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Barriga de aluguel: os principais aspectos para a legalização no Brasil

RC: 150467
505
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/barriga-de-aluguel

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

RIBEIRO, Luciana Leandro [1], BIANCHINI, Thaina Cristina Reis Batista [2], NOGUEIRA, Rodrigo Sant’Ana [3]

RIBEIRO, Luciana Leandro. BIANCHINI, Thaina Cristina Reis Batista. NOGUEIRA, Rodrigo Sant’Ana. Barriga de aluguel: os principais aspectos para a legalização no Brasil. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 08, Ed. 12, Vol. 01, pp. 15-31. Dezembro de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/barriga-de-aluguel, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/barriga-de-aluguel

RESUMO

O presente trabalho trata da possibilidade de legalização da prática da barriga de aluguel mediante uma contraprestação remuneratória, possuindo como pressuposto inicial a utilização do útero de uma mulher cedente para a ocorrência da reprodução assistida heteróloga e/ou homológa. Ademais, apresenta uma exposição sobre a prática à partir da Resolução do Conselho Federal de Medicina nº 2.294/2021, em razão de, até a presente data, não haver legislação a respeito da reprodução assistida. Neste sentido, a problemática do artigo limita-se em demonstrar a ineficácia da criminalização da barriga de aluguel no Brasil, pois a contraprestação da prática já é sua realidade no Brasil. Portanto, a fim de viabilizar a pesquisa, utiliza-se o método hipotético-dedutivo e a pesquisa bibliográfica para alcançar os resultados desejados, demonstrando que a mera criminalização da barriga de aluguel não impede a sua prática no meio social.

Palavras-chave: Barriga de aluguel, Resolução nº 2.294/2021, Legalizar, Remuneração, Útero de substituição.

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho busca, através dos métodos de pesquisas hipotético-dedutivo e bibliográfico, demonstrar a ineficácia da criminalização da barriga de aluguel no Brasil, em face de sua já ocorrência, bem como, enfatizar que a ilegalidade de uma contraprestação para as mulheres que cedem os seus úteros para uma gestação de terceiros, ferem os princípios constitucionais de autonomia corporal e liberdade de escolha.

Primeiramente, expõe que  a prática da barriga de aluguel carece de legislação própria, sendo apenas regulamentada pela Resolução nº 2.294/2021 do Conselho Federal de Medicina, a qual estabelece regras para a prática dessa modalidade de reprodução assistida, em que a cedente deve ter ao menos um filho vivo e pertencer à família de um dos parceiros, com relação consaguínea até o quarto grau ou através de uma avaliação e autorização do Conselho Regional de Medicina (CFM, 2021).

No mais, em termos jurídicos, a prática da barriga de aluguel pode ser definido como uma substituição temporária do útero por sub-rogação, bem como um negócio jurídico, em face da obrigação de dar que a mulher é inserida no procedimento, pois fica compelida a entregar a criança para o outro casal.

Ademais, também pode afirmar que a vedação da contraprestação pecuniária nos casos da barriga de aluguel não possui nenhum respaldo jurídico, vez que não há lei específica que trate dessa modalidade de reprodução assistida, sendo assim, com base na Constituição Federal, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo se não em virtude de lei.

Sendo assim, a lacuna jurídica existente na temática da reprodução assistida por meio da barriga de aluguel traz à luz dúvidas jurídicas, levando o cometimento de insegurança e limitações do procedimento, o qual afronta o princípio do planejamento familiar, tutelado pela Constituição Federal.

Por segundo, demonstra que essa criminalização afronta princípios basilares do direito constitucional, impedindo que a mulher exerça o papel de decisão sobre seu próprio corpo, como também que a ilegalidade traz riscos a prática sem o devido cuidado ético, pois mesmo possuindo vedação contra o pagamento pecuniário para a mulher cedente, a prática de uma contraprestação é uma realidade no Brasil, por meio da disponibilização em redes sociais e grupos na internet.

