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A qualidade do sono e o processo de ensino-aprendizagem: um estudo de caso com estudantes baianos

RC: 141496
1.578
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/estudantes-baianos

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

QUINTINO, Edivan Santana [1], SOUZA, Diogo José Oliveira [2], SILVA, Américo Junior Nunes da [3]

QUINTINO, Edivan Santana. SOUZA, Diogo José Oliveira. SILVA, Américo Junior Nunes da. A qualidade do sono e o processo de ensino-aprendizagem: um estudo de caso com estudantes baianos. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 03, Vol. 01, pp. 87-99. Março de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/estudantes-baianos, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/estudantes-baianos

RESUMO 

O sono é uma condição fisiológica natural do organismo humano, e exerce funções como: restaurar o sistema neurológico, modular a cognição, consolidar a memória e a aprendizagem e contribuir psicologicamente para o bem-estar mental das pessoas. Diante disso, foi desenvolvida uma investigação durante o Estágio Curricular Supervisionado II, do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, com o objetivo de identificar as causas que comprometem a qualidade do sono de estudantes do Ensino Médio/Técnico e as suas principais consequências para o processo de ensino-aprendizagem. A pesquisa foi desenvolvida em duas turmas de 1° ano de um curso Técnico em Agropecuária de um Instituto Federal localizado na Região Norte do Estado da Bahia. Utilizou-se, para o movimento de produção de dados, um formulário do Google Docs, do qual participaram 40 alunos. Após análise, percebeu-se que as condições socioeconômicas e psicológicas dos estudantes, a infraestrutura da escola, o uso de tecnologias e o número de atividades solicitadas pelos docentes são as principais causas que interferem na qualidade do sono dos discentes. Desta forma, os adolescentes investigados possuem baixa duração do sono, o que remete à necessidade de intervenções.

Palavras-chave: Estágio curricular supervisionado, Pesquisa, sono, Adolescentes.

1. INTRODUÇÃO

O processo de ensino-aprendizagem é um complexo sistema de interações entre professores e alunos. Para construir essa afirmação, partiu-se do que revela Freire (1983, p. 68), que reconhece o ensino e a aprendizagem apresentam caráter dialético, isto é, estão em constante movimento e construção por aqueles que o fazem; o ensinar está diretamente relacionado ao aprender, e “o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa”. Ambos, assim, se tornam sujeitos importantes do processo.

Com base nessa relação apresentada, o ensino ganha grandes influências. Durante a prática do Estágio Curricular Supervisionado II, por exemplo, foram identificados comportamentos, nos estudantes, que dificultavam a interação e a atenção nas aulas. Pode-se dizer que essas interferências que afetavam o processo de ensino-aprendizagem podem ter sido geradas por causas sociais, culturais, ambientais, políticas e, também, comportamentais; e, assim, o estudante estagiário, durante o período de realização do estágio, pôde identificar e desenvolver habilidades acerca das dificuldades percebidas. O estágio, nesse sentido, assume um lugar importante de formação e constituição da identidade docente, como enfatizado por Pimenta (2013), é um momento que aproxima o futuro professor da realidade educacional.

Destarte, as observações realizadas durante o estágio permitem uma aproximação à realidade educacional e, pelo caráter de pesquisa articulado a esse momento de formação, o pensar em problemáticas que circunscrevem a regência e/ou situações que alterem ou possam afetar o processo de ensino-aprendizagem. Essa condição abre espaço para o estagiário, a partir da realização de pesquisa, se constituir enquanto pesquisador, contribuindo e fortalecendo sua formação e ampliando repertórios para solução de problemas advindos da prática docente (PIMENTA, 2013; SUZART; SILVA, 2020).

Partindo do apresentado, Pimenta e Lima (2018) afirmam que a pesquisa, no estágio, traduz-se, de um lado, na mobilização de pesquisas que permitam a ampliação e análise dos contextos nos quais os estágios se realizam; por outro lado, e em especial, exprime-se na possibilidade de os estagiários desenvolverem postura e habilidades de pesquisador a partir das situações de estágio, elaborando projetos que lhes permitam, ao mesmo tempo, compreender e problematizar as situações que observam, em um movimento indissociável e pendular entre teoria e prática (PIMENTA, 2013; SUZART; SILVA, 2020).

