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Reforma e contrarreforma contemporâneas: a disputa pelo poder por meio da política

RC: 151198
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencia-da-religiao/reforma-e-contrarreforma

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

PINTO, Késia Milléri [1], STEPHANINI, Valdir [2]

PINTO, Késia Milléri. STEPHANINI, Valdir. Reforma e contrarreforma contemporâneas: a disputa pelo poder por meio da política. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 09, Ed. 01, Vol. 01, pp. 148-156. Janeiro de 2024. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/ciencia-da-religiao/reforma-e-contrarreforma, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencia-da-religiao/reforma-e-contrarreforma

RESUMO

Desde a antiguidade a religião se faz presente na vida humana. A crença em um poder superior é o que faz o homem seguir a sua jornada nessa vida. No entanto, é perceptível observar que desde sempre as religiões foram utilizadas como forma de controle social político e econômico. Na Antiguidade, egípcios, gregos e romanos se utilizavam da crença nas divindades para controlar seus povos. A Igreja Católica durante muitos séculos foi detentora absoluta do poder e se utilizava do medo como forma de manutenção da ordem. Na Idade Média ela ditava, por exemplo, obras literárias que podiam ou não ser lidas e quem fosse pego de posse de alguma delas era condenado à morte. Esse grande poder do catolicismo fez surgir na população europeia indivíduos como Lutero e Calvin que questionavam a forma como a Igreja de Roma trabalhava e seus ideais levaram à Reforma Protestante e, posteriormente, à Contrarreforma. Atualmente, observa-se, de modo menos intenso, a disputa pelo poder entre a Igreja Católica e as igrejas protestantes. Com o tempo, os movimentos religiosos começaram a perceber que a inclusão na política brasileira seria a melhor forma de lutar pelas suas convicções e ideais e, obviamente, pelo poder político, econômico e social. Não obstante, hoje o Congresso Nacional apresenta a maior bancada evangélica da história do Brasil.

Palavras-chave: Religião, Protestantes, Pentecostais, Sociedade.

1. INTRODUÇÃO

Desde tempos imemoriais a religião se faz presente na sociedade. Babilônios, egípcios, gregos, romanos, astecas, incas, todos os povos existentes nesse planeta tiveram a religião como um de seus pilares. Funari et al. (2009) afirma que muitas pinturas encontradas em cavernas representam cerimônias religiosas. Obviamente que as expressões de fé tinham motivações diferentes, preocupando-se com a caça e fertilidade visando a obtenção de alimento.

Com o passar do tempo, o homem evoluiu, construiu conhecimento e se tornou mais consciente do mundo ao seu redor. Consequentemente, a religião passou a ter funções diferentes. No antigo Egito, por exemplo, os faraós eram considerados os representantes dos deuses egípcios na Terra; na Grécia, os deuses eram adorados e representavam os fenômenos que não eram passíveis de explicação e, portanto, mistérios (Funari et al., 2009). O mesmo raciocínio se observa ao analisar as religiões de outras civilizações.

O grande fato sobre as religiões, no final de tudo, é que elas sempre foram ferramentas para manter a ordem e o controle nas sociedades. Delumeau (1989) traz a reflexão acerca do controle promovido pela religião, em especial a católica, ao analisar o comportamento social na idade média, onde os cristãos criam que desastres e doenças, por exemplo, eram respostas divinas aos pecados cometidos pelo povo; que o pecado era a causa de toda a maldade que recaía sobre o povo e começaram a ser punidos sem critério.

E durante toda a história se vê episódios de atrocidades cometidas em nome da religião, visando o controle sobre a sociedade. A filosofia do medo implementada com o intuito de manter as pessoas seguindo em um sentido determinado pela religião.

Lutero e Calvin questionavam a ideia de um Deus punitivo e a igreja como ponto central da fé (Delumeau, 1989). Para eles, Deus é um ser que salva a todos independente do pecado cometido e a igreja deveria ser invisível, na qual Deus era o centro de toda a adoração e não o templo. E foi justamente essa mudança de perspectiva que levou aos embates conhecidos como Reforma Protestante, posteriormente combatidas pela Contrarreforma da Igreja Católica que não admitia a perda do poder adquirido até então.

