REVISTACIENTIFICAMULTIDISCIPLINARNUCLEODOCONHECIMENTO

Revista Científica Multidisciplinar

Pesquisar nos:
Filter by Categorias
Administração
Administração Naval
Agronomia
Arquitetura
Arte
Biologia
Ciência da Computação
Ciência da Religião
Ciências Aeronáuticas
Ciências Sociais
Comunicação
Contabilidade
Educação
Educação Física
Engenharia Agrícola
Engenharia Ambiental
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia de Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Química
Ética
Filosofia
Física
Gastronomia
Geografia
História
Lei
Letras
Literatura
Marketing
Matemática
Meio Ambiente
Meteorologia
Nutrição
Odontologia
Pedagogia
Psicologia
Química
Saúde
Sem categoria
Sociologia
Tecnologia
Teologia
Turismo
Veterinária
Zootecnia
Pesquisar por:
Selecionar todos
Autores
Palavras-Chave
Comentários
Anexos / Arquivos

Ocupação urbana em áreas de preservação permanente do município de FORMIGA-MG

RC: 147985
528
5/5 - (6 votes)
DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/areas-de-preservacao-permanente

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

RIBEIRO, Kátia Daniela [1], BORGES, Carlos Henrique [2], SILVA, Alberto Marçal Lentz [3]

RIBEIRO, Kátia Daniela. BORGES, Carlos Henrique. SILVA, Alberto Marçal Lentz. Ocupação urbana em áreas de preservação permanente do município de FORMIGA-MG. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 08, Vol. 05, pp. 136-153. Agosto de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/areas-de-preservacao-permanente, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/areas-de-preservacao-permanente

RESUMO

A crescente urbanização das cidades brasileiras desencadeou vários problemas socioeconômicos e ambientais. A avaliação do uso e ocupação do solo (UOS) faz-se relevante no intuito de impedir que seu mau uso deteriore o ambiente. Esse trabalho objetivou caracterizar o UOS da zona urbana do município de Formiga-MG, identificando e analisando os impactos ambientais desencadeados pelo processo de urbanização de áreas de preservação permanente (APP’s). Foi realizado um levantamento dos padrões legais adotados pelo município quanto ao UOS; identificaram-se, analisaram-se e classificaram-se as APP’s, levando-se em consideração o UOS; e quantificaram-se, nas APP’s, as áreas que estão preservadas e as que estão ocupadas de forma irregular. Verificou-se a falta de preservação e o não cumprimento da legislação referente ao uso e ocupação de APP’s de corpos hídricos no município. Ressalta-se que os resultados obtidos servem de subsídio para estudos mais aprofundados que permitam o melhor entendimento do UOS pelos órgãos competentes, deixando-se clara a necessidade de se atentar para as legislações vigentes pertinentes ao assunto para se evitar impactos ambientais futuros.

Palavras-chave: Impactos ambientais, Urbanização, Uso e ocupação do solo.

1. INTRODUÇÃO

O processo de urbanização das cidades pressiona o meio físico urbano e desencadeia danos ambientais como a poluição do solo, a poluição hídrica, a poluição atmosférica, a ocorrência de deslizamentos e inundações, etc., caracterizando-se num cenário de agrupamentos com altos índices de ocupação informal, carente de infraestrutura e serviços (BRASIL, 2015; GENEVA ENVIRONMENT NETWORK, 2023).

O espaço geográfico pode ser utilizado como ferramenta para a gestão ambiental; para tanto, os gestores municipais precisam estar conscientes da necessidade de se investir na relação sociedade/espaço (SEBUSIANI; BETTINE, 2011). Isto porque um dos principais problemas desencadeados com a ocupação urbana são os impactos ambientais.

Estabelecer diretrizes de cunho normativo, baseados num planejamento ambiental que dê origem a um Plano Diretor de UOS que vise à qualidade de vida da população e do território (PACHECO, 2017), é fundamental para que o crescimento do território ocorra de forma ordenada, minimizando e contendo os impactos ambientais originados da urbanização (SOARES, 2012).

O processo de UOS revela a forma de intervenção num território (KRAESKI et al., 2023) e define a qualidade de vida da população nele instalada. A elaboração de uma lei de UOS com base no zoneamento do território permite definir as áreas propícias à instalação dos variados usos e atividades, priorizando-se a preocupação ambiental (METTERNICHT, 2017; CORRÊA, 2019).