Sendo assim, com base nas observações realizadas durante o estágio supervisionado II do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade do Estado da Bahia, campus VII, em Senhor do Bonfim – BA, foi possível perceber que uma situação em particular influenciava o processo de ensino-aprendizagem: o sono. Nesse sentido, buscou-se desenvolver uma investigação levando em consideração a qualidade do sono dos estudantes, visto que estes possuíam o hábito de dormir durante as aulas. É importante considerar que a pesquisa foi desenvolvida nas turmas que realizaram o estágio, sendo duas turmas do curso Técnico em Agropecuária de um Instituto Federal (IF).

O hábito dos alunos dormirem durante as aulas compromete a sua aprendizagem, pois perdem a atenção na aula e a apresentação do conteúdo, impedindo que tenham interações com a turma ou indagações acerca do conteúdo apresentado pelo docente. Essa ação, como dito anteriormente, pode prejudicar os alunos no processo de ensino-aprendizagem, uma vez que a aprendizagem é uma atividade cognitiva que ocorre por meio da consolidação da memória, e o sono é fundamental para efetivar esse processo (VALLE; VALLE; VALLE, 2008). Desse modo, se a pessoa não dormir bem, terá sonolência diurna, além de dificuldade em se concentrar e prestar atenção às questões interpostas no dia a dia, principalmente durante as aulas.

Vale destacar que essa situação, o sono durante as aulas, carece de discussão, diante do quadro vivido por crianças, adolescentes e até mesmo adultos na sociedade contemporânea, tornando-se um grande problema para a educação. Segundo Neves et al. (2013, p. 58), o sono é um estado comportamental “[…] complexo no qual existe uma postura relaxada típica, a atividade motora e encontra -se reduzida ou ausente e há um elevado limiar para resposta a estímulos externos”. Além disso, o sono é considerado um fator fisiológico natural do organismo humano, e este estado comportamental exerce funções, como: restaurar o sistema neurológico, modular a cognição, consolidar a memória e a aprendizagem e contribuir psicologicamente para o bem-estar mental das pessoas.

O público investigado é formado por adolescentes que, segundo Domingues e Alvarenga (1997), inserem-se em uma fase que os preparam para o início da vida adulta. Todavia, não existe precisão sobre seu início e término, estando entre a infância e a vida adulta, como um período intermediário, vivenciado sob vasta contradição e ambiguidade. Sendo assim, notam-se padrões distintos de comportamento nos adolescentes, principalmente no hábito de dormir. Por exemplo: a preferência por dormir e acordar mais tarde, na adolescência, deve-se a fatores tanto de origem biológica como sócio-comportamentais (MOORE; MELTZER, 2008).

Acredita-se, também, que as mudanças que acontecem nos padrões de sono, na adolescência, estão associadas ao aumento das obrigações escolares e atividades sociais, além de atividades como televisão e internet, que podem colaborar para que os adolescentes durmam mais tarde e fiquem mais sonolentos (CARSKADON et al., 2002).

Ainda assim, Pereira (2011) afirma que variáveis como as características do deslocamento até a escola, os hábitos alimentares no café da manhã, o histórico dos jovens em relação aos seus horários escolares nos anos anteriores, o ambiente onde o jovem dorme, a localização da escola (urbana/rural), transtornos psíquicos, tabagismo, etilismo, a inserção no mundo do trabalho, dentre outras, são questões que também afetam a qualidade do sono dos adolescentes e  acabam contribuindo para a sonolência durante as aulas (PEREIRA, 2011).

Com isso, a partir das consequências em torno das alterações comportamentais dos estudantes durante as aulas no período do Estágio Curricular Supervisionado e o hábito de dormir nas aulas, realizou-se uma investigação com o objetivo de identificar as causas que comprometem a qualidade do sono de estudantes e as principais consequências para o processo de ensino-aprendizagem. Participaram deste estudo duas turmas de 1° ano do curso Técnico em Agropecuária de um IF. É importante considerar que a instituição de ensino retomou as suas atividades presenciais recentemente, devido à pandemia de covid-19, o que levou os alunos a uma readaptação. Além disso, os estudantes investigados ingressaram na instituição em 2022.

2. METODOLOGIA

Esta pesquisa é do tipo qualitativa, e não possui nenhum fomento. Para a realização desta investigação, foi desenvolvido um formulário online no Google Docs, que, posteriormente, foi compartilhado com os estudantes através da plataforma digital de comunicação WhatsApp, a fim de coletar os dados. Vale destacar que as questões éticas para a realização desta investigação foram seguidas e que os colaboradores aceitaram participar do estudo.