Neste sentido, a problemática central do artigo é demonstrar que a criminalização da barriga de aluguel fere direitos e princípios constitucionais, bem como abre margem para uma prática antiética, desumana e violadora de corpos das mulheres, uma vez que conforme já citado, a ilegalidade do procedimento não impede a sua realização.

Por último, aborda a correlação do procedimento realizado no Brasil com o direito comparado, pois notadamente há países que regulam e permitem a ocorrência da Barriga de Aluguel, como os Estados Unidos e Colômbia, utilizando-se do direito comparado para demonstrar a importância da regulamentação e legalização do procedimento.

2.  BARRIGA DE ALUGUEL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Persistiu por vários séculos a ideia que a única forma de reprodução era por meio da concepção natural entre o homem e a mulher, através do ato sexual. Contudo,  diante da reformulação estrutural da noção do núcleo familiar, esse pensamento passou a ser desatualizado, conforme o surgimento de outras modalidades de famílias, pois tal entendimento excluía os casais inférteis, homossexuais, transgêneros e pessoas com vontade de reprodução independente, que não poderiam realizar o sonho de sua prole de maneira natural.

Diante disso, a partir do surgimento de novos núcleos familiares, foi necessário o advento de novas formas de reprodução pelo ser humano, permitindo a ocorrência de métodos artificiais para a reprodução, objetivando ajudar os indivíduos que não possuíam capacidade de se reproduzirem da forma natural.

Sendo assim, por meio de avanço científico, foi construído no decurso dos séculos, possíveis soluções para tratar dessa problemática, surgindo como um dos meios de resolução, a reprodução assistida, em que é um método de operações para unir artificialmente os gametas femininos e masculinos que irão originar um novo ser humano, podendo ocorrer por meio de barriga solidária, também chamada de útero de substituição, a qual consiste na doação temporária do útero de uma mulher pelo período de 9 (nove) meses para um casal ou pessoa que não pode engravidar de maneira natural.

Desse modo, é importante ressaltar a análise do médico e advogado, Vallter Nilton Felix (2009, p. 4):

O que o torna possível uma verdadeira família não é a maneira pela qual ela se constituiu, mas o amor, o respeito e alegria pela vinda do outro. Em todas as doenças humanas, a incapacidade de reproduzir-se naturalmente é uma das que mais nos torturam. E, para curá-las, o homem criou a medicina reprodutiva. E esta, por sua vez, criou a reprodução assistida.

Assim, no caso da barriga solidária, não há função maternal pela mulher cedente, pois a ela é oferecida apenas a função inerente de gestação, de guardar o embrião e aguardar o seu desenvolvimento até o nascimento do infante. Entretanto, informa que a mulher cedente ainda pode contribuir com seu material genético, por meio da doação de seu óvulo.

O devido método de reprodução assistida possui suas diretrizes contidas na Resolução nº 2.294/2021 pelo Conselho Federal de Medicina (CFM, 2021), o qual, dispõe sobre as medidas éticas para a utilização das técnicas do procedimento. Neste sentido, conforme a resolução, para que uma mulher seja cedente temporária deve conter ao menos um filho vivo, pertencer a família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até o quarto grau  ou nessa impossibilidade de ter uma autorização do Conselho Regional de Medicina.

Todavia, a legislação brasileira veda a utilização da reprodução assistida por meio do útero de substituição como caráter lucrativo ou comercial, prática conhecida pejorativamente como “barriga de aluguel”. No mais, o art. 199, parágrafo 4º da Constituição Federal também proíbe, expressamente, qualquer comercialização do útero para fins comerciais (Brasil, 1988).

Entretanto, apesar de a Constituição Federal vedar o caráter comercial do corpo humano, nota-se que no caso da reprodução assistida por meio da cessão do útero, não trata-se de comercialização pura, pois não há a exposição à venda de nenhuma parte do corpo, mas apenas de cessão temporária em troca de um pagamento.