A avaliação do UOS é importante para se evitar a deterioração do ambiente, uma vez que o mau UOS provocam intensos processos erosivos, enchentes, inundações, assoreamentos de lagos e rios, etc. (BATISTA; GOMES FILHO; SILVA, 2019).

O processo de UOS, ao longo da urbanização dos municípios, quase sempre foi desenvolvido de modo espontâneo, raramente fundamentado nas questões ambientais (LIMA; BARBOSA; REGALLO, 2016). Genericamente, as leis de UOS na zona urbana reduzem-se a zoneamentos urbanos delineados conforme intenções político-administrativas de ampliação territorial, ocasionando desordens em âmbito ambiental e permitindo que a ocupação urbana aconteça de modo desordenado (MARQUES; VICENTE; JUNIOR, 2016).

O município de Formiga-MG é uma região de crescente ocupação do meio natural, marcada pela intensa impermeabilização do solo, ocupação de várzeas e encostas, possuindo um sistema de drenagem e infraestrutura insuficientes, que não acompanharam a intensa urbanização. Em 2007, foi instituído o Plano Diretor de Desenvolvimento do Município de Formiga através da Lei Complementar nº 13/2007.

Porém, até 2007, a urbanização em Formiga-MG ocorreu sem nenhum embasamento normativo, podendo-se encontrar inadequações quanto ao UOS em áreas de preservação permanente (APP’s), levando a impactos ambientais significativos. Mesmo após o ano de 2007, a ocupação urbana ocorreu de forma inadequada, não planejada, o que fez com que o Plano Diretor fosse revisado no ano de 2017, através do Projeto de Lei Complementar nº 19/2017, ainda em tramitação na Câmara Municipal.

A análise do ambiente físico, do ambiente biótico, da ocupação humana e das inter-relações entre eles faz-se necessária para o planejamento, ordenação ou monitoramento do espaço. Essa análise, associada à avaliação dos impactos ambientais oriundos das ações de ocupação do território, estabelecem o conceito atual de desenvolvimento sustentável (SEBUSIANI; BETTINI, 2011). Como cada localidade tem suas peculiaridades, a elaboração das leis de UOS e a verificação de seu cumprimento devem ser feitas considerando-se todos os fatores e processos que interagem no espaço.

Avaliar o UOS do município, através de um estudo detalhado para demarcar e quantificar as áreas preservadas e/ou invadidas pela ocupação antrópica indevida, permite diagnosticar as deficiências no processo de urbanização de Formiga-MG e os impactos ambientais gerados, fornecendo subsídios para que os gestores municipais tomem as devidas providências preventivas e/ou corretivas para tais, evitando danos ambientais futuros.

Neste contexto, este trabalho objetivou caracterizar a ocupação urbana das APP’s do município de Formiga-MG a partir da demarcação das APP’s dos corpos hídricos da zona urbana do município, diferenciação das APP´s quanto à sua preservação e/ou intervenção antrópica irregular, bem como inferir sobre os danos ambientais causados e propor possíveis medidas mitigadoras.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Formiga-MG localiza-se na região Centro-Oeste do estado de Minas Gerais, sob as coordenadas geográficas Latitude: 20°27´42” Sul e Longitude: 45°25´58” Oeste. Possui altitude média de 832 metros, unidade territorial com 1.501,915 km² e perímetro aproximado de 233,37945 km. A cidade teve sua população estimada para o ano de 2021 (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE, 2023) em 67.956 habitantes e sua densidade demográfica é de 43,36 hab/km².

A zona urbana do município encontra-se praticamente toda localizada em área de uso irrestrito quanto à declividade do terreno. Encontra-se inteiramente inserida na microbacia do Rio Formiga, sendo cercada por outras microbacias de menor interferência. No município há predominância de Argissolo Vermelho-Amarelo, com uma porção de Latossolo Vermelho-Amarelo, que são solos antigos geologicamente (CÂMARA MUNICIPAL DE FORMIGA, 2007).

Geologicamente, a área de estudo encontra-se majoritariamente no complexo Barbacena, formado pelos minerais Granitos a Quartzo-Dioritos, “trata-se de um complexo cristalino constituído por rochas antigas, datadas do Arqueano que já sofreram metamorfismo regional, no que tange a orientação de micas, feldspatos e quartzo” (CÂMARA MUNICIPAL DE FORMIGA, 2007).