O estudo foi desenvolvido em duas turmas de 1° ano do curso Técnico em Agropecuária de um IF, considerando o problema identificado. A escolha das turmas se deu por serem as turmas que estavam realizando o Estágio Curricular Supervisionado II. Vale destacar que as turmas apresentam características distintas, principalmente quanto à idade e local de residência dos estudantes. Trata-se de turmas matutinas, de tempo integral, que iniciam as atividades às 7h30min.

Para a produção de dados da pesquisa, utilizou-se um formulário do Google Docs, com um total de 44 perguntas. Os questionamentos inquiriam sobre: sexo, idade, hábitos de sono, aspectos sociais, culturais, comportamentais, psicológicos e alimentares dos estudantes. A coleta de dados teve duração de duas semanas, tendo início no dia 16 de novembro de 2022 e término em 01 de dezembro de 2022. Houve a participação de 40 alunos, sendo 19 alunos da turma A e 21 alunos da B.

A análise dos dados foi feita a partir de uma perspectiva qualitativa, como orienta Gil (2008). Como apresenta o autor, são três etapas a serem seguidas no movimento de análise de dados: a redução, a exibição e a conclusão/verificação. Seguindo esses princípios, e com base nas respostas apresentadas no questionário, utilizaram-se referenciais teóricos para discussão e apreciação.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Importa destacar, inicialmente, na tentativa de traçar os perfis dos colaboradores, que, dos 40 (quarenta) alunos que participaram do estudo, 24 (60%) eram do sexo feminino e 16 (40%) do sexo masculino. As idades dos participantes variaram entre 15 e 18 anos. Considerando os aspectos sociais-culturais e ambientais das turmas, 34 (80%) estudantes residiam na zona urbana e apenas 6 (15%) na zona rural. A turma A possuía alunos do município de Senhor do Bonfim – BA, e a turma B, alunos dos demais municípios que compreendem o Território de Identidade Piemonte Norte do Itapicuru (TIPNI), na região norte do estado da Bahia. Foram citadas, por exemplo, as cidades de: Andorinha, Antônio Gonçalves, Itiúba e Jaguarari.

Outras inquietações também foram questionadas aos alunos. No que se refere às ocupações noturnas, ao chegar em casa, após a aula, 36 (90%) estudantes não trabalham a noite e 4 (10%) trabalham. Dos 40 estudantes, 2 (5%) possuem filhos, e 33 (85%) costumam realizar estudos durante a noite antes de dormir. Outra atividade recorrente aos estudantes durante a noite é a ida às academias para realizar atividade física: 16 (40%) estudantes realizam treinos em academias quando chegam da escola e 19 (47,5%) não treinam.

Quanto ao transporte, 39 (97,5%) estudantes fazem uso do transporte público cedido pelas prefeituras dos municípios para chegar até a instituição, apenas 1 (2,5%) estudante não faz uso do transporte público. Sobre a qualidade do transporte, apenas 1 (2,5%) estudante acha a qualidade ótima, 16 (40%) alunos acham boa, 19 (47,5%) acham regular e 4 (10%) acham ruim. Quanto à distância da residência dos estudantes até a instituição, notou-se que há muitas distinções, já que os alunos moram em municípios diferentes. Sendo assim, com base no tempo, 13(32,5%) alunos levam de 10 a 20 minutos para chegarem na instituição; 7 (17,5%) alunos, de 20 a 30 minutos; 8 (20%) alunos, de 30 a 40 minutos; 3 (7,5%) alunos, de 40 a 50 minutos; 5 (12,5%) levam uma hora para chegar; 1 (2,5%) aluno, uma hora e trinta minutos; e 3 (7,5%) alunos, mais de uma hora e trinta minutos. Com base nos resultados, o local onde residem e o tempo que levam para chegar até a escola são questões que também contribuem para a sonolência, pois precisam acordar mais cedo para se organizarem e irem para a aula, que começa às 07h30min.

No que diz respeito às questões comportamentais dos estudantes, a sonolência durante as aulas é recorrente, e, dos investigados, 7 (17,5%) alunos afirmaram dormir durante as aulas, 26 (60%) disseram que dormem às vezes e apenas 7 (17,5%) citaram não dormir nas aulas. É importante considerar que a prática de dormir nas aulas está condicionada, muitas vezes, ao número de horas que estes adolescentes dormem diariamente. Assim, 12 (30%) estudantes dormem de 5 a 6 horas de sono por dia; 14 (35%) dormem de 6 a 7 horas; 7 (35%) alunos, de 7 a 8 horas;1 (2,5%) aluno, de 8 a 9 horas; e 1 (2,5%) aluno, mais de 10 horas.