Portanto, explica o jurista João Baptista Villela (1979) que a cessão do útero por meio da barriga solidária têm que ser tratado sob o viés de negócio jurídico de comportamento, pois compreende obrigação de dar, em que a dona do útero fica obrigada a entregar o filho gerado em seu órgão reprodutivo.

No mais, embora a prática da cessão do útero em troca de algum pagamento pecuniário também não seja bem visto pela sociedade brasileira, é indiscutível que essa vedação não justifique a proibição de remuneração, pois trata-se de um negócio jurídico de prestação de serviços em que uma parte cede temporariamente o seu útero, o que pode lhe causar limitações físicas durante a gestação e até mesmo seu falecimento durante o parto.

Também pode ser citado a violação dos direitos fundamentais no campo do direito da mulher, pois causa o cerceamento de sua autonomia corporal, uma vez que a referida decisão trata de direito personalíssimo do próprio corpo e que a lei não pode ignorar tal fato, aliás, pode-se até afirmar que a vedação impõe uma violação a liberdade da mulher em dispor sobre o direito de alienar o seu próprio corpo.

Assim, a ilegalidade da barriga de aluguel, possui grande impacto nos direitos inerentes a liberdade da mulher, bem como, na ascensão da modalidade de reprodução assistida, pois a mulher cedente fica a mercê de qualquer eventual dano que a gestação possa resultar sem nenhuma garantia financeira para o futuro, inviabilizando o procedimento, em razão desse ponto negativo.

Este entendimento apresentado possui um grande acolhimento pelo movimento feminista, o qual idealiza  o direito à livre escolha da mulher em dispor sobre o seu próprio corpo, sem nenhuma imposição estatal do regulamentando  (Raposo, 2005).

Ademais, a proibição do pagamento pecuniário para a modalidade de reprodução assistida por meio de barriga de aluguel, não impede que a prática ocorra, para fins de comprovação do alegado, cita a página Barriga Solidária, no Facebook, com mais de 2,7 mil membros, em que mulheres interessadas a serem cedentes se oferecem para ceder o seu útero em troca de uma prestação pecuniária, bem como, pessoas interessadas no serviço.

Segue casos de pessoas anunciando sobre sua disposição em ser barriga de aluguel:

Figura 1 – Anuncio da Mulher 1

Fonte: Grupo barriga de aluguel, com mais de 2,7 membros (Facebook, 2023).

Figura 2 – Comentário da Mulher 2

Fonte: Grupo barriga de aluguel, com mais de 2,7 membros (Facebook, 2023).

Neste sentindo, não resta dúvidas que a ilegalidade da contraprestação de pecúnia em face da barriga de aluguel encontra-se totalmente desatualizada, pois sua prática já possui incidência no meio social, sendo amplamente divulgada através de grupos para essa finalidade em redes sociais.

3. RESOLUÇÃO Nº 2.294/2021 DO CFM

A Resolução de nº 2.294/2021 do CFM é explícita ao estabelecer a vedação do caráter lucrativo e comercial da cessão temporária do útero. Por isto, a terminologia mais adequada para apontar é barriga solidária, tendo em vista a doação temporária do uso do órgão reprodutor feminino.

Embora já tivesse outras resoluções, a mais nova resolução do CFM, aliás, único amparo legal existente atualmente para tratar mais uma vez sobre os filhos advindos de técnicas de reprodução assistida, vem por estabelecer as normas éticas e jurídicas para a sua utilização.

Tendo em consideração a existência de problema médico que impeça ou dificulte a gestação pelos meios naturais, ou ainda em caso de união homoafetiva ou de pessoa solteira é permitidaa gestação por substituição no Brasil somente na forma não onerosa (CFM, 2021).

Além disto, insta mencionar os critérios legais para que a ocorra. É certo que a cedente temporária do útero deve ter ao menos um filho (a) vivo e pertencer à família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até 4º grau, quais sejam: mãe; irmã; avó; tia ou prima, respeitada a idade limite de até 50 anos.