O estudo foi realizado no período de outubro de 2022 a março de 2023. Inicialmente, realizou-se uma pesquisa das legislações relacionadas ao UOS em âmbito municipal, estadual e nacional, sendo a mais atual a Lei n° 14.285/2021, que no seu artigo 4º, parágrafo III-A, diz que:

ao longo das águas correntes e dormentes, as áreas de faixas não edificáveis deverão respeitar a lei municipal ou distrital que aprovar o instrumento de planejamento territorial e que definir e regulamentar a largura das faixas marginais de cursos d’água naturais em área urbana consolidada, nos termos da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, com obrigatoriedade de reserva de uma faixa não edificável para cada trecho de margem, indicada em diagnóstico socioambiental elaborado pelo Município (BRASIL, 2021).

Formiga-MG ainda não conta com um plano diretor em vigência e seu código de obras não contempla este assunto. Então, fez-se uma consulta junto ao Conselho Municipal de Conservação e Defesa do Meio Ambiente (CODEMA) para saber, dentre as legislações pertinentes, quais eram usadas como referência para UOS, sendo informado que o referido órgão público baseia-se na Lei Federal nº 12.651/2012, relacionada à proteção da vegetação nativa, e na Lei Estadual nº 20.922/2013, que discorre a respeito das políticas florestal e de proteção à biodiversidade no Estado.

Segundo a Lei nº 12.651/2012, em seu artigo 3º, entende-se como zona urbana:

XXVI – área urbana consolidada: aquela que atende os seguintes critérios: (Redação dada pela Lei nº 14.285, de 2021)

a) estar incluída no perímetro urbano ou em zona urbana pelo plano diretor ou por lei municipal específica; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

b) dispor de sistema viário implantado; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

c) estar organizada em quadras e lotes predominantemente edificados; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

d) apresentar uso predominantemente urbano, caracterizado pela existência de edificações residenciais, comerciais, industriais, institucionais, mistas ou direcionadas à prestação de serviços; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

e) dispor de, no mínimo, 2 (dois) dos seguintes equipamentos de infraestrutura urbana implantados: (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

1. drenagem de águas pluviais; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

2. esgotamento sanitário; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

3. abastecimento de água potável; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública; e (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021)

5. limpeza urbana, coleta e manejo de resíduos sólidos; (Incluída pela Lei nº 14.285, de 2021) (BRASIL, 2012).

Quanto à delimitação de APP’s no entorno de cursos d’água, lagos e lagoas, a Lei nº 12.651/2012, diz que:

Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

I – as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

II – As áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de:

a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros;

b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas. (BRASIL, 2012).

São consideradas ocupações antrópicas irregulares em APP`s todas aquelas que não são permitidas pela Lei nº 12.651/2012, a saber:

VIII – utilidade pública: (Vide ADIN Nº 4.903)

a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;

b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento, energia, telecomunicações, radiodifusão,  bem como mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho; (Vide ADC Nº 42)(Vide ADIN Nº 4.903)

c) atividades e obras de defesa civil;

d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo;

e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;

IX – interesse social: (Vide ADIN Nº 4.903)

a) as atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas;

b) a exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal existente e não prejudique a função ambiental da área;

c) a implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais consolidadas, observadas as condições estabelecidas nesta Lei;

d) a regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009;

e) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes integrantes e essenciais da atividade;

f) as atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho, outorgadas pela autoridade competente;

g) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividade proposta, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;

X – atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental:

a) abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso d’água, ao acesso de pessoas e animais para a obtenção de água ou à retirada de produtos oriundos das atividades de manejo agroflorestal sustentável;

b) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber;

c) implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo;

d) construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro;

e) construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de comunidades quilombolas e outras populações extrativistas e tradicionais em áreas rurais, onde o abastecimento de água se dê pelo esforço próprio dos moradores;

f) construção e manutenção de cercas na propriedade;

g) pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros requisitos previstos na legislação aplicável;

h) coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de mudas, como sementes, castanhas e frutos, respeitada a legislação específica de acesso a recursos genéticos;

i) plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtos vegetais, desde que não implique supressão da vegetação existente nem prejudique a função ambiental da área;

j) exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e familiar, incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros, desde que não descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem prejudiquem a função ambiental da área;

k) outras ações ou atividades similares, reconhecidas como eventuais e de baixo impacto ambiental em ato do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA ou dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente. (BRASIL, 2012).