2. DESENVOLVIMENTO

Reforma e Contrarreforma se constituíram em movimentos de grande influência e impacto na sociedade europeia nos séculos XV a XVII. Posteriormente, as diferentes denominações religiosas oriundas desses movimentos se disseminaram pelo mundo e chegaram ao Brasil.

Desse ponto em diante, serão feitas duas reflexões acerca da religião na sociedade brasileira contemporânea: 1) Será que Reforma Protestante e Contrarreforma se restringiram somente aos séculos XV a XVII ou ainda estão presentes na sociedade atual?; 2) As religiões contemporâneas ainda exercem controle sobre a sociedade atual?

2.1 REFORMA E CONTRARREFORMA NA ATUALIDADE

É notório observar que, de maneira geral, a reforma protestante e a contrarreforma se constituíram em movimentos de grande relevância social na Europa do século XV. Mostrou a insatisfação da sociedade com as imposições da Igreja Católica e levou ao desenvolvimento de novas vertentes religiosas que, a priori, se propunham ser mais libertadoras e menos controladoras. Ao mesmo tempo, esse período histórico mostrou que a perda de fiéis levou a Igreja Católica a usar a força para recuperar terrenos perdidos. Delumeau (1989) mostra essa necessidade da Igreja Católica ao afirmar que a Contrarreforma tinha como objetivo a reconquista pelas armas de territórios perdidos para a Reforma e a conversão em massa dos protestantes por meio de missões, fundação de colégios, entre outros.

Ao longo dos anos os conflitos foram diminuindo e cessaram. Pelo menos não se observa, atualmente, conflitos armados entre a Igreja Católica e as demais religiões cristãs que se originaram a partir da Reforma Protestante ao longo do tempo. É claro que a disputa entre as religiões se faz presente atualmente. Os motivos continuam os mesmos do período da Reforma e Contrarreforma, e anteriores a ele, o poder social, econômico e político. Amaladoss, 2002, p. 182 reforça esse ponto de vista dizendo que:

Conflitos entre grupos surgem quando são forçados a partilhar o mesmo espaço geográfico, econômico e político. Tal proximidade implica uma questão de poder: quem controla a situação, quem domina. Esta necessidade de dominar parece ser uma exigência básica dos seres humanos, enquanto animais políticos. O controle político contudo, torna-se crucial quando, na esfera econômica, há competição por recursos limitados. Em tal situação, os indivíduos consideram indispensável o apoio grupal. O grupo religioso, naturalmente, será o mais forte, por ter Deus ao seu lado. Um grupo religioso pode ser até mais estreitamente unido do que um grupo de classe.

Percebe-se através dos argumentos de Amaladoss (2002) que a religião possui grande força em uma sociedade. E esse poder exacerbado que ela possui pode se tornar um grande problema e levar a guerras e conflitos. É o que se observa no Oriente Médio, onde grupos radicais islâmico vivem em constante conflito com outros povos dizendo ser a vontade de Alá, quando na realidade todo o interesse está relacionado a questões políticas e econômicas.

No Brasil tem se observado uma crescente participação de religiosos em questões políticas e econômicas, em sua maioria de igrejas protestantes. Segundo Silva (2017), a Assembleia de Deus se tornou a maior representação do pentecostalismo no Brasil até a década de 1950, o que diminuiu o poder da Igreja Católica no país.

Com a constituição de 1891 havia legitimado a separação entre Estado e Religião e, portanto, instituído o estado laico e com a expansão do pentecostalismo, a Igreja Católica, que vinha perdendo força na sociedade brasileira, cria a Liga Eleitoral Católica (LEC) que visava influenciar a política brasileira por meio da eleição de representantes provenientes de seus fiéis (Silva, 2017).

Para se ter ideia de como a religião atua no intuito de manter o controle social, político e econômico, os candidatos da LEC eleitos, segundo Silva (2017), eram fiscalizados por comissões constituídas por membros da Igreja Católica que tinham o objetivo de discutir questões relativas à legislação brasileira e atuavam como mediadores entre igreja e política objetivando a elaboração e criação de leis que visassem os interesses da instituição católica.