Esses padrões, referentes ao que foi apresentado anteriormente, estão relacionados ao horário em que os alunos dormem e acordam. Vale ressaltar que, no estudo de Carskadon et al. (2002), foi apresentada a recomendação de que os adolescentes necessitam em torno de 9 a 10 horas de sono por noite para a manutenção da saúde física e cognitiva; mas, diante do resultado, apenas 2 alunos conseguem atender a esta recomendação.

Pode-se observar, nas figuras 1 e 2 abaixo, o horário que os estudantes dormem e acordam.

Figura 1 – Horários que os estudantes costumam dormir durante os dias da semana

Horários que os estudantes costumam dormir durante os dias da semana.
Fonte: autores.

Figura 2 Horários que os estudantes costumam acordar durante os dias da semana

Horários que os estudantes costumam acordar durante os dias da semana
Fonte: autores.

Percebe-se que a maioria dos estudantes, neste caso, 28 (71,8%), sempre dorme a partir das 21h. Apenas um aluno relatou dormir às 20h.   Quanto ao horário que acordam, 5 (12,5%) estudantes acordam entre 4h e 5h, e a maioria, 29 (72,5%), acorda entre 5h e 6h.

O uso das tecnologias também foi um ponto questionado aos estudantes. Apesar de nenhum deles possuir em seu quarto televisores, notebooks ou videogames, fazem uso do celular constantemente antes de dormir. Com base nos resultados, 33 estudantes (82,5%) utilizam o celular antes de dormir, e, destes, 14 (35%) mantêm o celular ligado ao seu lado durante o sono e apenas 14 (35%) desligam o celular para dormir, o que torna a utilização descontrolada de aparelhos tecnológicos, como o celular, por exemplo, um fator agravante na qualidade do sono.

Até o momento, os resultados mostram que há vários fatores que podem interferir na qualidade do sono destes estudantes, e  23 (57,5%) deles relataram se sentirem cansados logo ao acordar. Além disso, 21 (52,5%) dos alunos às vezes acordam durante a noite, e 34(87,5%) sentem a necessidade de dormir mais quando acordam. Esse cenário leva 29 (72,5%) estudantes a sentirem sono durante o dia e, consequentemente, nas aulas.

Como já mencionado na introdução deste texto, o sono pode interferir no processo de ensino-aprendizagem dos estudantes; sendo assim, os alunos foram indagados sobre a contribuição do número de horas de sono para a concentração nas aulas: 38 (97,5%) estudantes acreditam que a boa qualidade de sono ajuda na atenção à aula e evita que durmam durante a sua realização. Com base nesse resultado, foram solicitadas algumas sugestões, pensando na possibilidade de melhorar a qualidade do sono apresentada por eles, e elas podem ser observadas na tabela 1 a seguir.

Tabela 1 – Sugestões para melhorar a qualidade do sono

INDIVÍDUO SUGESTÃO
Estudante 01 Ter mais tempo para poder descansar e dormir
Estudante 02 Juntar as aulas vagas e colocar as restantes em apenas 1 turno, para poder ficar livre à tarde, para poder descansar
Estudante 03 Menos atividades. Não dá tempo de descansar com tanta atividade pra fazer
Estudante 04 Dormir mais cedo.
Estudante 05 Não acordar tão cedo
Estudante 06 A escola começar um pouco mais tarde, para ter um pouco mais de tempo para dormir
Estudante 07 Ter menos vício no celular
Estudante 08 Ter 1 dia na semana sem aula para poder descansar ou ter alguma coisa na escola que contribua para o descanso do aluno
Estudante 09 Criar uma rotina, alimentação adequada e ficar longe do celular a partir de um certo horário

Fonte: autores.

Considerando as sugestões apresentadas nos excertos anteriores, percebe-se que o horário em que os alunos dormem e acordam interfere na qualidade do sono. Além disso, o número de atividades solicitadas pelos docentes, o uso do celular, a má alimentação, o horário de início das aulas ou padrão de realização das aulas, que ocorre de segunda a sábado, em tempo integral, também são fatores que contribuem para isso. Os estudantes também responderam sobre a qualidade do seu sono. Abaixo, pode-se observar como eles a classificaram:

Figura 3 Classificação da qualidade do sono pelos estudantes

Classificação da qualidade do sono pelos estudantes.
Fonte: autores.