De posse dessas informações e utilizando o software Google Earth Pro®, realizou-se a delimitação do perímetro da zona urbana de Formiga-MG. Utilizando o mesmo software, foram feitos os contornos de todos os cursos d’água, lagos e lagoas contidos na área em questão.

Posteriormente, o arquivo gerado no Google Earth Pro® foi exportado para o AutoCad® para ser feita a delimitação das APP’s em torno de corpos hídricos, conforme preconiza a legislação adotada.

Com as APP’s delimitadas no AutoCad®, o arquivo foi exportado para o Google Earth Pro®, realizando-se a análise, demarcação e diferenciação de quais APP’s estavam preservadas e quais apresentavam algum tipo de ocupação urbana.

Com todo mapeamento pronto, a área da zona urbana foi fracionada a partir de seus cursos d’água e numeradas na ordem de confluência com o Rio Formiga (talvegue principal). Os lagos e lagoas também foram numerados do Norte para o Sul, sendo possível fazer a análise quantitativa do percentual das APP’s ocupadas de forma irregular.

Com base nos resultados obtidos, também foram feitas inferências sobre os impactos ambientais provocados pela urbanização do município e proposição de medidas mitigadoras.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Figura 1 e a Tabela 1 apresentam os resultados da análise de UOS realizada para as APP’s de Formiga-MG.

A zona urbana de Formiga-MG possui área total de 17.726.282,12 m²; destes, 1.379.767,61 m² são de APP’s de corpos hídricos, representando 7,78% de toda zona urbana.

As APP’s apresentam papel importante na conservação e manutenção dos cursos d’água, regulam a temperatura e o microclima da região, favorecem a infiltração da água no solo, auxiliam na recarga dos corpos hídricos e atuam na conservação da fauna e flora locais (SOL; PISSANTI, 2018).

Alguns cursos d’água da zona urbana estudada apresentaram um maior percentual de suas APP`s ocupada de forma irregular, com a existência de edificações e vias públicas nessas áreas. Observou-se que esses cursos d’água situam-se nas áreas centrais da zona urbana, consequentemente, com densidade demográfica maior, o que permite inferir que o processo de urbanização ocorreu a partir destes locais. Como não havia legislação vigente que contemplasse o UOS na época em que foram feitas estas edificações e vias, não ocorreu o controle e fiscalização do que estava inserido ou não nas APP’s.

Havendo uma ocupação antrópica consolidada, não há muito o que se fazer quanto a essas invasões, pois não se pode decidir pela imposição de demolição ou remoção destas intervenções antrópicas devido ao fato de que a lei não pode retroagir para prejudicar alguém. O que pode ser feito é a adoção de medidas compensatórias e uma fiscalização eficiente por parte da prefeitura e órgãos responsáveis.

Historicamente, as cidades brasileiras cresceram e se desenvolveram dando preferência à ocupação das áreas de topo de morro e das margens de rios e lagoas, no intuito de captar mais facilmente a água para usos diversos bem como destinar os efluentes domésticos (BRASIL, 2017).

Essa ocupação das APP’s já consolidada, e de forma irreversível, gera não só a deterioração dos corpos hídricos presentes nas zonas urbanas das cidades, como também contribui para o aumento da ocorrência de enchentes, desmoronamentos e elevados danos patrimoniais (PIVETTA, 2016), como foi verificado em Formiga-MG no dia 12 de fevereiro de 2023 (DESTAK NEWS BRASIL, 2023).

Os cursos d’água 3, 5, 7, 8 e 9 e as lagoas 1, 2 e 3 apresentaram as APP’s mais preservadas devido a estes corpos hídricos estarem localizados nas periferias da cidade, que ainda não sofreram tanto com a urbanização e, aliado a isso, deve-se citar que esse crescimento urbano, sendo mais recente, já conta com normas a serem seguidas.

Silva, Guimarães e Oliveira (2017) constataram que, na cidade de Porto Velho (RO), os bairros mais populosos são os que mais degradam as APP’s, reforçando a discussão anterior relacionada à uma menor urbanização da periferia da zona urbana com maior preservação das APP’s dos corpos hídricos.

Figura 1 – Mapa de uso e ocupação das APP’s da zona urbana de Formiga-MG

Fonte: Dados da pesquisa, 2023.