Ademais, a permissão para a gestação por substituição deverá constar as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida, estejam eles, o termo de consentimento dos pacientes, relatório médico atestando sobre a adequação clínica e emocional de todos os envolvidos, e compromisso de registro civil da criança, contemplando desde logo os aspectos biopsicossociais e riscos inerentes à gestação, que envolvam a paciente e os descendentes gerados pela técnica de reprodução assitida, bem como os pormenores legais sobre a filiação.

Conquanto é necessária a positivação jurídica também no sentido de permitir o uso responsável da barriga de aluguel no Brasil na forma onerosa. Haja vista que a resolução do Conselho Federal de Medicina resguarda tanto os interesses da cedente, quanto os interesses dos pacientes contratantes, ainda assim não tem força jurídica o suficiente para abranger caráter normativo e obrigatório.

Assim se faz necessária a criação de lei própria que regulamente e assegure os direitos inerentes aos pais de conceber, e de gerar uma nova vida ainda que não no útero da mãe biológica, mas assim em um útero cedido por uma outra mulher.

O direito médico brasileiro é cedento de regulamentação acerca das técnicas de reprodução humana assistida, em especial o direito reprodutivo da mulher. Nesse sentido, vejamos como se comporta a barriga de aluguel no ordenamento jurídico brasileiro.

4. TÉCNICAS DE REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL HOMÓLOGA E HETEROLÓGA

O Código Civil brasileiro de 2002 trouxe em capítulo próprio sobre o tema de filiação proveniente à inseminação artificial, regulamentando a possibilidade da reprodução assistida, até mesmo post mortem, em que trata do procedimento de inseminação após a morte do pai ou da mãe, ou em casos de fecundação homóloga ou heteróloga (Brasil, 2002).

Os incisos III, IV e V do aludido dispositivo 1.597 do Código Civil, fazem incidir sobre a presunção dos filhos concedidos na constância do casamento. Vale ressaltar que o enfoque é tratar sobre os aspectos que a barriga de aluguel traz para a discussão no ordenamento jurídico brasileiro (Brasil, 2002).

Os casos de infertilidade humana são tratados como problema de saúde mundial, sendo deste modo um dos empecilhos para a procriação humana.  A Organização Mundial da Saúde (OMS) define como infertilidade a ausência de gravidez após 12 meses de tentativas com relação sexual sem contraceptivo. Estima-se que o problema atinge cerca de 15% dos casais em idade reprodutiva (Unimed, 2021).

Ademais, a possibilidade de a reprodução humana assistida assegurar as pessoas acometidas por fatores externos a infertilidade, a título de exemplo, as mulheres que estão postergando a maternidade, o reconhecimento da união estável dos pares homoafetivos, contemplando o conceito jurídico de família.

Casais optam pelas técnicas de inseminação sub-rogada a uma terceira mulher, porquanto demonstrado limitações biológicas, problemas derivados de gestações anteriores, morosidade no processo de adoção ou ainda pelas novas formações de entidades familiares.

Dessa maneira, podem, dentre várias técnicas, optarem pela inseminação homóloga e, ou a inseminação artificial heteróloga. O que diferem uma da outra é apenas no requisito da origem do material genético implantado no útero por substituição.

Por vezes, a inseminação artificial heteróloga é utilizada como derradeira técnica de reprodução assistida, haja vista que em ocasiões anteriores os cônjuges não lograram êxito após descobrirem o acometimento da infertilidade irreversível.

Nas palavras de Rolf Madaleno (2021, p. 594),

É heteróloga a inseminação artificial quando utiliza o sêmen de um doador que não o marido ou o companheiro, sendo imprescindível o expresso consentimento do parceiro. E para que não pairem dúvidas, a cessão de material genético tanto pode implicar produto biológico do homem (espermatozóide), como da mulher (óvulos).

Carlos Roberto Gonçalves (2021, p. 552) explica que “a inseminação homóloga é realizada com sêmen originário do marido, nesse caso o óvulo e o sêmen pertencem à mulher e ao marido, respectivamente, pressupondo-se, in casu, o consentimento de ambos”.