Diante do resultado, é possível perceber que nenhum aluno classifica a sua qualidade do sono como ótima; apenas 11 (28,2%) classificam como boa; 18 (46,2%), como média; 5(12,8%), como pobre; e 5 (12,8%), muito pobre. Essa questão foi respondida por 39 alunos.

Para Wolfson et al. (2007, p. 11), a privação crônica de sono em adolescentes e jovens é um problema global e multifatorial. Ele apresenta uma possível recomendação de 9 horas de sono para adolescentes, e discute que, geralmente, essa quantidade de horas não é alcançada. Apesar disso, independentemente das mudanças nos horários do sono, a Sonolência Diurna Excessiva (SDE) apresenta tendência de aumento durante a adolescência devido a fatores biológicos (CAMPBELL et al., 2007). Em síntese, pode-se dizer que as mudanças biológicas e comportamentais que ocorrem na adolescência contribuem para o atraso de maturação nessa fase; que, ao considerar as questões de contexto social, ambiental, cultural e escolar, refletirá profundamente na diminuição das horas de sono e, consequentemente, aumentará a sonolência diurna excessiva, afetando o rendimento do trabalho e na escola, prejudicando negativamente a aprendizagem, a interação social e a qualidade de vida.

Os aspectos alimentares também foram levados em consideração na pesquisa, entendendo que a alimentação também pode contribuir para a qualidade do sono dos estudantes. Dashti et al. (2015) afirmam que as pessoas que dormem pouco (<6 horas) consomem menos vegetais do que as pessoas que dormem normalmente (6 a 9 horas), e essa situação compromete a qualidade da alimentação, que, muitas vezes, associam ao hábito de consumir gorduras, o que pode desencadear outros problemas, como a obesidade. Dos 40 estudantes, apenas 14 (35%) têm uma boa alimentação durante o café da manhã, 16 (40%) citaram que às vezes se alimentam bem e 10 (25%) alunos não se alimentam bem antes das aulas.

A instituição fornece café da manhã para os estudantes, porém, do total, apenas 25 (62,5%) alunos tomam café na instituição, 7 (17,5%) tomam café em casa e 8 (20%) alunos não tomam café pela manhã. Dentre os alimentos que os alunos consomem pela manhã estão: pão, café, aipim, batata, cuscuz, queijo, presunto, banana cozida, ovo, bolacha, mel, aveia, açaí, vitamina de banana, iogurte, achocolatado, leite, cereal, tapioca e frutas, este último foi citado apenas por um aluno, e não definiu quais frutas consome no café da manhã. Outros alunos não citaram nada, por não tomarem café pela manhã, e um aluno relatou que nunca dá tempo de se alimentar cedo, e quando chega à escola o refeitório está fechando.

Por fim, as últimas questões destacadas na pesquisa foram as de aspectos psicológicos. Ao serem perguntados sobre o uso de medicamentos antes de dormir, 32 (80%) estudantes relataram não fazer uso de medicamentos para dormir e 8 (20%) disseram fazer uso às vezes. Alinhado a isso, citaram alguns problemas de saúde que interferem no sono durante a noite: ansiedade, problemas respiratórios, insônia, crise de pânico, gases, estresse, depressão e Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG).

Considerando os resultados apresentados, pode-se perceber que a qualidade do sono dos estudantes relaciona-se a uma série de fatores, sejam de natureza biológica, devido à fase da adolescência, social, cultural, ambiental, comportamental, alimentar ou psicológica.

Ao analisar, por exemplo, as questões socioculturais e ambientais, ficou perceptível que o horário que os estudantes dormem e o horário que eles acordam, além da distância de sua residência até a instituição de ensino, são fatores que contribuem para a qualidade do sono, considerando que alguns ainda trabalham ou revisam os conteúdos das aulas à noite.

Já nas questões comportamentais, muitos alunos costumam utilizar o celular antes de dormir, o que influencia na boa qualidade do sono. De acordo com Dollman et al. (2007), esse ato é uma grande influência negativa na qualidade de sono dos adolescentes, e a tal influência pode ser notada ao se considerar a substituição das horas de sono por atividades relacionadas aos computadores, televisores, smartphones e videogames. Além disso, a pigmentação azul encontrada em equipamentos eletrônicos, e existentes dentro e fora das casas, contribui para a perda do sono. Louzada (2007) relata que estudos recentes indicam que as células ganglionares, que contêm melanopsina, são mais sensíveis à cor azul, e, por isso, apresentam maior sensibilidade a esse comprimento de onda, o que faz necessário evitar o contato excessivo com essa cor de luz antes de dormir.

