ÁGUA CINZA

De acordo com Santos (2002 apud SELLA, 2011), “[…] as quantidades demandadas e produzidas estão relacionadas com o consumo de água que ocorre na residência”. Em outras palavras, a quantidade de água cinza produzida varia de acordo com a quantidade de água que é utilizada em uma residência, que se altera de acordo com a região, com os hábitos e com o clima do local a ser avaliado.

O volume de água varia de acordo o ambiente, mas estima-se que cada habitante gasta em torno de 200 litros durante os seus afazeres diários como, por exemplo, o uso do chuveiro, tanque, máquina de lavar roupa, descarga no vaso sanitário, pia de cozinha e lavatório. Em relação ao consumo de água nas áreas externas, como pisos e jardins, acredita-se que seja consumido em torno de 3L/m²/dia nos jardins, e na higienização dos pisos, por volta de 4L/m²/dia. É importante salientar que nestas áreas externas o consumo não é diário, isto é, acredita-se que a limpeza seja feita uma vez por semana (BAZZARELLA, 2005; SELLA, 2011).

3.5 PRINCIPAIS SISTEMAS DE TRATAMENTO DA ÁGUA CINZA

Almeida (2011) avisa que o tratamento deste tipo de água é primordial para a sua reutilização, visando o atendimento das expectativas do usuário, bem como o não comprometimento da saúde destes. Assim, Sella (2011) cita algumas etapas destinadas ao tratamento da água cinza para serem reaproveitadas em vasos sanitários, sendo:

  • Primeira etapa: Sistema físico-químico (coagulação, floculação e a decantação) e o sistema aeróbico de tratamento biológico de lodos ativados.
  • Segunda etapa: Sistema físico (sedimentação e a filtração simples, por meio do emprego de um decantador e de um filtro de areia).
  • Terceira etapa: Processo de desinfecção.
  • Quarta etapa: Quando necessário, a correção do pH.

Segundo Andrade Neto et al. (1999 apud SELLA, 2011), o emprego de um tanque asséptico é primordial, já que ele não necessita de técnicas construtivas e nem de equipamento mais aprimorado. Além disso, não há a precisão de intervenções constantes. De uma forma mais precisa, o seu uso destina-se a realização do processo de decantação, sedimentação e flotação dos sólidos advindos do esgoto. Também é possível a efetivação da desagregação e da digestão de sólidos sedimentados e dos materiais flutuantes. A norma técnica capaz de orientar o seu manuseio é a NBR 7.229/92.

Os autores subscritos também mencionam o filtro anaeróbio, que nada mais é do que um reator biológico onde o esgoto será depurado por meio da empregabilidade de microrganismos anaeróbicos. A norma a ser seguida é a NBR 13.969/97. O filtro de areia também é admirável, já que é capaz de promover a filtração do esgoto através da camada de areia, havendo assim a depuração por meio físico, como também bioquímico. Aqui não há a necessidade de operação ou mesmo o manuseio complexo. A norma para este caso é a NBR 13.969/97.

O processo de desinfecção é imperativo nos casos em que os efluentes precisem ser lançados nos corpos receptores superficiais ou mesmo em galerias de águas pluviais. Para tal, indicam-se duas alternativas para a cloração, ou seja, o gotejamento de hipoclorito de sódio ou mesmo o emprego de pastilhas de hipoclorito de cálcio. O tempo de detenção hidráulica para contato gira em torno de 30 minutos, sendo que o esgoto clorado deve possuir uma concentração em torno de 0,5 mg/L de cloro residual livre. A norma a ser acompanhada é a NBR 13.969/97 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 1997; SELLA, 2011).

3.6 USO DA ÁGUA CINZA NO SISTEMA AGRÍCOLA

De acordo com Bertoncini (2008), “A área irrigada no Brasil está em torno de três milhões de hectares, que representa apenas 1,9% dos 155,0 milhões de hectares cultivados”. Para tanto, a região Sul possui 35% de área irrigada, o Sudeste 30%, o Nordeste 24% e a região Norte e Centro-oeste, juntas, possuem 11%. Diante disso, chega-se à conclusão que a agricultura sozinha consome em média 69% da água presente nos mananciais.

O autor supracitado ainda expõe que os desperdícios de água nas plantações estão diretamente relacionados com o uso de métodos inadequados de irrigação que favorecem perdas de até 60% da água por evaporação, todavia, os agricultores não eliminam este mecanismo, pois ele permite um aumento da produtividade e, como consequência, não haverá a necessidade de haver a expansão das fronteiras.

Costa e Barros Júnior (2005) informam em suas análises que o uso exacerbado de água na agricultura, associado a escassez de recursos hídricos torna a reutilização de águas cinzas como uma alternativa altamente viável. Complementando esta citação, Minowa et al. (2007) cientificam que “[…] a reutilização de águas residuais na agricultura tem aumentado em todo o mundo, principalmente nas regiões áridas e semiáridas”, portanto, este processo deve ser progressivamente valorizado, bem como adotado pelo Brasil devido aos benefícios ocasionados até então.

Oliveira et al. (2019) acreditam que a existência de nutrientes e de matéria orgânica na água cinza advinda de esgotos adequadamente administrados proporciona a redução ou mesmo a eliminação no uso de fertilizantes comerciais e de adubos sintéticos. Também é possível observar uma maior retenção de água pelo solo. Em outras palavras, os benefícios econômicos e ambientais são substanciais para o agricultor, que deve buscar primeiramente entender a importância deste procedimento antes da sua adoção.