Tabela 1 – Caracterização das APP’s dos corpos hídricos de Formiga-MG

Corpo hídrico Área total de APP (m²) Área preservada Área irregular
(m²) % (m²) %
Curso D’Água 1 – Rio Formiga 483.776,18 223.696,84 46,22 260.179,34 53,78
Curso D’Água 2 – Córrego Arcos 62.246,04 24.107,82 38,73 38.138,22 61,27
Curso D’Água 3 30.765,56 15.524,78 50,46 15.240,78 49,54
Curso D’Água 4 – Córrego Do Cardoso 112.499,4 46.601,28 41,42 65.898,12 58,58
Curso D’Água 5 – Córrego Água Vermelha 184.723,20 93.790,01 50,80 90.833,22 49,20
Curso D’Água 6 – Rio Mata-Cavalo 110.960,10 40.856,40 36,82 70.103,70 63,18
Curso D’Água 7 139.571,10 94.866,97 67,97 44.704,15 30,03
Curso D’Água 8 – Córrego Do Quilombo 122.100,90 94.128,00 77,09 27.972,85 22,91
Curso D’Água 9 29.609,63 28.722,06 97,00 887,57 3,00
Lagoa 1 14.393,38 12.968,31 90,10 1.425,07 9,90
Lagoa 2 8.843,53 7.854,94 88,82 988,59 11,18
Lagoa 3 67,10 67,10 100
Lagoa 4 792,31 792,31 100,00
Lagoa 5 – Lagoas Do Fundão E Do Josino 79.519,18 33.344,74 41,93 46.174,44 58,07
GERAL 1.379.767,61 716.429,25 51,92 663.338,36 48,08

Fonte: Dados da pesquisa, 2023.

De um modo geral, constatou-se que 716.429,25 m² das APP’s da zona urbana encontram-se preservados (51,92%) e o restante, cerca de 663.338,36 m² (48,08%), apresentam algum tipo de ocupação antrópica irregular, evidenciando que, durante a urbanização do município, ocorreu a não observância das legislações relativas ao UOS, causando danos irreparáveis ao meio ambiente.

O principal impacto do uso e ocupação antrópicos irregulares das APP’s no município é a impermeabilização do solo, gerando problemas como: inundações das áreas próximas aos corpos hídricos, erosões devido aos grandes deflúvios pela falta de infiltração, perda de áreas de recarga das nascentes, aumento da temperatura ambiente local em consequência da pavimentação, falta de áreas verdes e supressão da flora ocasionando a diminuição do habitat e da fauna (YANG; ZHANG, 2011).

Quanto aos impactos gerados, não foram encontradas medidas mitigadoras para as edificações e vias públicas já estabelecidas, porém pode-se citar a educação ambiental como um artifício para evitar a poluição destes corpos hídricos. Para se evitar impactos ambientais futuros, as novas edificações devem seguir as legislações vigentes junto aos órgãos ambientais e conforme o “Código de Obras”, aliado a uma fiscalização eficiente pela Secretaria de Fiscalização e Regulação Urbana. Outra medida a ser tomada é a criação e implementação do Plano Diretor do Município de Formiga-MG.

Ressalta-se que as legislações relativas ao UOS não podem ser apenas formalidades, mas devem ser seguidas em totalidade para evitar problemas ambientais às populações em seu entorno e gerações futuras. Aliado a isso, deve-se fazer obrigatória a fiscalização rígida amparada pelas leis regentes.

4. CONCLUSÕES

Para as condições de realização deste estudo, os resultados permitiram concluir que:

  • A metodologia adotada para a delimitação da zona urbana e das APP’s mostrou-se eficiente, eficaz e rápida (se comparada aos métodos topográficos de levantamentos in loco) para a obtenção das informações e dimensões quantificadas;
  • Verificou-se a falta de preservação e o não cumprimento da legislação referente ao uso e ocupação de APP’s de corpos hídricos;
  • Há a necessidade de se elaborar e implantar leis e políticas voltadas à adequação do UOS no município bem como programas de educação ambiental e reforço nas fiscalizações, aliados a penalidades mais severas para casos em que haja o descumprimento das leis vigentes, garantindo assim a conservação dos fragmentos florestais ainda preservados.