5. BARRIGA DE ALUGUEL E DIREITO INTERNACIONAL COMPARADO

Cada país é livre para disciplinar normas legais sobre o tema barriga de aluguel. Com fito de progressão mundial, comparam-se as sistemáticas quando hajam percebidos conflitos de interesses e, para isso, dispõem como uma forma de prospecção.

Neste sentido, o estudo do direito comparado traz a análise que alguns países permitem a comercialização da barriga de aluguel de forma lucrativa, não apresentando nenhuma similidade com a regulação da prática no Brasil em que praticam de forma lucrativa ou não a barriga de aluguel, reforça cada vez mais a necessidade de haver a positivação similar no Brasil, a julgar a prática velada e negligenciada que ocorre diariamente.

Em trabalho recentemente apresentado por Andressa Lobo Nascimento e Camila Rodrigues de Souza Brito (2021) intitulado de “Barriga de Aluguel e seus Aspectos Jurídicos”, é possível observar as discrepâncias  entre o tratamento dado por cada sistema jurídico ao redor do mundo.

Para isso, as autoras agruparam cada sistemática sob a aplicação da barriga de aluguel. Países como França e Alemanha vedam expressamente a gestação por substituição, conforme legislação respectivamante, Lei de Proteção ao Embrião de 1991, e Lei da Bioética de 29 de julho de 1940, atribuindo assim à cedente do útero o título de mãe da criança.

Há países em que a legislação é omissa, ou seja, não há nenhuma previsão legal, ora para proibir, ora para permitir, sendo eles: Argentina e Tailândia. Em outros países, para tanto, a gestação por substituição é lícita na modalidade não onerosa, sendo o caso do Brasil, Austrália, Espanha e alguns estados dos EUA.

Por sua vez, as autoras expõe países como Índia, África do Sul e Ucrânia, onde é permitido a gestação por substituição até mesmo na forma comercial, com clínicas médicas voltadas para a seleção de “mães cedentes” que vão portar por 09 meses o bebê em seu útero (Nascimento e Brito 2021)

Insta mencionar a procura por países em que são permitidos a prática da barriga de aluguel, apenas diferindo algumas particularidades, a citar pelas restrições. Por isto, é legítima a regulamentação específica em nosso ordenamento jurídico, sobretudo o direito à vida constitucionalizado em nossa Carta Magna de 1988.

Não há o que se falar em violação dos preceitos tidos na Constituição Federal brasileira de 1988 em relação ao tema barriga de aluguel, haja vista que a disposição do corpo da mulher para abrigar um embrião em seu útero até o nascimento não viola a integridade física ou moral da mulher cedenteque, por vezes, também não há prejuízos para nenhuma das partes envolvidas. Para o constitucionalista Alexandre de Moraes “o direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos” (Moraes, 2004).

Nesse mesmo sentido o autor acrescenta que: “A Constituição, é importante ressaltar, protege a vida de forma geral, inclusive a uterina” (Moraes, 2004).

Em artigo científico publicado em 2013, Yury Augusto dos Santos Queiroz e Marisa Schmitt Siqueira Mendes defendem a legitimação da barriga de aluguel no Brasil, e reforçam ainda que a legislação deva acompanhar de igual forma a evolução e mudança científica.

(…) destarte, a existência de uma lei que regule, controle e puna em caso de descumprimento, assegurando a saúde primeiro e principalmente da criança, e posteriormente a da gestante coagindo atos de exploração e ilegalidade impostos pela pobreza.Nesse sentido entende-se que a “barriga de aluguel” deve ser sim, legalizada e regulamenta na forma de Lei, tendo como base a Resolução (…) do Conselho Federal de Medicina, acrescentando os aspectos jurídicos necessários e inerentes, pois a evolução e mudança científica deve ser acompanhada pela mudança legislativa (Queiroz, Mendes, p. 10, 2013).