Nos últimos anos, as igrejas pentecostais têm dedicado especial atenção às questões políticas e eleitorais. No final da década de 1980, com a elaboração da constituição de 1988, a participação dessas instituições religiosas na política ganhou força. Os motivos para essa intensificação se devem, nas palavras de Silva, 2017, p. 238:

Primeiramente, o temor de que a Carta Constitucional contemplasse temas como a liberação das drogas e a descriminalização do aborto incentivou a articulação e presenças destes no cenário político partidário. Por outro lado, havia também o receio de que setores da Igreja católica aliado a forças à esquerda no quadro partidário viessem a aprovar leis com o intuito de impor limites ao avanço dos (neo) pentecostais.

Dessa forma, percebe-se, então, que a disputa entre a Igreja Católica e as Pentecostais se faz presente na sociedade atual. Mesmo que não haja confrontos armados, a disputa pelo poder, seja ele econômico, político e/ou social ocorre por meio da participação religiosa nos movimentos políticos.

2.2 AS RELIGIÕES CONTEMPORÂNEAS E O CONTROLE SOCIAL

A Constituição Brasileira promulgada em 1988 (Brasil, 1988) traz a laicidade ao Estado Brasileiro por meio do seu artigo 5º, incisos VI, VII e VIII, que dizem:

VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

VII – é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.

De fato, a liberdade religiosa é garantida e todos têm o direito de manifestar a sua crença sem julgamentos. No entanto, é preciso analisar que os movimentos religiosos têm ganhado cada vez mais força nas questões políticas nos últimos anos. Machado (2015) confirma essa visão ao dizer que devido ao crescimento da comunidade pentecostal e da grande capacidade de mobilização desse grupo foram os fatores que levaram à percepção da necessidade de participação na política brasileira, tal qual foi feito pela Igreja Católica com a criação da LEC.

Nos últimos anos, tem-se visto que a participação de cristão pentecostais e neopentecostais na política brasileira cresceu e tem elegido número cada vez maior de políticos para a chama bancada evangélica. Quadros e Madeira, 2018, p. 496, confirmam esse fato ao afirmarem que:

Na legislatura eleita em 2014, 31 deputados da bancada evangélica estão alocados no PRB, no PR e no PSC. Os demais parlamentares estão espalhados em nada menos que 20 partidos, compreendendo praticamente todo o espectro ideológico. Alguma fragmentação ocorre também quando o filtro é a igreja a qual pertence cada deputado. Ainda que 24 pertençam à Assembleia de Deus e 12, à Igreja Universal do Reino de Deus, os demais parlamentares da bancada estão distribuídos em outras 24 igrejas, inclusive em algumas oriundas do protestantismo tradicional.

Observa-se, assim, que a necessidade de se aliar religião e política por parte dos protestantes vem crescendo. E o objetivo desse movimento é combater pautas que, na opinião deles, é contrária aos valores morais e cristãos, como a descriminalização do aborto, a legalização da união estável entre pessoas do mesmo sexo, a utilização de células-tronco embrionárias em pesquisas científicas, entre outros. Em contrapartida, observa-se com o passar dos anos, maior afastamento da Igreja Católica das pautas legislativas e eleitoreiras, mesmo que não totalmente.

Dessa forma, é possível perceber que, ainda que não da forma como ocorrera no século XV, a reforma e a contrarreforma, mesmo que não recebam essa denominação nos dais atuais, se faz presente na sociedade e tem impactado as decisões políticas, sociais e econômicas na sociedade brasileira. Quadros e Madeira (2018) reafirmam o ponto de vista acima ao mostrar a ação da bancada evangélica frente à implementação do projeto “Escola sem homofobia” de 2011, apelidado “carinhosamente” pelos evangélico de “Kit Gay” que levou à mobilização em massa da comunidade evangélica que culminou com a “Marcha para Jesus” em 2011. A contraparte a esse posicionamento está o apoio da bancada evangélica citado por Quadros e Madeira (2018) ao projeto “Escola sem partido” que pretendia, nas palavras dos autores “impossibilitar que futuros governos progressistas busquem implementar políticas públicas de combate à homofobia e de discussão mais ampla acerca dos problemas de gênero (agenda classificada pelos evangélicos como “ideologia de gênero”)”.