REFERÊNCIAS

BATISTA, L. dos S.; GOMES FILHO, R. R.; SILVA, M. G. Ocupação atual da terra na bacia hidrográfica do rio Poxim no estado de Sergipe usando imagens do Google Earth. Revista Brasileira de Energias Renováveis, [S. l.], v. 8, n. 1, p. 01-11, 2019. Disponível em: <10.5380/rber.v8i1.47531>.

BRASIL.  Lei nº 11977, de 7 de julho de 2009. Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas […]; e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11977.htm>. Acesso em: 13 jun. 2023.

BRASIL.  Lei nº 12.727, de 17 de outubro de 2012. Altera a Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, que dispõe sobre a proteção da vegetação nativa […] e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12727.htm>. Acesso em: 13 jun. 2023.

BRASIL. Lei Federal nº 14.285, de 29 de Dezembro de 2021. Áreas de preservação permanente no entorno de cursos d’água em áreas urbanas consolidadas. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12651.htm. Acesso em: 12 dez. 2022.

BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Sustentabilidade urbana: impactos do desenvolvimento econômico e suas consequências sobre o processo de urbanização em países emergentes: textos para as discussões da Rio+20: volume 3 habitação social e sustentabilidade. Brasília: MMA, 2015. 270 p. Disponível em: <https://antigo.mdr.gov.br/images/stories/ArquivosSNH/ArquivosPDF/Publicacoes/capacitacao/publicacoes/habitacao_social.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2022.

BRASIL. Ministério Público Federal. Regularização fundiária urbana em áreas de preservação permanente. Brasília: MPF, 2017. 122 p. Disponível em: <https://urbanismo.mppr.mp.br/arquivos/File/REG_Manual_Regularizacao_MPF_APP.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2023.

BRASIL. Novo Código Florestal. Lei nº 12.651, de 25/05/12. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa; […] e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/L12651compilado.htm>. Acesso em: 12 dez. 2022.

CÂMARA MUNICIPAL DE FORMIGA. Lei Complementar Nº 13, de 10 de janeiro de 2007. Institui o Plano Diretor de Desenvolvimento do Município de Formiga e dá outras providências. Disponível em: <https://www.camaraformiga.mg.gov.br/wp-content/uploads/2017/10/PLANODIRETOR.doc>. Acesso em: 27 jul. 2022.

CÂMARA MUNICIPAL DE FORMIGA. Projeto de Lei Complementar Nº 19, de 19 de dezembro de 2017. Dispõe sobre a revisão do Plano Diretor do Município de Formiga – MG. Disponível em: <https://www.legislador.com.br//LegisladorWEB.ASP?WCI=ProjetoTexto&ID=325&inEspecie=2&nrProjeto=19&aaProjeto=2017>. Acesso em: 27 jul. 2022.

CORRÊA, P. Qual a importância da lei de uso e ocupação do solo no âmbito do licenciamento ambiental?. Sete Lagoas: CSC Geologia & Engenharia, 2019. Disponível em: <https://cscambiental.com.br/qual-a-importancia-da-lei-de-uso-e-ocupacao-do-solo-no-ambito-do-licenciamento-ambiental/>. Acesso em: 27 jul. 2022.

DESTAK NEWS BRASIL. Chuvas e inundações em Formiga (MG) causaram grandes perdas materiais neste domingo (12), felizmente não houve vítimas. Fevereiro de 2023. Disponível em: <https://destaknewsbrasil.com.br/index.php/2023/02/13/chuvas-e-inundacoes-em-formiga-mg-causaram-grandes-perdas-materiais-neste-domingo-12-felizmente-nao-houve-vitimas/>. Acesso em: 5 jul. 2023.

GENEVA ENVIRONMENT NETWORK. Cities and the Environment. 2023. Disponível em: <https://www.genevaenvironmentnetwork.org/resources/updates/cities-and-the-environment/>. Acesso em: 13 jun. 2023.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Panorama de localização do Município de Formiga no Estado de Minas Gerais. 2023. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/formiga/panorama>. Acesso em: 04 mai. 2023.

KRAESKI, A. et al. Identification of land use conflicts in permanent preservation area in a brazilian amazon sub-basin. Sociedade & Natureza, v. 35, p. e65724, 2023. Disponível em: https://doi.org/10.14393/sn-v35-2023-65724

LIMA, M.L.S.; BARBOSA, D.R.; REGALLO, F.L.S. Identificação do uso do solo como contribuição para o mapeamento de risco ambiental à erosão na bacia hidrográfica do rio Saí (Mangaratiba – RJ). 11o Sinageo: Anais, 2016. Disponível em: <http://www.sinageo.org.br/2016/trabalhos/6/6-570-268.html>. Acesso em: 30 maio 2023.