Com isso, vemos quão suprimido é, permitir a comercialização da gestação no exterior, e negar o direito à vida, o direito à filiação biológica aqui no Brasil. Seria mais seguro haver a regulamentação da comercialização da barriga de aluguel no Brasil, até mesmo como forma de assegurar a situação de mulheres que sofrem violação da cessão temporária de seu útero.

Pois bem, é legal a regulamentação da barriga de aluguel na forma onerosa, conquanto assegurará as mulheres que, por algum problema, são impedidas de gerar seus próprios filhos no útero, e também aos casais homossexuais que por questões naturais são impossibilitados de terem filhos.

6. A JURISPRUDÊNCIA FRENTE A BARRIGA DE ALUGUEL

Em julgados recentes, listados logo abaixo, a jurisprudência tem-se mostrado acolhedora com os temas relacionados à barriga de aluguel. Seria, no entanto contraditório não haver judicializações de um entrave social e que tenha relação com a saúde mundial.

Por este fato, assuntos como a inclusão de gestante por substituição como beneficiária temporária no plano de saúde, benefício de salário maternidade para pai solteiro de um casal de crianças geradas através da utilização da ‘barriga de aluguel’ (Brasil, 2021), e licença gestante em caso de barriga solidária foram julgados pela Corte brasileira.

Acredita-se que os primeiros nascimentos de bebês havidos pela prática da barriga de aluguel no Brasil se deram na década de 90, ainda no século XX. Em 2005, no centro-oeste brasileiro, o primeiro feito de gravidez com útero de substituição é o caso da menina Eduarda, sobrevivente de uma gestação tripla.

No livro “Procedimentos Pioneiros na Medicina Goiana”, é possível observar o grande feito acordado entre as partes envolvidas e a justiça ao estabelecer peviamente os limites éticos e sociais da reprodução assistida no caso Eduarda. Vejamos o que diz as autoras Rafaella Tadão e Paola Carloni (2006, p. 74):

Com a finalidade de evitar possíveis problemas familiares, eles preferiram levar o caso à Justiça para que pudessem eles mesmos escolher a “mãe substituta”, sem que fossem necessários laços consangüíneos com ela. Com amparo legal pelo Conselho Regional de Medicina e pela lei, o procedimento pode ser planejado. No final de 2004, após a sincronização do organismo da gestante que iria “emprestar” o útero com o da mãe biológica, a gestação teve início.

É legitimo o fato das partes recorrerem à justiça para definir desde logo o trato, já que não possui lei própria para tratar do tema. Este é um dos pontos que corrobora ainda mais a dúplice entre o possível e o aceitável, sobre a permissão da prática de barriga de aluguel ainda que comerciável.

7. INTERFERÊNCIAS FILOSÓFICAS ACERCA DA GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO

Do ponto de vista filosófico, a referida prática de gestação de substituição redefiniu o conceito de reprodução humana, pois a reprodução humana acontecia somente pelos meio naturais ou pertencente unicamente ao domínio da natureza em que se obtiam a procriação, hodiernamente tem-se a interferência humana, em contéudo social, termo este nominado pelas autoras Raquel Veggi Moreira e Verusca Moss Simões dos Reis (2019).

No artigo científico intitulado “Gestação de Substituição: implicações filosóficas e redefinição da noção de maternidade” de 2019, demonstrou-se a evolução histórica da noção de maternidade, vez que dentro do contexto histórico da humanidade, perpassando entre o conceito religioso, filosófico, psicanálise, antropológico, dentre outros, as diversas novas configurações do formato de família, sendo que, esta não ficou adstritamente no núcleo formado tradicionalmente por pai, mãe, e filhos (Moreira e Reis, 2019).

Nesse sentido, conclui-se que  os núcleos familiares, seja monoparentalidade, ou homoafetividade, nascem da necessidade humana na busca de efetivação da procriação por meio de técnicas de reprodução assistida já consolidadas nos entremeios da sociedade.