Cabe destacar que o funcionamento da instituição é de tempo integral, com isso, os alunos ficam o dia todo na escola. Pensando nisso, houve sugestões para que os horários de aulas vagas fossem ocupados com as demais aulas, para que os estudantes pudessem ter um período maior de descanso. Além disso, outros alunos relataram sobre o padrão de horário de início das aulas, que o início poderia ser mais tarde, possibilitando que durmam mais. Os alunos também destacam que os professores solicitam muitas atividades, o que compromete o período de descanso e lazer.

Sendo assim, os alunos foram instigados a pensar em como melhorar ou implementar estas sugestões na instituição, e as respostas foram: 1 – seria bom se tivesse algum lugar para dormir. No alojamento, por exemplo, só temos uma cama e um colchão. Não tem outro lugar pra descansar; 2 – falando com a coordenação; 3 – organizando a minha rotina de estudos, de forma que eu possa ficar despreocupada em relação às atividades escolares; 4 – colocando um transporte somente para o IF, algo que fosse mais rápido; 5 – passando menos atividades; 6 – fazendo um cronograma das atividades e respectivos horários para sua realização, preservando a quantidade de horas para um bom sono; 7 – relaxando a mente e descansando totalmente; 8 – a aula iniciar mais tarde.

Diante do que foi colocado pelos estudantes, nota-se que mesmo a instituição possuindo alojamento, constatado a partir das observações feitas durante o estágio, este não atende a necessidade dos estudantes por conter apenas uma cama, o que leva a infraestrutura da escola ser um fator que também afeta a qualidade do sono dos estudantes, já que poderia contribuir para o descanso nas aulas vagas. E, ainda assim, os alunos citam a condição do transporte, o número de atividades solicitadas pelos docentes e o horário de início das aulas.

Pode-se considerar que todas estas questões contribuem significativamente para a qualidade do sono dos estudantes, e que estes, além de sofrerem com as alterações biológicas da adolescência, também estão vulneráveis às demais limitações advindas do contexto em qual estão inseridos. É importante destacar, também, que alguns estudantes possuem problemas psicológicos, algo que agrava a qualidade do sono, muitas vezes, têm insônia ou são impedidos de dormir, seja pela ansiedade, estresse ou depressão.

4. CONCLUSÃO

Com base nos resultados descritos no presente estudo, pode-se concluir que o sono é fundamental para manter o equilíbrio do organismo humano, contribuindo para o bom funcionamento fisiológico, psicológico e, também, do processo de ensino-aprendizagem dos estudantes.

Desse modo, partindo da investigação realizada, foi possível identificar que a maioria dos adolescentes dormem poucas horas semanais, e apresentam uma série de limitações, envolvidas com questões biológicas, sociais, culturais, ambientais, comportamentais, alimentares e psicológicas. Essas limitações, muitas vezes, prejudicam a qualidade do sono dos estudantes e podem provocar problemas no processo de ensino-aprendizagem.

As questões que implicam na qualidade do sono vão desde o horário em que os estudantes dormem e/ou acordam à distância da residência até a escola, uso excessivo do celular, horário de início das aulas, número de atividades solicitadas pelos professores, alimentação, estrutura da escola no que se refere ao alojamento e os problemas psicológicos. Desta forma, 95% dos adolescentes investigados possuem baixa duração do sono, o que causa sonolência diurna e afeta totalmente a atenção nas aulas.

Entretanto, a constatação feita nesta pesquisa reforça a urgência de inclusão desta discussão nas pautas de políticas públicas, nos cursos de formação inicial e continuada de professores, realizando debates e reuniões com pais e na sala de aula com estudantes, tendo em vista que a má qualidade do sono pode ocasionar o surgimento de doenças. Além disso, é importante que esta temática seja discutida amplamente entre os estudantes, e que estes possam refletir acerca dos seus hábitos, uma vez que grande parte dos adolescentes desconhecem os benefícios de dormir bem, tanto para a vida social quanto para a escolar. Isto posto, fica nítido a necessidade de informar e implicar sobre estas questões nas escolas, mesmo que não estejam presentes nos livros didáticos.

REFERÊNCIAS

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[2] Licenciado. ORCID: 0000-0002-4290-314X. CURRÍCULO LATTES:  http://lattes.cnpq.br/3075002534705579.

[3] Orientador. Doutor. ORCID: 0000-0002-7283-0367.CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/5104791370402425.

Enviado: Fevereiro, 2023.

Aprovado: Fevereiro, 2023.

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Américo Junior Nunes da Silva

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