MARQUES, S. M.; VICENTE, G. Z.; JUNIOR, R. M. Estudo da Alteração no Uso e Ocupação do Solo da Sub-Bacia do Córrego do Luciano no Município de Jardinópolis-SP. Revista Científica ANAP Brasil, [S. l.], v. 9, n. 17, 2016. Disponível em: 10.17271/1984324091720161450.

METTERNICHT, G. Global Land Outlook Working Paper: land use planning. Sydney, Australia: United Nations Convention to Combat Desertification (UNCCD), September 2017. Disponível em: <https://knowledge.unccd.int/sites/default/files/2018-06/6.%20Land+Use+Planning+__G_Metternicht.pdf>. Acesso em: 13 jun. 2023.

MINAS GERAIS, Lei Estadual nº 20.922 de 16 de outubro de 2013. Dispõe sobre as políticas florestal e de proteção à biodiversidade no Estado. Disponível em: <http://www.siam.mg.gov.br/sla/download.pdf?idNorma=30375>. Acesso em: 21 dez. 2022.

PACHECO, P. Como o planejamento urbano influencia nosso dia a dia. São Paulo: WRI Brasil, 2017. Disponível em: <https://wribrasil.org.br/noticias/como-o-planejamento-urbano-influencia-nosso-dia-dia>. Acesso em: 27 jul. 2022.

PIVETTA, M. A more vulnerable Brazil in the 21st century. 2016. Disponível em: <https://revistapesquisa.fapesp.br/en/a-more-vulnerable-brazil-in-the-21st-century/>.

SEBUSIANI, H. R. V.; BETTINE, S. do C. Metodologia de análise do uso e ocupação do solo em micro bacia urbana. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, [S. l.], v. 7, n. 1, 2011. Disponível em: <10.54399/rbgdr.v7i1.366>.

SENADO FEDERAL. Acórdão da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN nº 4.903 de 28/02/2018. Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/norma/26365654>. Acesso em: 13 jun. 2023.

SILVA, H. R. O.; GUIMARÃES, S. C. P.; OLIVEIRA, L. B. O uso do geoprocessamento na espacialização e avaliação das Áreas de Preservação Permanente: Cidade de Porto Velho-RO. Confins, n. 30, 2017. Disponível em: <https://doi.org/10.4000/confins.11764>.

SOARES, F. B. Planejamento Ambiental da Bacia do Balneário da Amizade – São Paulo. Presidente Prudente: [s.n], 2012, 154 f. Trabalho de Conclusão (Bacharelado – Geografia) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia, 2012. Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/121342/soares_fb_tcc_prud.pdf?sequence=1>. Acesso em: 27 jul. 2022.

SOL, C. B. O.; PISSANTI, A. R. A Importância ambiental das áreas de preservação permanente (APPs) e sua fundamentação jurídica de acordo com o Código Florestal. TCC – Direito, v. 0, n. 0, 2018. Disponível em: <https://www.repositoriodigital.univag.com.br/index.php/rep/article/view/134>. Acesso em: 02 jun. 2023.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Ação Declaratória De Constitucionalidade – ADC nº 42. Disponível em: <https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=750504737>. Acesso em: 13 jun. 2023.

YANG, J.-L.; ZHANG, G.-L. Water infiltration in urban soils and its effects on the quantity and quality of runoff. Journal of Soils and Sediments, v. 11, n. 5, p. 751–761, 2011. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s11368-011-0356-1

[1] Orientadora. Doutorado em Engenharia Agrícola. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4111-447X. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6322015140185945.

[2] Graduando em Engenharia Civil pelo UNIFOR-MG. ORCID: https://orcid.org/0009-0002-4698-0481. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7590527731538437.

[3] Graduando em Engenharia Civil pelo UNIFOR-MG. ORCID: https://orcid.org/0009-0007-5809-3720. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5216492545791125.

Enviado: 6 de julho, 2023.

Aprovado: 04 de agosto, 2023.

5/5 - (6 votes)
Kátia Daniela Ribeiro

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar por categoria…
Este anúncio ajuda a manter a Educação gratuita