3. CONCLUSÃO

A Reforma e a Contrarreforma constituíram-se em um período obscuro da sociedade europeia no qual a luta pelo poder entre a Igreja Católica e os reformistas saiu do embate ideológico e chegou ao belicismo. Durante esse período Igreja Católica e reformistas lutaram pela manutenção do poder, visando o controle sobre política, economia e sociedade.

Mesmo após findados os confrontos armados e passados centenas de anos, os movimentos de reforma e contrarreforma ainda se fazem presentes na sociedade atual. De modo menos explícito, Igreja Católica e protestantes ainda duelam pelo poder, não só para a conquista de novos fiéis, mas também pela influência nos setores políticos, econômicos e sociais.

A criação da LEC foi o recomeço da inclusão da religião na política brasileira. Posteriormente, os evangélicos iniciaram a sua caminhada na política, também visando atender aos anseios de suas ideologias.

Nos últimos anos observou-se o crescimento exponencial do poderia evangélico na política brasileira que conseguiu eleger a maior bancada evangélica do Congresso Nacional. Esse fato mostra o quanto a religião tem ganhado relevância e influência na política nacional e como os posicionamentos de seus representantes têm visado a interesses próprios.

Dessa forma, percebe-se que a religião, que é algo particular e individual, se faz presente na sociedade e tem impactado diretamente a vida na sociedade brasileira, seja pelas pautas contrárias a temas polêmicos, mas necessários de serem discutidos como a ideologia de gênero, a descriminalização do aborto e o uso de células-tronco em pesquisas científicas, seja pela proposição de projetos e políticas públicas contrárias à liberdade já conquistada, como o estatuto do desarmamento.

Assim, mesmo que não tão intensas como no século XV, a Reforma e a Contrarreforma continuam acontecendo e impactando as questões sociais, políticas e econômicas. E mais uma vez, a religião vem se afastando dos valores cristãos em prol do poder.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMALADOSS, Michael. Religiões: violência ou diálogo?. Perspectiva Teológica[S. l.], v. 34, n. 93, p. 179, 2002. DOI: 10.20911/21768757v34n93p179/2002. Disponível em: https://www.faje.edu.br/periodicos/index.php/perspectiva/article/view/631. Acesso em: 21 ago. 2023.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: [s. n.], 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 21 ago. 2023.

DELUMEAU, Jean. Nascimento e afirmação da Reforma. São Paulo: Pioneira, 1989.

FUNARI, Pedro Paulo et al. As religiões que o mundo esqueceu. São Paulo: Contexto, 2009.

MACHADO, Maria das Dores Campos. Religião e Política no Brasil Contemporâneo: uma análise dos pentecostais e carismáticos católicos. Religião & Sociedade, v. 35, p. 45-72, 2015.

QUADROS, Marcos Paulo dos Reis; MADEIRA, Rafael Machado. Fim da direita envergonhada? Atuação da bancada evangélica e da bancada da bala e os caminhos da representação do conservadorismo no Brasil. Opinião Pública, v. 24, p. 486-522, 2018.

SILVA, Luis Gustavo Teixeira da. Religião e política no Brasil. Latinoamérica. Revista de Estudios Latinoamericanos, n. 64, p. 223-256, 2017.

[1] Pós-graduação em Literatura Brasileira, Pós-graduação em Psicopedagogia, Graduação em Letras – Português/Inglês, Graduação em Pedagogia, técnico em Edificações. ORCID: 0009-0002-9556-5647.

[2] Orientador. ORCID: 0000-0001-5260-7742.

Material recebido: 18 de maio de 2023.

Material aprovado pelos pares: 21 de novembro de 2023.

Material editado aprovado pelos autores: 17 de janeiro de 2024.

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Késia Milléri Pinto

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