Sendo assim, a partir da mudança social do conceito do núcleo familiar, é incontestável que as formas de procriações também sofreriam suas consequências, devido ao avanço científico ligado à medicina. Com isso, temos a reprodução assistida por meio do útero por substituição, sendo a sua prática considerada uma prática altruísta, em que uma mulher cede o seu útero de forma temporária para gerar uma criança para um casal ou uma pessoa independente que esteja impossibilitada de gerar na forma natural.

Contudo, a prática não pode se dar de forma onerosa, possuíndo vedação para o caráter comercial do útero, como também conhecido de barriga de aluguel. Todavia, o corpo humano é um capital simbólico em que os valores atrelados a ele são restritivamente pessoal. Portanto, o pagamento de um valor para a utilização temporária do útero da mulher cedente não retira o espírito altruísta do procedimento.

Aliás, a contraprestação pecuniária para a realização do procedimento não coisifica a criança como uma mercadoria de troca, pois a mulher cedente fica a mercê de todos os riscos provenientes de uma gestação, inclusive tratando-se de sua própria vida, uma vez que não é raro falecimento de gestantes durante a realização de um parto. Sendo assim, é imprescindível que para tal, a mulher receba algum tipo de pagamento financeiro.

8. CONSIDERAÇÃO FINAIS

O presente trabalhou buscou demonstrar a importância da legalização da remuneração na contratação do uso de barriga de aluguel pela técnica de reprodução humana assistida, como já ocorre em alguns ordenamentos jurídicos internacionais, uma vez que trata de um tema de grande relevância social, em razão das modificações ocorridas durante as últimas décadas dentro do contexto do núcleo familiar.

Para tanto, a partir da análise de obras e artigos sobre os temas, foi possível constatar que essa vedação fere os princípios de liberdade de escolha e autonomia corporal da mulher, pois cerceia que mulheres tomem decisões sobre seu próprio corpo, por serem impedidas pelo ente estatal.

Ademais, conforme demonstrado no presente artigo, nota-se que a vedação não impede a ocorrência da troca pecuniária no uso da barriga de aluguel, ocorrendo a existência de grupos em redes sociais, onde há demandas de interesses em servir como mulher cedente, bem como, pessoas dispostas a pagarem para que mulheres ofereçam o seu útero temporariamente para a gestação de um infante.

No mais, é cristalino que a legalização da remuneração para o uso temporário do útero deva ocorrer de forma responsável e ética, preservando desde logo a vida do nascituro e da mulher cedente, respeitando todas as disposições constitucionais que dispõem sobre o direito à vida.

Sendo assim, nota-se que a legalização não é apenas importante para tratar a presente modalidade de reprodução assistida como um negócio jurídico, mas também para a regularização de sua prática, uma vez que a criminalização não impeça a sua ocorrência, podendo ocorrer procedimentos sem nenhuma percepção ética.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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VILLELA. João Baptista. Desbiologização da paternidade. Revista de Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, n. 21, maio 1979.

[1] Pós-Graduação em Dentística Restauradora – Associação Brasileira de Odontologia, ABO, Seção Goiás (2012); Pós-Graduação em Saúde Pública e Estratégia em Saúde da Família – Centro Universitário de Anápolis, UniEVANGÉLICA (2012); Graduação em Odontologia – Centro Universitário de Anápolis, UniEVANGÉLICA (2006). Graduação em curso: Bacharel em Direito – UniCerrado, Centro Universitário de Goiatuba/GO. ORCID: 0009-0003-3436-1226. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0118994322230130.

[2] Pós-graduação lato sensu em Direito Penal e Processo Penal com Habilitação em Docência do Ensino Superior em curso: pela Radiante Centro Educacional Ltda; Graduação em curso: Bacharel em Direito: pela UniCerrado, Centro Universitário de Goiatuba/GO. ORCID: 0009-0000-2422-4381. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/5969591242123620.

[3] Orientador. ORCID: 0000-0001-9491-4556.

Enviado: 14 de março de 2023.

Aprovado: 4 de dezembro de 2023.

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