De acordo com Bernardi (2003), as vantagens proporcionadas com a utilização desta metodologia são consideráveis, portanto, o sistema governamental deve ampliar o desenvolvimento de estudos na área, para que seja possível a sua adoção em larga escala na agricultura. Além dos benefícios citados no decorrer desta pesquisa, Pena (2021) ainda acredita que seja possível averiguar: sustentabilidade quanto ao uso da água; economia de água potável; redução progressiva da poluição nos corpos hídricos; redução do uso de fertilizantes e de compostos orgânicos; controle de desertificação e erosão por meio da fertirrigação de cinturões verdes, entre outros.

É importante informar que não é qualquer tipo de lavoura que a água cinza pode ser empregada indiscriminadamente. Segundo Pena (2021), a depender da qualidade da água, ela deve ser utilizada somente em culturas cujos produtos serão processados, não havendo assim o seu consumo direto, como, por exemplo, a cana de açúcar.

Complementando esta citação, Bertoncini (2008) declara que muito cuidado deve ser tomado no uso da água advinda dos esgotos domésticos, isso porque na sua composição pode haver metais pesados, que são capazes de proporcionar a contaminação das culturas irrigadas ou mesmo gerar doenças ao homem. O excesso de sais em efluentes sanitários também pode ser altamente prejudicial, já que se houver uma elevação dos índices de salinidade no solo, as plantas não serão capazes de absorver a água, acarretando assim um déficit hídrico nas mesmas.

Para Sella (2011) “Microrganismos vivos originadas de esgotos sanitários também podem vir a ser um problema de saúde pública dependendo de como é utilizado na irrigação e em quais culturas”. Em outras palavras, o tratamento prévio da água em questão é o mais indicado.

Além disso, para Barros, Rocha e Silva (2010) o responsável pelo procedimento deve buscar caracterizar corretamente o efluente a ser empregado, qual o tipo de cultura será submetido este tipo de irrigação e quais as principais medidas de proteção direcionada aos trabalhadores serão seguidos, pois só assim será possível a eliminação de complicações nesta prática.

E, para que todo o processo seja realizado corretamente, o profissional deve estar preparado adequadamente, portanto, capacitações na área são primordiais, até porque, com a redução da disponibilidade hídrica se intensificando, esta prática será cada vez mais considerada pelos agricultores, gerando assim uma ampliação deste campo de atuação em larga escala (BARBOSA, 2019). Para Pena (2021), quanto mais preparado o indivíduo, melhor será o projeto, e, como consequência, maiores serão os benefícios para a agricultura e para o meio ambiente.

4. CONCLUSÃO

Ao se pesquisar acerca da empregabilidade de água cinza na agricultura, verificou-se que os benefícios obtidos são bem excitantes, sendo os mais significativos à diminuição da poluição ambiental, bem como visual, e a possibilidade em estar proporcionando o cultivo de alimentos em áreas com escassez hídrica, sem a necessidade de chuvas sazonais.

Retomando a questão norteadora: : o emprego da água cinza em plantações agrícolas é capaz de controlar os impactos ambientais causados pelo uso indiscriminado da água? Concluimos que o uso de água cinza pode realmente promover este tipo de benefício, todavia, deve-se levar em consideração que existem algumas áreas em que a adoção desta metodologia só irá amenizar o problema da falta d’água no semiárido, mas não eliminará definitivamente as dificuldades advindas da seca.

Claro que, para a obtenção de proveitos, será necessária a realização de estudos prévios, bem como a aquisição de amostras e análises periódicas. Os resultados adquiridos devem ser confrontados com a legislação vigente, para que seja definido o seu real destino, sendo os mais comuns à irrigação agrícola, a criação de peixes, limpezas residenciais e o descarte em mananciais.

Quanto ao uso no sistema agrícola, todos os autores elegidos tiveram o mesmo julgamento, ou seja, não são todas as plantações que lidam bem com esta metodologia, portanto, um profissional é imprescindível neste contexto para examinar de maneira técnica qual a melhor opção a ser empregada (água potável ou reutilização de água cinza) ou mesmo o tipo de tratamento mais apropriado a ser selecionado.

REFERÊNCIAS

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BARBOSA, Mônica Teles. Sistemas de reuso de águas cinzas domesticas para agricultura familiar: o caso de comunidades rurais do estado do Ceará. Dissertação (mestrado em Saúde Pública e Meio Ambiente) – Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/35101. Acesso em 12/10/2021.

BAZZARELLA, Bianca Barcelos. Caracterização e aproveitamento de água cinza para uso não potável em edificações. Dissertação (mestrado em Engenharia Ambiental) – Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2005. Disponível em: http://repositorio.ufes.br/handle/10/6149. Acesso em: 10/10/2021.

BERNARDI, Cristina Costa. Reuso de água para irrigação. Monografia (Pós-Graduação, em nível de Especialização Lato Sensu) – SEA-FGV/ ECOBUSINESS SCHOOL, Brasília, 2003. Disponível em: http://docplayer.com.br/660947-Reuso-de-agua-para-irrigacao-cristina-costa-bernardi.html. Acesso em: 12/10/2021.

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[1] Acadêmico do curso de Engenharia Civil da Faculdade Independente do Nordeste – FAINOR.

[2] Acadêmica do curso de Engenharia Civil da Faculdade Independente do Nordeste – FAINOR.

[3] Orientadora.

Enviado: Outubro, 2021.

Aprovado: Novembro, 2021.

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Filipe Pinheiro Barreto

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